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Dicionário Sonoridades da Cena
:
motivações, desafios e estratégias
César Lignelli
Para citar este artigo:
LIGNELLI, César.
Dicionário Sonoridades da Cena
:
motivações, desafios e estratégias.
Urdimento
Revista
de Estudos em Artes Cênicas, Florianópolis, v. 3, n. 56,
dez. 2025.
DOI: 10.5965/1414573103562025e0207
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Dicionário Sonoridades da Cena
: motivações, desafios e estratégias
César Lignelli
Florianópolis, v.3, n.56, p.1-22, dez. 2025
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Dicionário Sonoridades da Cena1: motivações, desafios e estratégias2
César Lignelli3
Resumo
O projeto de pesquisa intitulado "Sonoridades da Cena: termos e conceitos" visa
desenvolver coletivamente verbetes para um dicionário homônimo, inédito na
lusofonia, por meio de investigação terminológica e conceitual do vocabulário do
som nas artes cênicas. O projeto teve seu início em 2021 e, atualmente, conta com
90 pesquisadoras(es) vinculadas(os) a 38 instituições de ensino das 5 (cinco)
regiões do país. O presente artigo tem como objetivo apresentar as principais
motivações, além de desafios e estratégias que perpassaram o processo até o
momento.
Palavras-chave
: Dicionário. Sonoridades. Artes cênicas. Termos. Conceitos.
Dictionary of Sounds in the Theater: Motivations, Challenges, and Strategies
Abstract
The research project titled " Sounds in the Theater: terms and concepts" aims to
collectively develop entries for a homonymous dictionary, unprecedented in the
Lusophone world, through a terminological and conceptual investigation of the
vocabulary of sound in performing arts. The project began in 2021 and currently
involves 90 researchers affiliated with 38 educational institutions from all 5 (five)
regions of the country. This article aims to present the main motivations, as well as
the challenges and strategies that have permeated the process so far.
Keywords
: Dictionary. Soundscapes. Performing arts. Terms. Concepts.
Diccionario de Sonoridades Escénicas: motivaciones, desafíos y estrategias
Resumen
El proyecto de investigación titulado "Sonoridades Escénicas: términos y
conceptos" tiene como objetivo desarrollar colectivamente entradas para un
diccionario homónimo, inédito en el mundo lusófono, a través de una investigación
terminológica y conceptual del vocabulario del sonido en las artes escénicas. El
proyecto comenzó en 2021 y actualmente cuenta con 90 investigadores vinculados
a 38 instituciones educativas de las 5 (cinco) regiones del país. Este artículo tiene
como objetivo presentar las principales motivaciones, así como los desafíos y
estrategias que han permeado el proceso hasta el momento.
Palabras clave
: Diccionario. Sonoridades. Artes escénicas. Términos. Conceptos.
1 Revisão ortográfica, gramatical e contextual do artigo realizada por Cristina Leite. Doutorado e Mestrado em Artes
Cênicas pela Universidade de Brasília (UnB). Especialização em Língua Portuguesa (Universo). Graduação em Letras
(UCB).
2 Pesquisa financiada pela Chamada CNPq/MCTI/FNDCT 18/2021 - Faixa A - Grupos Emergentes, processo
402978/2021-8 e pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo, como Pesquisador Visitante (FAPESP
2025/01572-5) do Projeto Arquivos Sonoros de Teatro (FAPESP, 2022/15032-4) da Universidade de São Paulo (USP).
3 Pós-doutorado pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Pós-doutorado pela Universidade Federal do Rio de
Janeiro (UFRJ). Doutorado em Educação pela Universidade de Brasília (UnB). Mestrado em Arte e Tecnologia pela UnB.
Graduação Bacharel em Interpretação Teatral (UniRio). Professor Associado IV de Voz e Performance do
Departamento Artes Cênicas (CEN) e do Programa de Pós Graduação em Artes Cênicas (PPG-CEN) da Universidade de
Brasília. cesarlignelli@gmail.com
http://lattes.cnpq.br/2723749173803350 https://orcid.org/0000-0003-2684-3172
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Motivações
Um dicionário nunca deverá ser tomado apenas como um simples repositório ou
acervo de palavras, ao contrário, deve ser um guia de uso e, como tal,
tornar-se um instrumento pedagógico de primeira linha.
(Borba, 2003, p.16)
A relação direta das sonoridades com as artes cênicas se configura como
uma importante motivação para a elaboração de uma obra de referências dessa
natureza, ou seja, um dicionário. As sonoridades da cena podem ser entendidas
como qualquer som passível de ser escutado por humanos em contextos
cênicos. De modo geral e com variáveis terminológicas, pode-se considerar que
“as sonoridades da cena envolvem voz e palavra (falada ou cantada), música,
sonoplastia e a organização dessas instâncias em um tempo/espaço específico
no âmbito de 360º” (Lignelli, 2015, p.143). Ainda manifestações vocais não
necessariamente relacionadas à palavra falada e cantada, como perspectivas
glossolálicas4, interjeições e onomatopeias obviamente podem fazer parte da
gama sonora. Por outro lado, assim como os sons planejados e ensaiados para
serem evocados pela equipe no momento da cena, as manifestações sonoras
esperadas e 2, da plateia e demais ruídos não programados, presentes no
contexto das apresentações compõem as sonoridades da cena.
Mesmo na ausência de algumas instâncias acústicas em determinadas
cenas é fato que as sonoridades são indissociáveis e inerentes às artes cênicas,
independentemente do tempo histórico, das técnicas, estéticas e tecnologias
disponíveis. Sua complexidade e diversidade é acentuada ao considerar que “as
sonoridades possuem múltiplas possibilidades de produção, reprodução e
representação que acarretam em sentidos diversos na cena” (Lignelli; Magalhães;
Mayer, 2022, p.83).
Em contraponto a essa inerência, observa-se uma notória escassez de
estudos integrados e visibilidade inadequada dos elementos sonoros na pesquisa
acadêmica. Uma estatística aponta que apenas 1,5% da produção acadêmica em
4 Glossolalia pode ser entendida como “classe de comportamentos linguísticos desviantes aparentados,
caracterizados por um discurso fluente, [...] segmentável em termos de unidades fonêmicas e,
inteiramente, ou quase inteiramente, constituído de neologismos” (Certeau, 2015, p. 359).
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periódicos científicos de Artes Cênicas no Brasil aborda aspectos sonoros
(Trevisan, 2024). Além da baixa quantidade, a abordagem costuma ser
fragmentada, “com as investigações sobre voz, acústica, música de cena ou
efeitos sonoros raramente se conectando ou dialogando entre si” (Wegner;
Uhiara, 2024, p. 1). Cabe destacar que tais estatísticas não incluem o recorte
temático da voz que, ao contrário dos demais elementos sonoros, conta com
uma produção acadêmica relativamente significativa, que vem sendo estimulada
por meio de dossiês temáticos de periódicos relevantes para os estudos teatrais
no Brasil como a
Urdimento
(2014), com o dossiê temático “O trabalho vocal no
teatro”5; a
Revista Brasileira de Estudos da Presença
(2016), com o dossiê
temático “Pedagogias da Voz”6; a
Repertório
(2018), com o dossiê “Poéticas
Vocais”7, e a
Revista VIS
, com os dossiês “Som, Palavra e Performance I8 e II9
respectivamente em 2009 e 2015. Além disso, o periódico interinstitucional
Voz
e Cena
10, sediado na Universidade de Brasília, desde 2020 até junho de 2025, em
seus 5 anos de existência, publicou um total de 158 materiais textuais
categorizados entre 117 artigos, 16 entrevistas, 5 traduções, 9 relatos de
experiência, 1 resenha e 10 registros audiovisuais, concebidos por
pesquisadoras(es) vinculadas(os) a instituições de ensino das 5 regiões do
Brasil além da Argentina, Portugal, Itália, França, Reino Unido e Estados
Unidos (Lignelli; Dordete; Vargens; Mundim, 2025b), promovendo uma diversidade
de perspectivas sobre a pedagogia vocal para formação de atores, processos de
profissionais da voz junto à montagem de espetáculos e proposições teórico-
5 Ver https://www.revistas.udesc.br/index.php/urdimento/issue/view/307. Acesso em: 18 nov. 2025.
6 Ver https://seer.ufrgs.br/index.php/presenca/issue/view/2649. Acesso em: 18 nov. 2025.
7 Ver https://periodicos.ufba.br/index.php/revteatro/issue/view/1684.
8 Ver Davini, 2009.
9 Ver https://periodicos.unb.br/index.php/revistavis/article/view/14508. Acesso em: 18 nov. 2025.
10 Atualmente, além da Universidade de Brasília (UnB), o referido periódico conta com a parceira da
“Universidade Federal Grande Dourados (UFGD), da Universidade Federal do Acre (UFAC), da Universidade
Federal de Pernambuco (UFPE), da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), da Universidade Federal da
Bahia (UFBA), da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO), da Universidade Estadual de
São Paulo (UNESP), da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), da Universidade do Estado de Santa
Catarina (UDESC), da Escola de Arte Dramática (EAD/ECA/USP), da Universidade Federal de Ouro Preto
(UFOP), da Universidade Federal de Uberlândia (UFU) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), da
Universidade Federal de São João Del Rei (UFSJ) e agora, também da Universidade Federal do Pará (UFPA)”
(Lignelli; Dordete; Vargens; Mundim, 2025a, p.4-5).
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conceituais sobre a voz e a música em cena.
O exercício da função de editor-chefe da revista
Voz e Cena
desde sua
concepção me permite considerar que, não raro, profissionais da voz e
profissionais que concebem os sons de um espetáculo podem usar nomes
completamente diferentes para designar uma mesma função, ou, pelo contrário,
usar um mesmo termo para designar realidades bastante distintas. Essa
imprecisão e instabilidade no uso de termos relacionados às sonoridades da
cena pode afastar estudantes de artes cênicas, em diferentes níveis de
formação, especialmente aqueles que não tiveram experiências de educação
musical tradicional ou cujas vivências parecem colocá-los à margem desse
universo 11.
Além disso, a ausência de um vocabulário estabelecido e, portanto, de
palavras-chave que permitam identificar as pesquisas no campo do som do
teatro, impossibilita a busca por pesquisas nas bases de dados12.
As constatações elencadas relativas à utilização dos termos e conceitos
também exerceram funções instigadoras para a necessidade de um dicionário de
Sonoridades da Cena. Além disso, outra lacuna que ficou evidente durante as
pesquisas acerca de obras de referências com escopos aproximados revelou-se
decisiva para a constituição do projeto. Foi constatado que, apesar da
proliferação de dicionários de teatro, música e canto em diversas línguas, até o
momento atual da pesquisa, não foi identificado nenhum material de referência
robusto com escopo que abarque exclusivamente termos e conceitos
relacionados diretamente às sonoridades nas artes cênicas. Ademais, os
principais dicionários têm relativamente poucos verbetes dedicados ao som.
Alguns deles, no entanto, apresentam entradas relevantes e com características
específicas no que diz respeito às sonoridades e se constituem como uma das
11 “Quando a (re)produção e a análise musical não observam os traços socioculturais de seu entorno, podem
promover, sem querer, estruturas que reforçam discursos vigentes e/ou fomentam estereótipos e
preconceitos” (Chaves; Lignelli, 2025, p.40).
12 Fragmento adaptado livremente de fala realizada por Rafaella Uhiara durante a mesa temática
composta também por Elizabeth Ribeiro Azevedo, Berilo Luigi Deiró Nosella, Cesar Lignelli e Fabiana
Siqueira Fontana intitulada “Léxicos teatrais: desafios e perspectivas para a documentação e a
pesquisa”, realizada no dia 28 de outubro de 2025 no Centro de Convenções da Universidade Federal de
Ouro Preto, Auditório São João del Rey 1, no XIII Congresso da ABRACE, realizado em Ouro Preto MG entre
23 e 29 de outubro de 2025.
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referências para a escrita dos verbetes do projeto em questão.
Para contextualizar, segue um breve levantamento. Com relação à voz
cantada, o Diccionario del cantante:
Terminología clásica, vocal, musical y
cultural
(Banuelas, 2009),
Dictionnaire des œuvres de l'art vocal
, (Honegguer e
Prevost, 1993a, 1993b, 2003),
Diccionario de Cantantes Líricos Espanoles
(Sagarminaga, 1997) e
A Dictionary of Vocal Terminology: An Analysis
(Reid, 1983)
carregam importantes contribuições, mas tendem a se concentrar em termos,
técnica e estética direcionadamente clássica, lírica e europeia. Quando
associados à cena, se restringem à operística.
os dicionários de música como
Dizionario Enciclopedico Della Musica e
Dei Musicisti. I Titoli e i Personaggi
(Basso, 1999),
Dictionary of Terms in Music
(Horst, 2000),
Dicionário Grove de Música
(Sadie, 1994) e
Dizionario Delleducatore
Musicale
(Spaccazocchi, 1990), apesar de discorrerem sobre uma multiplicidade
de verbetes, restringem-se predominantemente a questões estritamente
musicais, e, quando se relacionam à cena e a personagens, estes se limitam à
cena operística.
Com relação aos dicionários diretamente relacionados às artes cênicas,
parece prudente separar os que foram publicados originalmente em língua
portuguesa dos que foram traduzidos para o português. Dentre os que foram
traduzidos, podemos destacar
A Arte Secreta do Ator: dicionário de antropologia
teatral
(Barba & Savarrese, 1995), publicado originalmente em italiano, que
sinteticamente apresenta aspectos idiossincráticos de abordagens técnicas do
ofício do ator direcionadas ao que os autores denominam, grosso modo, como o
estudo do comportamento humano em situações extracotidianas.
O Manual do Ator
(Stanislavski 1997), escrito originalmente em inglês,
apesar de apresentar inúmeras diferenças, sobretudo com relação aos fins
estéticos, se aproxima da Arte Secreta do Ator por também apresentar um léxico
com entradas em ordem alfabética redigidas com as próprias palavras do
emblemático diretor russo que expõe, de modo condensado e objetivo, princípios
e ensinamentos desenvolvidos durante a sua vida.
entre os dicionários de teatro escritos originalmente em francês e
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traduzidos para o português, podemos destacar o
Dicionário de Teatro
(Pavis,
1999), que apresenta relativa proximidade temática com o projeto. Seus verbetes
são desenvolvidos de forma multiperspectivada abarcando percursos sócio-
histórico-políticos que caminham para além das possíveis definições, o que o
aproxima do
Dicionário Sonoridade da Cena
. Somando-se a este, o
Dicionário da
Performance do Teatro Contemporâneo
(Pavis, 2017), ao tratar das sonoridades,
concentra-se sobretudo em aspectos da produção cênica contemporânea,
incluindo as tecnologias utilizadas nesses contextos, abordagem que também
serve de referência para a elaboração de alguns verbetes.
No Léxico do
Drama Moderno e Contemporâneo
(Sarrazac, 2014), escrito
originalmente em francês, de acordo com o organizador da obra, não se trata de
um dicionário científico e objetivo de teatro “mas um simples léxico, o inventário
sucinto das poucas palavras-chave capazes de orientar um estudo das
dramaturgias modernas e contemporâneas nos dias de hoje” (Sarrazac, 2014,
p.23). Apesar de suas peculiaridades, algumas de suas entradas apresentam
relações diretas com as sonoridades da cena e estão sendo consultadas como
referência para elaboração de alguns verbetes.
Neste projeto, pelo fato de o
Dicionário Sonoridades da Cena
em seu
escopo apresentar como recorte as artes cênicas brasileiras, cabe destacar a
importância dos dicionários escritos originalmente em português. Neste
contexto, o primeiro dicionário de teatro a ser mencionado foi o de Luiz Carlos
Vasconcelos (2009) que teve sua primeira edição publicada em 1987 e que traz
inúmeros verbetes sucintos relativos às sonoridades no teatro. Tornou-se uma
referência importante para o
Dicionário Sonoridades da Cena
. o
Dicionário de
Teatro Brasileiro: temas, formas e conceitos
(Guinsburg, Faria e Lima, 2006)
apresenta o recorte temático no título, com centralidade no teatro brasileiro, e
também teve a participação de 40 colaboradores que redigiram seus verbetes.
Nessa mesma perspectiva, o
Léxico de pedagogia do teatro
(Koudela; Almeida
Júnior 2015) também teve seus verbetes redigidos por autores especializados e
visa contribuir para o teatro “na intersecção entre a estética e a pedagogia”
(Koudela; Almeida Júnior 2015, p.12). Apresenta entradas que se relacionam
diretamente às sonoridades da cena, especialmente no âmbito pedagógico.
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Destaca-se ainda que o
Dicionário do Corpo
(Marzano, 2012), escrito
originalmente em italiano, o qual também é composto por entradas escritas por
especialistas. e que, apesar de não serem direcionadas ao teatro, apresentam
um desenvolvimento extenso dos temas abordados considerando relações de
poder, aspectos históricos e perspectivas diversas de definição. Por essas
características, influenciou diretamente na formulação das diretrizes13 para a(o)s
autoras(es) do
Dicionário de Sonoridades da Cena
.
A necessidade de reflexão sobre os termos do som das artes cênicas
motivou a criação de um projeto inconcluso de “Glossário Internacional do Som
do Teatro”, coordenado por Marie-Madeleine Mervant-Roux, pesquisadora do
Centro Nacional de Pesquisa Científica da França. O projeto, iniciado em 2011,
reunia em torno de vinte pesquisadores tanto das artes cênicas quanto dos
estudos do som (
Sound Studies
). Ele não buscava repertoriar todos os termos do
campo das sonoridades da cena, mas focar principalmente em vinte termos
chave que permitiam compreender melhor as circulações teóricas e estéticas,
além de “conceitos utilizados para descrever os fenômenos do som e da audição
no teatro ocidental (séculos XIX-XXI)” (Larrue; Mervant-Roux, 2014, p. 42). Esse
estudo pretendia observar tais termos especialmente nas “passagens de uma
língua a outra, suas traduções (ou intraduzibilidade) em francês, inglês, alemão,
italiano e português14”.
Em síntese, a concepção do
Dicionário de Sonoridades da Cena
é
fundamentada em uma série de motivações que apontam para a necessidade
premente de uma obra dessa natureza. No entanto, a inerência e,
consequentemente, a indissociabilidade das sonoridades das artes cênicas; as
possibilidades de composição de sentidos ao considerar seus meios de
produção, reprodução e representação das sonoridades; a relativa imprecisão e
instabilidade nas escassas produções em periódicos brasileiros; a raridade de
estudos que integram os elementos sonoros na pesquisa acadêmica, a
complexidade terminológica e a necessidade, em alguns contextos, de um
13 Será apresentada na seção motivações e estratégias.
14 [...] concepts utilisés pour décrire les phénomènes de son et d’écoute au théâtre dans le champ
occidental (XIXe - XXIe siècles) (Tradução: Rafaella Uhiara).
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vocabulário estabelecido transformam estas motivações, simultaneamente, em
desafios.
Desafios e Estratégias
Na tentativa de articular-se às características da proposta e de minimizar os
desafios inerentes a um projeto desta natureza e magnitude, tornou-se de suma
importância estabelecer princípios e perspectivas que orientaram seu
desenvolvimento.
É possível afirmar que esta pesquisa se aproxima da perspectiva
epistemológica construcionista, uma vez que o processo de conhecimento se
no enlace de premissas e percursos objetivos e subjetivos (Esteban, 2003), pois o
dicionário, para além da democratização do acesso, visa apresentar alternativas
de flexibilização do leitor(a) pesquisador(a) no que diz respeito a aspectos
conceituais e estéticos hegemônicos, sedimentados através dos tempos em
nossas práticas artísticas.
Assim, no que concerne ao desenvolvimento dos termos e conceitos, estão
sendo agregadas perspectivas etimológicas e históricas que consideram as
relações de poder como centrais no desenvolvimento e no estabelecimento dos
respectivos termos e conceitos nas artes cênicas brasileiras.
Metodologicamente, a pesquisa se configura como exploratória (Laville e
Dionne, 2007) e propõe gerar e disponibilizar bases qualitativas e quantitativas
(Fourez, 1995). As técnicas e procedimentos adotados para seu desenvolvimento
envolvem estudos bibliográficos e documentais a partir de artigos em periódicos,
dissertações, teses, livros e acervos de arquivos públicos em língua portuguesa e
em outras línguas, quando necessárias para o desenvolvimento dos respectivos
termos e conceitos.
A fim de apresentar resultados representativos, multiperspectivados,
nacionalizados, consistentes, e sobretudo, de referência, a proposta atualmente
envolve a escrita dos artigos/verbetes a ser desenvolvida pelas(os) atuais 90
pesquisadoras(es) associadas(os) que desenvolvem, cada qual, pesquisas acerca
de respectivas entradas do dicionário.
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No que diz respeito ao desenvolvimento de termos e conceitos para o
dicionário, são configurados outros desafios peculiares, ainda não apresentados
no contexto deste artigo. Um mesmo substantivo pode ser qualificado por
inúmeros adjetivos que trazem complexidade, demandas e extensões distintas a
estes verbetes. Por exemplo, 'voz' configura-se como uma entrada que pode
abarcar diversas perspectivas, definições e abordagens, exigindo, para seu
desenvolvimento consistente, contato com perspectivas filosóficas e anátomo-
fisiológicas para além de incursões no campo dos estudos teatrais e musicais.
verbetes como 'voz grave', 'voz aguda', 'voz nasalada', 'voz de cabeça', 'voz
metálica', 'voz aveludada', 'voz sussurrada', 'voz rouca' nos remetem a
características da emissão e da qualidade desses sons, que requerem, além de
aproximações com a acústica, a psicoacústica e a fonoaudiologia, a observação
de circunstâncias referenciais para serem devidamente caracterizados. Quanto
aos termos 'voz falada e voz cantada', estes reivindicam, além das características
de emissão, a consideração da presença da linguagem verbal (voz falada) e das
diferentes relações com as alturas (frequências) no tempo. Por outro lado,
verbetes como de 'voz estendida' e 'voz ingressiva' (Cavarero, 2011) tendem a
gerar estranheza pela diferença radical de suas sonoridades, com extremos de
graves e agudos no caso da primeira, como também de seu modo de produção
em movimento inspiratório, na segunda. Em acréscimo aos desafios relatados,
todos os verbetes citados, produzem distintos efeitos comunicacionais,
sensoriais e estéticos em performance, o que são aspectos relevantes a serem
também considerados durante sua escrita.
Introduzindo maior complexidade, possíveis verbetes a serem
desenvolvidos como 'glossolalia' (Almeida e Lignelli, 2022; Bely, 2003). O termo,
formado por glossa, "linguagem, palavra obscura ou obsoleta”, literalmente
“língua” e
lalia
"falar, conversar" pode abrir derivações como algaravia, blablação,
gibberish
, glossopoese, glotolalia, jargão,
nonsense
, psitacismo entre tantas
outras (Pozzo, 2013; Noletto, 2011).
Outros substantivos surgem adjetivados como 'música de cena', 'música
ao vivo', 'música gravada', 'trilha sonora' e 'ambiente sonoro' pois, para o escopo
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do projeto, fazem sentido se relacionados à cena. Ou seja, o verbete 'música',
provavelmente, não fará parte do dicionário, uma vez que se constitui como uma
obra em si, se não estiver relacionada à cena. Enfim, garantir a articulação
dessas múltiplas perspectivas, sem perder a clareza, a objetividade e a
densidade necessárias tem sido uma etapa desafiadora do processo.
A magnitude e a natureza colaborativa do Dicionário de Sonoridades da
Cena também impõem desafios significativos. Neste sentido, o primeiro grande
desafio reside na escala do projeto. Com a previsão de publicação em 6 volumes,
contendo aproximadamente 500 verbetes, e a colaboração atual de 90
pesquisadoras(es) vinculadas(os) a 38 instituições de ensino localizadas nas 5
(cinco) regiões do país15, além de um pesquisador português e um peruano, a
coordenação se torna uma tarefa hercúlea. A escolha, a organização e a
distribuição dos temas propostos nas publicações e para as(os) colaboradoras
(es) tornaram-se passos complexos, devido à quantidade e à diversidade de
abordagens.
No que diz respeito à escolha dos verbetes selecionados para comporem o
dicionário, o processo se deu, inicialmente, pelo chamamento público contendo
também as diretrizes para a publicação "Sonoridades da cena: termos e
conceitos", disponibilizada na seção de anúncios da revista
Voz e Cena
16 (2024).
Na chamada também foi disponibilizada uma lista inicial com, aproximadamente,
15 6 (seis) na região Centro Oeste, a Universidade de Brasília (UnB/DF), a Universidade do Distrito Federal
(UnDF/DF), o Instituto Federal de Brasília (IFB/Campus Brasília/DF), o Instituto Federal de Brasília
(IFB/Campus Recanto das Emas/DF), a Universidade Federal de Goiás (UFG/GO), e a Universidade Federal
da Grande Dourados (UFGD/MS). 5 (cinco) na região Nordeste, a Universidade Federal da Paraíba/UFPB,
Universidade Federal do Ceará (UFC/CE), a Universidade Federal da Bahia (UFBA/BA), a Universidade
Federal do Maranhão (UFMA/MA) e a Universidade Federal de Pernambuco (UFPE/PE). 4 (quatro) na região
norte, a Universidade Federal do Amapá (UNIFAP/AP), a Universidade Federal do Acre (UFAC/AC), a
Universidade Federal do Pará (UFPA/PA) e a Universidade Federal de Rondônia (UNIR/RO). 13 (treze) na
região Sudeste, o Centro de Treinamento, Capacitação e Formação do Setor de Asseio e Conservação
(CECAF/SP), a Faculdade Santa Marcelina (SP), a Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP), a
Universidade de São Paulo (USP/SP), a Universidade Estadual Paulista (UNESP/SP), a Universidade Estadual
de Campinas (UNICAMP/SP), a Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP/SP), a Universidade Federal do
Estado do Rio de Janeiro (UniRio /RJ), Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ/RJ), a Universidade
Federal de Minas Gerais (UFMG/MG), a Universidade Federal de Uberlândia (UFU/MG), a Universidade
Federal de São João del-Rei (UFSJ/MG) e a Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP/MG). 8 (oito) na
região Sul, a Universidade Estadual de Londrina (UEL/PR), a Universidade Estadual do Paraná
(UNESPAR/PR), a Universidade Estadual de Maringá (UEM/PR), a Universidade Corporativa de Canto
Contemporâneo (UNIACEV/SC), a Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC/SC), a Universidade
Federal de Santa Catarina (UFSC/SC), a Universidade Federal de Pelotas (UFPel/RS) e a Universidade
Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS/RS). No Peru, a Universidad Peruana de Ciências Aplicadas (UPC) e,
em Portugal, Escola Superior de Teatro e Cinema (ESCT).
16 Ver https://periodicos.unb.br/index.php/vozecena/announcement/view/827. Acesso em: 18 nov. 2025.
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200 verbetes passíveis de serem desenvolvidos no dicionário, além da solicitação
às pessoas interessadas em participar como colaboradoras do projeto que
sugerissem verbetes associados a temas de suas pesquisas que se
enquadrassem nas diretrizes.
Esse processo da estabilização dos verbetes que vão compor o dicionário
ainda continua, seja pelo surgimento de termos importantes para o seu escopo
até então ausentes, seja durante o processo de desenvolvimento da redação dos
verbetes, no qual, junto as(os) colaboradoras(res), percebe-se, por vezes, a
necessidade de mais de uma entrada para verbetes próximos, assim como a
fusão de 2 (dois) verbetes em uma mesma entrada. Por outro lado, alguns
grupos de entradas como os de música em contextos distintos não tiveram
participantes do projeto disponíveis para escrever um quantitativo de verbetes
que justificasse sua inserção. Por exemplo, no grupo Música no Circo, Música no
Teatro de Rua, Música na tragédia, Música no Teatro Épico, Música no Teatro
Musical, Música em Grotowski, Música em Meyerhold, Música em Shakespeare,
Música em Stanislavski somente foram propostas a escrita 2 (dois) destes
verbetes pelos colaboradores. Assim, para garantir certa coerência e
consistência nas escolhas das entradas, atualmente o grupo inteiro encontra-se
suspenso até que tenhamos um montante significativo destes verbetes ou um
argumento plausível para a presença de poucos.
Ainda no que diz respeito à seleção das entradas, dos termos e dos
conceitos propostos pelas(os) colaboradoras(res) foram aceitos após diálogo
com as(os) proponentes, a fim de verificarmos coletivamente se atendiam aos
requisitos estabelecidos nas diretrizes, como sua presença nas artes cênicas
brasileiras, evidenciada pelo número de citações em produções acadêmicas,
pelas funcionalidades do termo e/ou do conceito na formação de atrizes e atores
ou por sua utilização em processos de criação de grupos teatrais brasileiros.
No montante das propostas de desenvolvimento dos verbetes enviadas
pelas(os) colaboradoras(res), ocorreu que inúmeras entradas da lista provisória
ficaram sem autoria, enquanto outros tiveram propostas de até 6 (seis)
pesquisadoras(res) para desenvolvimento do mesmo verbete. Neste caso, foram
realizadas reuniões com os grupos de pessoas responsáveis pelo mesmo
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verbete, a fim de verificar as necessidades e as afinidades interpessoais para o
compartilhamento das autorias. Quanto aos verbetes sem proponentes, tem sido
realizada pela coordenação do dicionário o convite a pessoas qualificadas para o
desenvolvimento destes.
Quanto à organização, após inúmeras tentativas, os volumes encontram-se
divididos da seguinte maneira: 4 (quatro) volumes envolvem verbetes
relacionados diretamente à voz em cena sob perspectivas de técnicas vocais, da
fala e do canto, de procedimentos de ensaio e de questões estilísticas relativas à
produção vocal. 1 (um) volume está direcionado a questões musicais, de
ambientação e de efeitos sonoros na cena teatral e 1 (um) volume relaciona-se a
tecnologias, objetos sonoros e ofícios relacionados a sonoridades da cena. Para
essa organização, foram considerados a quantidade de verbetes envolvendo cada
grande tema, assim como os termos comumente utilizados por artistas e
pesquisadoras(es) de teatro. Diante de termos similares, a preferência foi dada
aos termos mais genéricos ou menos imbuídos de estéticas ou qualquer recorte
demasiadamente específico. Um bom exemplo dessa escolha é a opção pelo uso
do vocábulo “Voz” na denominação dos 4 (quatro) primeiros volumes em
detrimento de outras possibilidades como “Vocalidade”. Embora este último
também pudesse designar o conteúdo desses volumes, trata-se de um termo
mais recente cuja utilização reflete uma abordagem teórica da voz alinhada a
preceitos estéticos do teatro contemporâneo e da performance (Uhiara; Wegner,
2016, p. 383-384).
Ainda com relação à organização do dicionário Sonoridades da Cena foram
traçadas estratégias de indexação e de acessibilidade do conteúdo a fim de
facilitar o acesso aos conteúdos e sinonímias, sem hierarquizá-los. Encontram-
se em implementação os seguintes tipos de índices:
Índice Alfabético Principal (ou Geral): o tipo mais abrangente, com
listagem em ordem alfabética. Seu propósito é servir como o ponto
principal para encontrar informações sobre qualquer verbete.
Índice Remissivo (ou de Remissões): utilizado para evitar redundância e
guiar a pessoa leitora. Este índice direciona de um termo para outro, ou
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de um termo não preferencial para um preferencial, utilizando
referências como "Ver também..." ou "Ver...". Ajuda a padronizar a
terminologia e a encontrar informações com termos relacionados.
Índice Onomástico: lista exclusiva de nomes próprios, como pessoas,
divindades, personagens fictícias. A organização é alfabética, geralmente
pelo sobrenome, permitindo localizar rapidamente todas as menções a
entidades nomeadas.
Índice Temático (ou por Assunto): focado em tópicos, conceitos e
assuntos abordados, este índice ajuda a pessoa leitora a explorar as
ideias e os temas principais.
Índice de Colaboradoras(es): este índice lista os nomes das pessoas que
contribuíram para a obra, com suas respectivas funções e as páginas
onde suas contribuições podem ser encontradas, fundamental para dar
crédito e visibilidade aos múltiplos autores do dicionário.
A garantia de padronização em uma obra tão vasta e colaborativa é outro
ponto crítico. Com tantos autoras e autores contribuindo, existe o risco de
abordagens divergentes e inconsistências formais, terminológicas e/ou
conceituais. Considerando o recorte do projeto relativo ao território nacional e no
quanto temos sido influenciados esteticamente por noções hegemônicas,
inclusive em nossos modos de fala e de gosto, torna-se importante traçar
apontamentos acerca do percurso histórico e etimológico dos termos e
conceitos, de modo a identificar pistas de como eles foram se amalgamando ao
nosso léxico relativo às sonoridades nas artes cênicas. Tal perspectiva pode
também ser relevante para flexibilização do uso de determinados termos e
conceitos, a depender da perspectiva epistemológica, conceitual e metodológica
na qual quem pesquisa se insere.
As peculiaridades de cada verbete a ser composto geram demandas
específicas quanto à forma, à abordagem, ao processo de escrita (individual ou
coletivo) e à extensão dele. Sem desconsiderar as especificidades de cada
verbete, as diretrizes apontam aspectos comuns para a estruturação dos
vocábulos com fins de padronização necessária a uma obra desta natureza
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como:
- Título e Resumo.
- Perspectiva(s) etimológica(s) do termo e/ou do conceito.
- Percurso histórico do termo e/ou do conceito até chegar e se instaurar
nas Artes da Cena brasileira (sempre que possível).
- Perspectivas relativas a definições do termo e/ou do conceito em
pesquisas já realizadas (estado da arte).
- Funcionalidades do termo e/ou do conceito nas Artes da Cena sob
perspectivas pedagógicas e estéticas.
A gestão do tempo e o acompanhamento das(os) colaboradoras(res)
também têm sido desafiadores. Para minimizar atropelos e atrasos no processo,
foram definidas diversas etapas, desde a submissão de propostas até a
avaliação, devolutivas e revisões, que precisam ser cuidadosamente monitoradas
a fim de garantir um processo amistoso e a qualidade final do Dicionário.
Na prática, foram disponibilizados 3 (três)
templates
para serem enviados à
coordenação do projeto em momentos específicos. O primeiro consiste em um
termo de compromisso a ser assinado pelas(os) colaboradoras(res) com o nome
do(s) verbete(s) a serem desenvolvidos por cada pessoa, acompanhado do seu
comprometimento com as diretrizes e o cronograma proposto. O segundo trata-
se de um roteiro para uma primeira entrega da organização dos verbetes por
tópicos. Esta etapa tem sido muito importante para cada pesquisador(a) ter
respaldo de que está trabalhando no caminho esperado para o desenvolvimento
do verbete e, para a coordenação do dicionário, oferece indícios acerca do
envolvimento com o projeto de cada participante e minimiza desperdícios de
tempo das(os) pesquisadoras(res), caso estejam pensando em desenvolver
perspectivas dos verbetes que não se alinham ao dicionário. No terceiro
template
, consta um modelo para a entrega intermediária e a final de cada
verbete. Alguns dos critérios balizadores do processo de escrita e avaliação dos
verbetes envolvem a pertinência temática, a relevância e efetividade da
argumentação, a consistência da fundamentação teórica, a objetividade, a
clareza, a coesão, o grau de contribuição ao avanço do conhecimento e, como
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explicitado, a adequação às diretrizes. Neste processo de redação e avaliação
dos verbetes, têm sido realizados encontros periódicos com as(os)
colaboradoras(res) (presenciais e online) para ajustes e apoio à redação. Destaca-
se ainda que estão sendo realizadas dupla avaliação e devolutivas estruturadas
com sugestões de alterações para as(os) autoras(es), garantindo múltiplas
revisões.
A preocupação com a ética e a inclusão, além da busca de unidade em
aspectos formais da escrita dos verbetes relacionada a estas questões foi
incorporado do uso do
Guia de Linguagem Inclusiva
para flexão de gênero
disponível no site do gov.br17, bem como a utilização de um sistema
CrossRef
de
verificação de plágio, que sublinha o compromisso com a originalidade e a
diversidade.
Após a leitura dos verbetes por tópicos (segundo
template
), foi detectada a
necessidade de uma sistematização terminológica interna e com a elaboração de
Glossários. Esta iniciativa encontra-se em andamento e visa padronizar e unificar
a linguagem utilizada no projeto, criando um corpo de referências para as(os)
colaboradoras(es). Trata-se de glossários de termos sonoros com definições
específicas e glossários de termos teatrais utilizados nos verbetes em
desenvolvimento, além de uma compilação de referências de dicionários de
áreas correlatas como etimologia, teatro, música, fonoaudiologia e acústica. Essa
estratégia de glossários internos é importante para mitigar o desafio da ausência
de um vocabulário estabelecido, promovendo uma base comum de
entendimento entre as(os) pesquisadoras(es) e garantindo a coerência conceitual
ao longo dos volumes do dicionário.
A complexidade gerencial do projeto é enfrentada por meio da adoção de
ferramentas de gestão e organização de projetos. O uso de plataformas como
Trello
permite o gerenciamento visual de tarefas coletivas, prazos e
responsabilidades, facilitando a coordenação da equipe multi-institucional. Para a
gestão de referências bibliográficas, o
Zotero
está sendo empregado,
17 Disponível em:
https://www.tse.jus.br/++theme++justica_eleitoral/pdfjs/web/viewer.html?file=https://www.tse.jus.br/comun
icacao/noticias/arquivos/tse-guia-de-linguagem-
inclusiva/@@download/file/Guia%20de%20Linguagem%20Inclusiva%20TSE_mar-2023.pdf. Acesso em: 18
nov. 2025.
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assegurando a organização padronizada das fontes. Além disso, a manutenção
de um Drive do Projeto centraliza o armazenamento e compartilhamento seguro
de documentos, verbetes em progresso, diretrizes e outros materiais relevantes,
de modo a garantir o acesso facilitado e controle de versão para as(os)
colaboradoras(es). Reconhecendo o crescente impacto das tecnologias digitais
na pesquisa, o projeto adota uma abordagem proativa e crítica em relação ao
uso de Inteligência Artificial (IAs). As estratégias nesse campo incluem a tentativa
de definição de limites claros para a aplicação de IAs visando complementar a
expertise humana e o rigor acadêmico. A equipe está atenta à prevenção e
identificação de plágios gerados por IAs, bem como à verificação de informações
inconsistentes e insuficientes, garantindo a confiabilidade do conteúdo. Esta
postura visa aproveitar os benefícios da IA para otimização de processos (ex:
análise de grandes volumes de dados) enquanto se mantém vigilância sobre os
riscos éticos e acadêmicos, garantindo a integridade e a originalidade da pesquisa
no dicionário.
Considerações Finais
O dicionário
Sonoridades da Cena
representa uma iniciativa de grande
fôlego e ineditismo no cenário acadêmico lusófono. As motivações para sua
criação são sólidas, enraizadas na percepção da indissociabilidade das
sonoridades nas artes cênicas versus a fragmentação e escassez de sua
abordagem acadêmica, culminando na ausência de uma obra de referência
específica.
Torna-se imprescindível destacar que os inúmeros desafios e, sobretudo, as
estratégias apresentadas no presente artigo foram detectadas e estão sendo
implementadas em função da expertise das(os) participantes e das parcerias
estabelecidas antes e durante a execução do projeto. Neste contexto, além dos
integrantes do
Grupo de Pesquisa Vocalidade & Cena
18 (CNPq desde 2003), da
equipe do Periódico
Voz e Cena
19 (desde 2020), dos membros da
Rede Voz e
18 Ver http://dgp.cnpq.br/dgp/espelhogrupo/20169. Acesso em: 18 nov. 2025.
19 Ver https://periodicos.unb.br/index.php/vozecena/about/editorialTeam. Acesso em: 18 nov. 2025.
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18
Cena
20 (desde 2011) e das(os) 90 pesquisadoras(res) que integram o projeto, cabe
destacar a parceria estabelecida em 2024 com o projeto Arquivos Sonoros de
Teatro21 (ECA-USP) liderado por Rafaella Uhiara que, desde então, assumiu a
coordenação do dicionário Sonoridades da Cena junto a César Lignelli.
Com a associação entre o
Arquivos Sonoros de Teatro
e o dicionário
Sonoridades da Cena
ocorreu um aumento substancial de colaboradoras(es) da
Universidade de São Paulo que integraram o projeto e estão responsáveis pela
redação de verbetes. Além disso, o dicionário conta atualmente com a
participação de 5 (cinco) bolsistas de iniciação científica22, financiados pela
FAPESP e orientados por Uhiara. Essa iniciativa não introduz graduandas(os) à
pesquisa desde os primeiros estágios de sua formação acadêmica, mas também
tem proporcionado um valioso suporte para a coleta e organização de dados
para os glossários, revisão bibliográfica e outras atividades importantes para a
construção do dicionário.
No âmbito da formação avançada e da qualificação de pesquisa,
colaboradoras(res) responsáveis no dicionário por uma quantidade significativa
de verbetes estarão entre 2026 e 2028 realizando estágios pós-doutorais
supervisionados por Lignelli no âmbito do projeto dicionário
Sonoridades da Cena
no Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas da Universidade de Brasília.
Esta iniciativa visa integrar de forma institucionalizada pesquisadoras(es)
doutoras(es)23, proporcionando um ambiente estruturado para o
desenvolvimento de suas pesquisas e, concomitantemente, enriquecendo o
conteúdo e a base teórica do dicionário. A formalização institucional do pós-
doutorado estabelece pontes valiosas entre as instituições de origem dos
pesquisadores e a UnB, fortalecendo a colaboração interinstitucional e o
intercâmbio de conhecimento via dicionário Sonoridades da Cena.
20 Ver https://www.vozecena.com.br/. Acesso em: 18 nov. 2025.
21 Ver https://ast.eca.usp.br/. Acesso em: 18 nov. 2025.
22 João Banietti, José Kauã de Amorim, Juliana Alves Veríssimo, Polyana Alves Araújo Silva e Tarsila de
Oliveira Trevisan.
23 Ana Dassie (UNESPAR), Fernando Gutierrez (IF/DF), Flávia Menezes (UFMA), Gil Roberto (UnB), Katia Maffi
(UEM), Letícia Carvalho (UniRio), Manuel Guerrero (Universidade de Ciências Aplicadas - Peru) e Marcos
Chaves (UFGD).
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Por fim, cabe destacar que o projeto com estratégias compatíveis às
demandas do dicionário visa à articulação de pesquisas existentes e à
sensibilização das comunidades acadêmica, técnica e artística sobre as
potencialidades das sonoridades dos espetáculos, de modo a gerar ferramentas
conceituais para professoras(es) e pesquisadoras(es) e contribuindo
significativamente para o avanço dos estudos do som nas artes cênicas.
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Universidade do Estado de Santa Catarina
UDESC
Programa de Pós-Graduação em Teatro
PPGT
Centro de Arte CEART
Urdimento
Revista de Estudos em Artes Cênicas
Urdimento.ceart@udesc.br