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O dentro, o fora e o vão no meio: epistemologias
libertárias e práticas cênicas abolicionistas
Murilo Moraes Gaulês | Maria Galindo Neder
Lia Garcia | Sayak Valencia
Para citar este artigo:
GAULÊS, Murilo Moraes; NEDER, Maria Galindo; GARCIA,
Lia; VALENCIA, Sayak. O dentro, o fora e o vão no meio:
epistemologias libertárias e práticas cênicas
abolicionistas.
Urdimento
Revista de Estudos em Artes
Cênicas, Florianópolis, v. 1, n. 50, abr. 2024
DOI: 10.5965/1414573101502024e0109
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O dentro, o fora e o vão no meio: epistemologias libertárias e práticas cênicas
abolicionistas1
Murilo Moraes Gaulês2 | Maria Galindo Neder3
Lia Garcia4 | Sayak Valencia5
Resumo
O referido artigo é um compilado de três entrevistas realizadas com artistas e
pesquisadoras latino-americanas: Sayak Valência, Lia Garcia e Maria Galindo. O texto
organiza as três entrevistas em uma única dramaturgia com o intuito de estabelecer um
debate acerca das intersecções presentes entre artes cênicas, abolicionismo prisional e
dissidência de gênero/sexualidade.
Palavras-chave
: Abolicionismo penal. Gênero. Artivismo. Prisão.
The inside, the outside and the gap in between: Libertarian epistemologies and abolitionist
scenic practices
Abstract
This article is a compilation of three interviews carried out with Latin American artists
and researchers: Sayak Valência, Lia Garcia and Maria Galindo. The text organizes the
three interviews into a single dramaturgy with the aim of establishing a debate about the
intersections present between performing arts, prison abolitionism and gender/sexuality
dissent.
Keywords
: Penal abolitionism. Gender. Artivism. Prison.
El adentro, el afuera y la brecha entre medio: epistemologías libertarias y prácticas
escénicas abolicionistas
Resumen
Este artículo es una recopilación de tres entrevistas realizadas a artistas e investigadores
latinoamericanos: Sayak Valência, Lia Garcia y Maria Galindo. El texto organiza las tres
entrevistas en una sola dramaturgia con el objetivo de establecer un debate sobre las
intersecciones presentes entre las artes escénicas, el abolicionismo carcelario y el
disenso de género/sexualidad.
Palabras clave
: Abolicionismo penal. Género. Artivismo. Prisión.
1 Revisão ortográfica, gramatical e contextual do artigo realizada por Victor Siqueira Serra, graduado e mestre
em Direito pela Universidade Estadual Paulista (UNESP) Franca.
2 Doutorado em Artes/Educação pela Universidade de São Paulo (USP). Mestre em Artes/Educação pela USP.
Especialização em Psicopedagogia e Arteterapia pela Faculdade Paulista de Artes/SP. Licenciatura em
Educação Artística pela Faculdade Paulista de Artes. Bacharelado em Artes Cênicas pela Faculdade Paulista
de Artes. cenicas.murilogaules@gmail.com https://orcid.org/0000-0002-7704-5229
3 Ativista boliviana, militante anarcofeminista, psicóloga e comunicadora, cofundadora das Colectivo Mujeres
Creando em 1992, o qual segue liderando.
4 Pedagoga, escritora e performer, aprendiz ativista feminista e trans. Cofundou a rede de jovens trans em
2016, e em 2019, o arquivo LGBTIQ + Trans Marikitas Youth Literature. O ativismo de Lia passa pela junção
entre arte e poesia expandida.
5 Doutorado em Filosofia pela Universidad Complutense de Madrid (2010). Professora investigadora Titular da
El Colegio de la Frontera Norte. https://orcid.org/0000-0003-3041-8240
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O Dentro
Em meados de 1999, concomitante ao fervor cultural causado pelos
movimentos de teatro da cidade de São Paulo, organizados em luta sob o nome
de Arte contra a Barbárie, surgia o Programa Cultural de Teatro nas Prisões da
FUNAP, encabeçado pelo educador e encenador Jorge Spínola. Com o intuito de
voltar-se a montagens de espetáculos, o Programa possibilitava viabilizar acesso
aos meios de criação teatral para a população carcerária do Estado de São Paulo,
inaugurando novas possibilidades de trajetória educacional voltadas para as
relações entre a cena e as possíveis repercussões de um processo artístico, ou
seja, fundamentado em princípios de liberdade de criação, e o regime punitivo de
privação de liberdade.
Esse movimento formou o Núcleo Panóptico de Teatro, coletivo formado por
pessoas privadas de liberdade e atores profissionais que encenavam dentro e fora
da prisão. Sua importância dentro da história do teatro nacional é inegável. Os
cinco espetáculos montados pelo grupo chamaram a atenção tanto do público
quanto da crítica especializada. A exemplo disso, podemos citar a montagem de
O Auto da Compadecida
, que conseguiu chamar a atenção do próprio Suassuna
pela ousadia e complexidade da montagem; e o espetáculo
Muros
, apresentado
no Pavilhão 2 do desativado (mas sempre vivo na memória do sistema penal
paulista) Carandiru.
Além da potência cênica evocada desse encontro, tido como incomum à
época, entre pessoas presas e atores profissionais, o trabalho possibilitava que os
artistas confinados pelo Estado pudessem sair em turnê com seus espetáculos,
trocando as celas e o abandono social por um dia em salas memoráveis da história
do teatro como o TUCA ou o Teatro Oficina, por exemplo.
Longe de ser uma exceção, as artes cênicas e o abolicionismo penal sempre
deram as mãos ao longo da história do Brasil. Podemos citar o revolucionário
Teatro do Sentenciado, inaugurado por Abdias Nascimento quando recluso da
Casa de Detenção de São Paulo, no Carandiru, registrado de forma brilhante por
Viviane Narvaes (2020) e Denise Carrascosa (Nascimento, 2023), ou as experiências
vividas por Frei Betto, Maria Rita Freire Costa e Ruth Escobar em instituições
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penitenciárias registradas por Vicente Concílio (2008), que também é coordenador
do Núcleo de Teatro nas Prisões da UDESC.
Se pensarmos que o termo abolicionismo penal é uma configuração
conceitual brasileira (usu)fruto da negação sobre nosso vergonhoso histórico
escravocrata, cuja emancipação da escravidão foi a mais tardia em todo o mundo,
essa relação se torna mais antiga. Digo isso porque o termo abolicionismo (sem o
penal) é usado em quase todo o mundo para designar simultaneamente a luta
antirracista de emancipação plena de povos não brancos e a luta antiprisional,
tendo em vista que as prisões são um marco e prova cabal da manutenção do
projeto escravocrata após o fim formal da escravidão, período em que
pessoas ex-escravizadas, que tinham saído recentemente de uma
condição de trabalho corporal incessante, podiam ser legalmente
sentenciadas à servidão penal. Imediatamente após o fim da escravidão,
os estados se apressaram para desenvolver um sistema de justiça
criminal que pudesse restringir a liberdade das pessoas recentemente
libertas. Pessoas negras se tornaram o alvo principal de um sistema legal
em desenvolvimento, chamado por muitos de uma reencarnação da
escravidão (Davis, 2018, p. 51).
Desde os primórdios da colonização, o teatro e, principalmente, as práticas
comunitárias do Teatro Negro, tiveram grande importância no abolicionismo
brasileiro. Foi em 1870, no Theatro de Variedades de Madri, que o abolicionista
André Rebouças conheceu as conferências antiescravistas promovidas pela
Sociedade Abolicionista Espanhola. Nesses encontros, o teatro tinha papel central
para trazer o debate às massas e de funcionar como facilitador pedagógico e
semiótico para formar a população e trazer novos adeptos à causa. Ao retornar ao
Brasil, Rebouças se inspira nas práticas do abolicionismo espanhol para promover
as Conferências Emancipadoras em diferentes teatros do país, entre 1880 e 1881
(Njeri, 2021). O teatro passava a dar forma às expressões abolicionistas, após as
missas de domingo, contando com ampla divulgação do jornal Gazeta da Tarde,
de José do Patrocínio. Além disso, era comum que as companhias teatrais
abolicionistas do século XVII utilizassem da renda arrecadada em suas bilheterias
para comprar alforrias para pessoas escravizadas (Njeri, 2020). Com as
consequências desses movimentos comunitários e da luta aquilombada, que
fomentaram novos imaginários políticos acerca da inegociabilidade da
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humanidade do povo preto, em 1888 o estado brasileiro decretou a abolição da
escravidão.
Desde 2019, a CiA dXs TeRrOrIsTaS, coletivo artístico LGBTQIA+ da cidade de
São Paulo com o qual atuo e acompanho, inspirada pelo trabalho desenvolvido
pelo Núcleo Panóptico de Teatro, se debruça na produção de práticas dentro das
artes da cena que fomentem o (duro) desenrolar da luta abolicionista no Brasil.
Seu trabalho possibilitou um repertório de práticas artístico-pedagógicas e
criativas a fim de organizar uma metodologia própria para criação com pessoas
privadas de liberdade.
Durante esses cinco anos de pesquisa e atuação enquanto artista e militante
da luta antiprisional, tenho percebido que as experiências tanto com os
processos de submissão escravocrata quanto com o desenvolvimento do teatro
enquanto ferramenta social de mobilização revolucionária das massas – possuem
muitos pontos em comum. A América Latina foi sequestrada pelos conquistadores
europeus, que se utilizaram da catequização dos povos, do tráfico de pessoas, da
estratificação cultural e das prisões como tecnologias bélicas de dominação e
subalternização, com desdobramentos que são sentidos até hoje no imaginário
comum de nossos povos.
Ao mesmo tempo, a língua e a geografia tornaram o Brasil um continente à
parte na América Latina, com barreiras que impedem o escambo de tecnologias
de resistência com nossos hermanos, hermanas e hermanoas.
Justamente por isso, tenho feito um exercício contínuo de estabelecer
diálogos com artistas, pesquisadores(as)(is) e ativistas que têm construído junto
às suas comunidades epistemologias para nomear e organizar nossos arsenais de
resistência ao apocalipse colonial, principalmente no que se trata acerca da luta
antiprisional.
Eu entendo as prisões como hipérbole e síntese, simultaneamente, do projeto
neoliberal bélico-rentável capitalista e, por isso mesmo, acredito que elas
encontram sua maior frente de resistência nas tecnologias comunitárias,
produzidas a partir de saberes do cuidado e da manutenção e enaltecimento da
vida.
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E é a partir desse movimento que se organiza esse texto. Uma conversa com
matrigestoras de saberes anticoloniais, da América Latina, que buscam em seus
movimentos promover a liberdade plena de todos os povos. Operando ficções
idealizadas em bando com a sua gente, orquestradas com tanta esperança e
habilidade que, por muitas vezes, acabam por rasgar o tecido frágil da realidade e
parir novos e melhores mundos possíveis.
Essa conversa por si só já é uma ficção. Porque ela nunca aconteceu. Não da
maneira como aqui se organiza, pois os relatos que se seguem foram coletados
em conversas individuais que tive com cada uma delas, mas que pelas
similaridades e diferenças complementares pareciam pedir um encontro.
Para além de toda a potência artística e metodológica, essas experiências
abrem precedentes para pensar novas possibilidades do fazer teatral sob uma
perspectiva arte-ativista, ampliando o alcance transformador que as artes cênicas
possuem enquanto territórios fundamentados na liberdade. Hoje, é possível
reconhecer e mapear diversas práticas cênicas que se relacionam com o (fim do)
sistema prisional brasileiro, seja com artistas e/ou pedagogos inseridos no front
das penitenciárias, seja com trabalhos teatrais que trazem à tona a emergência
dessa discussão ainda em nossos tempos.
Esse artigo f(r)icciona essas conversas, como uma dramaturgia, no intuito de
ampliar as perspectivas interseccionais sobre cultura, artes cênicas, gênero e
abolicionismo, para que possam servir como material de base de futuros
movimentos, rebeldias, revoluções ou ações rumo a novos rasgos no tecido da
realidade, a fim de que este possa ser liberado da mancha de sangue colonial que
(ainda) o tinge de vermelho-sacrifício.
O vão no meio
Maria Galindo
: Me parece muito importante dizer que atualmente eu estou
impedida pelo governo de entrar na prisão. Por que? Porque a última vez que eu
entrei na prisão, apoiei e produzi uma rebelião. E desde aquela época eu só posso
voltar para uma prisão, na Bolívia, se for como prisioneira. Eu tinha uma amiga na
prisão que foi presa por porte de armas, por terrorismo. Essa amiga tinha um
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coletivo chamado As Presas Políticas e elas queriam debater comigo.
Lia Garcia
: O projeto que realizei de 2016 a 2018, aqui na Cidade do México,
se chamava projeto “10 bis” e foi um projeto que foi realizado na prisão preventiva
masculina do Norte. Aqui na Cidade do México temos nove prisões, das quais duas
são para mulheres e sete para homens. Fui fazer o que chamo de encontro porque
não gosto da palavra intervenção. Acho que intervenção tem a ver com intervir em
um lugar e isso pode ser um pouco violento. Eu gosto mais da palavra encontro,
pois quando alguém encontra algo, você descobre, você se perde e ao mesmo
tempo procura.
Maria Galindo
: Então todas essas conotações da prisão feminina, elas têm
me interessado muito. Eu fiz programas de rádio na prisão. Uma vez por mês, eu
levava todo o meu equipamento de rádio para a prisão e as mulheres podiam falar
o que quisessem. Primeiro, fizemos programas muito inocentes de mulheres que
queriam falar de amor, de liberdade, mas depois elas começaram a enviar
mensagens, começaram a questionar a administração do espaço. Foi que
culminou em uma rebelião e o Ministério do Governo não me deixa mais entrar.
Lia García
: Daí resolvi ir para um desses lugares de confinamento onde se
encontram alguns homens que cometeram crimes gravíssimos relacionados a
sequestro, tráfico de drogas, homicídio, feminicídio, roubo e muito mais. Eu queria
conhecer esses homens. Conhecer suas experiências de vida, saber como
cresceram em seus bairros, como foram treinados na sociedade mexicana para
pensar o que pensam sobre as mulheres trans. Tudo em um projeto
autogestionado. Me perguntam muito por que esse projeto não é coletivo, ou seja,
por que eu não fui com outras mulheres trans fazer esse projeto. É muito
interessante, porque claro que a maior parte dos meus amigos ficaram com medo.
Tiveram muito medo de ir comigo nesse encontro com esses homens, porque não
íamos entrar na prisão com outras mulheres trans. Íamos para os dormitórios onde
estavam os homens cis.
Maria Galindo
: Então começamos um processo de discussão de cinco anos,
uma vez por semana, levantando vários problemas. O primeiro problema, todos os
presos são presos políticos. Não é que existam alguns presos políticos e outros
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presos não políticos. A prisão feminina, na Bolívia, é um lugar de confinamento
para mulheres pobres.
Murilo Gaulês
: No Brasil também.
Maria Galindo
: Sim, em todo o mundo. E através daqueles debates, o que eu
fiz foi compreender a prisão. Não é que eu levei uma visão, mas eu aprendi. Esta
verdade da prisão como local de confinamento dos pobres, como local de dupla
punição de mulheres, porque na Bolívia a prisão feminina e a prisão masculina têm
regras completamente diferentes. Por exemplo, no feminino, as mulheres devem
tornar-se boas. Na origem, as prisões bolivianas eram administradas por freiras.
Então as freiras exerciam um controle criterioso pela religiosidade, pela confissão,
pela proibição do sexo. Na prisão feminina isso é muito forte, enquanto na
masculina esses critérios não existem. Existem outros critérios de violência
interna.
Sayak Valência
: O fato das mulheres se rebelarem contra o binarismo de
gênero, elas desobedecem e, ao desobedecerem, mostram outros pactos e outros
caminhos possíveis fora do binômio. Ou seja, a pessoa se resigna a ser obediente
à masculinidade e outras pessoas mostram possibilidades no horizonte, como
pessoas trans ou mulheres ou pessoas que são a favor de um projeto mais
libertário, dando-nos a notícia de que existe um mundo além deste. É claro que o
dinamismo incomoda os sujeitos individualmente, mas fratura significativamente
o imaginário cultural que nos concebe como vulneráveis, eternamente vulneráveis,
como sacrificáveis. No caso das pessoas trans, é ainda mais radicalizado, porque
elas não estão apenas engajadas na desobediência ativa de certos arranjos de
gênero, mas sim em uma transformação física e uma ruptura do imaginário social
em relação ao gênero e à sexualidade que são as bases materiais para a
dominação masculina sobre outros assuntos. O que elas estão dizendo é que não
apenas não te obedeço, mas que meu corpo me pertence e, além do fato de
pertencer a mim, posso ir para onde estou, para fora de onde sinto que não sou
eu. Então, aqui, há uma ruptura não só com as relações interpessoais, mas com o
contrato social que determina quem é homem e quem é mulher e quais são as
funções baseadas nesse homem e mulher, nesse sentido conservadorista.
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Lia García
: Sim, eles se sentiram desconfortáveis e foi um encontro de grande
impacto de risco, porque trabalhei com meu corpo, ou seja, tive que colocar meu
corpo no centro do encontro para que meus colegas sentissem que estavam se
tocando, ou seja, que sentissem minha pele e que sentissem a experiência das
pessoas trans através da pele. Não através de conceitos que às vezes precisam
ser explicados. O que significa ser travesti? Como viver como travesti? O que
significa ser transexual? As respostas precisavam ser do corpo primeiro. Do uso
do afeto, do toque e do toque como um ato, como uma possibilidade de
desmantelar aquela masculinidade tóxica a partir da minha própria experiência
como mulher trans, e não através de um interlocutor ou uma interlocutora.
Maria Galindo
: Nas prisões femininas da Bolívia, as mulheres têm alcançado
formas relativas, não totais, de autogoverno, onde a polícia, por exemplo, não
consegue acessar determinados lugares. E isso é muito especial. O inimigo é a
polícia, mas uma espécie de sub-regime, uma lei paralela ao Estado, que
converteu todos os espaços em um espaço mais ou menos privado, onde se você
tem dinheiro, você tem um lugar para sentar, você tem um lugar para trabalhar.
Se você não tem dinheiro, você não tem onde sentar, não tem onde trabalhar.
Sayak Valência
: O problema aqui é, por um lado, que a ideia de Estado nos
nossos países tem funcionado de forma disfuncional. E foi criada justamente para
que não funcione da forma especificamente correta, pois dentro da
disfuncionalidade dos estados está em jogo o valor simbólico de que somos
ingovernáveis e que, portanto, não alcançamos a categoria de seres humanos, lidos
como eternamente selvagens ou eternamente crianças que têm que ser
governadas por alguém exterior. Dessa maneira, mesmo que os Estados sejam
libertados ou sejam criados Estados-Nação democráticos com a independência
no nosso continente, a ideia colonial ainda existe. A independência serviu para que
os conquistadores partissem dessas terras, mas o colonialismo permanece e,
como sabemos, constrói imaginários simbólicos, políticos, econômicos, sociais,
culturais, religiosos de uma forma muito poderosa. Este Estado se baseia numa
perspectiva super sexista e super autoritária, onde a figura central de um homem
muito poderoso opera como um super-herói que está a serviço não da população,
como se pretende nas democracias, mas sim como uma substituição do soberano,
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do rei, da monarquia que começa a se diversificar de uma série de maneiras. Como
diz Feinmann (2016), a monarquia passa a ser um patriarcado ou uma fratria que
faz com que os poderes sejam divididos entre esses irmãos que estão ligados por
gênero.
Maria Galindo
: Fui visitar uma mulher na prisão e eu me encontrei com um
companheiro transmasculino, que teve sorte de ter acabado na prisão feminina,
porque se tivesse sido jogado em uma prisão masculina, ele teria sido assassinado,
estuprado.
Lia García
: Por outro lado, quando você pergunta a uma mulher trans se ela
gostaria de estar em uma prisão feminina, ela responde imediatamente que não.
Porque, em primeiro lugar, em uma prisão masculina você pode ganhar mais
dinheiro, trabalhar, ter uma renda. Você pode cortar cabelos, você pode fazer
barbas, e isso não é para os homens presos, mas também para pessoas em
dias de visita. Mulheres trans cortam o cabelo, arrancam as sobrancelhas, tanto
faz. Tem a ver com beleza e a partir daí ganham dinheiro. Em segundo lugar, vem
o trabalho sexual. É um lugar onde os homens podem passar o resto das suas
vidas trancafiados e por isso, obviamente, tem de haver capital sexual, que são os
corpos das mulheres trans ou os corpos dos homens
gays
. E a terceira questão é
porque os papéis da feminilidade são capitalizados. Portanto, o apoio à prisão dos
homens tem de ser feito através dos corpos mais fracos e mais dóceis, ou seja,
quem sustenta uma prisão de homens, são homens afeminados ou mulheres
trans/travestis. Historicamente, nós mulheres, cis ou trans, sustentamos o mundo
através do cuidado. Obviamente mulheres trans, num espaço onde 13 mil
homens, vão sustentar a dinâmica social de uma prisão. Somos nós que lavamos
a roupa, que tricotamos, que fazemos a comida, que cortamos o cabelo, até
companhia de um homem que quer ter uma companheira. Tudo isso gera dinheiro
e cobranças.
Sayak Valência
: Eu uso o termo necropoder para cunhar o que, na minha
perspectiva, é uma categoria que está bastante de acordo com as reflexões que
Foucault (2014) e Mbembe (2018) fizeram. O necropoder atua de diversas formas
e, nesse sentido, pensaríamos nele como um dispositivo de gestão e
operacionalização da violência como um trabalho, mas também do valor simbólico
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que representa a ameaça constante a certas populações. O necropoder atua ou
não atua sobre as populações, mas se aproveita ou se beneficia do medo de ser
assassinado. As populações trans, femininas e outros sujeitos, pelas suas
condições materiais e pelos seus marcadores sociais, também fazem parte
daqueles que estão sendo assediados pelo necropoder. Mas, no caso das pessoas
trans, poderíamos pensar que o necropoder também atua contra uma forma de
desobediência que essas as pessoas representam. Se por um lado somos
submetidos a essa ideia de uma masculinidade necropolítica, ou que exerce
necropoder, ou que é necroempoderada através da obediência ao patriarcado e ao
Estado e a outros grupos onde a masculinidade é uma forma mítica e de
convivência, de restituição simbólica e emocional; por outro lado, vemos que essa
obediência é recompensada pelo Estado e pela sociedade, pela cultura, pelo que
já conhecemos como patriarcado.
Maria Galindo
: Essa pessoa trans era a única pessoa do gênero masculino
em toda a prisão. Primeiro, as mulheres o desprezaram, então ele ganhou muita
fama porque era uma pessoa muito habilidosa com reparos, e a prisão sempre é
um prédio destruído. Depois, ele se tornou um representante de toda a prisão
feminina. E até conseguimos libertá-lo, porque ele estava preso por violência
sexista, porque sua namorada, que era mulher, o denunciou. E a polícia, vendo um
corpo trans, prendeu na hora, por transfobia. Porque quando denunciamos um
homem cisgênero violento, nunca conseguimos levá-lo à prisão. Mas, no caso de
uma pessoa trans, não passou nem meia hora e ele estava preso, sem
advogados, sem processo, sem nada. Conseguimos demonstrar que não havia
processo. Não houve testes, não havia nada além de transfobia da polícia.
Provamos que sua namorada estava usando isso para puni-lo. Essa pessoa trans
agora mora em nossa casa.
Lia García
: E também é verdade que temos que pensar na prisão do ponto
de vista emocional. Isso porque nós, travestis e mulheres trans, também somos
vistas como mães na prisão. Mais cedo ou mais tarde, passamos de objeto sexual
a objeto maternal. Tudo que acontece dentro de nossos corpos. Tem homens que
precisam dessa companhia porque sabem que vão morrer ali e nada melhor do
que morrer apaixonado ou pelo menos acompanhado de uma mulher. O que
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penso é que nossos corpos, na prisão, são como os vestígios, é como o que resta
da feminilidade. Obviamente, os homens têm práticas homoeróticas também,
claro, entre homens, mas as mulheres trans e travestis somos quem seguramos
a prisão do lado emocional, sexual, econômico, doméstico e, por isso, elas têm
que estar lá e não querem sair de lá.
Sayak Valência:
Eu também considero que o necropoder é outra coisa que,
além de ser exercido e eliminar áreas e gerir a morte destas pessoas, obtém
resultados econômicos, políticos e simbólicos e benefícios culturais. Mas também
acredito que o necropoder se torna uma sensibilidade que constrói um imaginário
simbólico onde a violência que leva à morte é normalizada. Chamei isso de
necroscopia. Uma necroscopia é um imaginário simbólico que faz pactos visuais,
que faz pacto com a realidade, que faz pacto com o regime de visualidade,
poderíamos dizer, a partir dos estudos visuais, onde a violência é normalizada e
onde os sujeitos vulneráveis são quase sempre os mesmos e têm as mesmas
características ou intersecções que fazem com que seu assassinato valha a pena,
a favor da padronização e da normalização desse tipo de violência. É normalizar a
violência em contextos em que talvez a violência não seja uma economia direta,
não como o tráfico de drogas, que tem a violência como uma ferramenta para se
capacitar, mas talvez em outras economias, incluindo o entretenimento ou o
consumo, que não trabalham diretamente com a violência, mas que a sua
nacionalização é rentabilizada por estes. Neste caso, penso e cito aqui o trabalho
da Mariana Berlanga Gayon (2020), que fez alguns trabalhos sobre feminicídio e foi
rever como o feminicídio era retratado (literalmente), ou seja, o
frame
onde
aparece o corpo das mulheres assassinadas. Como ele foi reproduzido tanto na
nota roja6, com essas perspectivas super
trash
que colocam nas mulheres trans,
que as mostram em campos abertos, em latas de lixo, que mostram pedaços de
corpos. Tudo muito grotesco, muito sangrento, muito mórbido. Gayon analisa
como era o olhar de quem estava lidando com isso, não somente pela
nota
roja
,
mas ela percebeu isso também pelos laudos policiais e periciais e pela forma
como os peritos masculinos retrataram as mulheres assassinadas. Era o mesmo
6 Nota roja é um gênero jornalístico popular no México. Embora semelhante ao jornalismo sensacionalista ou
amarelo mais geral, a nota roja concentra-se quase exclusivamente em matérias relacionadas à violência
física relacionada ao crime, acidentes e desastres naturais.
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frame destruído e que, por um lado, estava na cultura mórbida da
espetacularização da violência e, por outro lado, havia a cultura científica da
pesquisa que também retratava isso. Portanto, estamos falando de um
frame
patriarcal que não se afirma apenas, que teve a ver precisamente com a
normalização desta violência e com as esferas permanentes que não estão
realmente diretamente ligadas a esta violência, mas são usufruto dela.
Lia García
: Veja, uma das organizações mais conhecidas no México que
trabalha com mulheres trans privadas de liberdade é Almas Cativas, que é uma
organização presidida por duas mulheres trans. Elas trabalham de uma forma
muito orientada para o bem-estar na prisão e, em alguns pontos, eu estava
aconselhando-as a fazerem um trabalho pedagógico. Deu muito certo, mas eu
queria tornar meu trabalho prisional independente, pois meu trabalho era
completamente transformador, abolicionista e bem pedagógico. De uma
pedagogia muito rebelde, então estou muito mais interessada em pensar em
projetos para trabalhar na educação prisional dentro e fora da prisão, de um ponto
de vista abolicionista. também outras organizações, como a Compañia de
Teatro Penitenciário, que trabalha teatro com pessoas privadas de liberdade. Eles
encenaram muitas peças com pessoas que estão presas, mas acho que trabalhar
a partir da experiência trans é necessário. Acredito que as artes cênicas são
definitivamente tecnologias de liberdade porque o que está à frente é o corpo. O
protagonista é o corpo e as pessoas trans são pessoas muito corporais, porque
somos corpos que rompemos com a norma estética do corpo ocidental. Travestis
e pessoas trans sempre colocam uma questão nos espaços porque nossos corpos
são vistos, nossos corpos estão lá, somos pessoas que questionam muito. Então
as artes cênicas, a performance, a pedagogia são esses espaços que nos permitem
transformar a realidade e imaginar novos mundos, criar novos mundos, pensar em
outras possibilidades. E para ser artista e para ser educador não é preciso estudar
(do ponto de vista neoliberal acadêmico), porque qualquer um pode educar com
a própria vida. A vida é a experiência mais rica que você pode usar para educar
alguém e as pessoas trans estão educando o tempo todo, pois a simples colocação
do nosso corpo no espaço que quebra tudo é educativa e pedagógica. E nós
também fazemos arte porque tudo que a gente produz quando falamos da nossa
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própria vida é algo artístico.
Maria Galindo
: Eu acho que essa é uma boa definição, é uma definição
correta, mas é uma definição falsa, não? Eu acho que existem muitas miragens,
muita mitologia. As artes cênicas estão desempenhando papéis diferentes ao
mesmo tempo, depende de como. um papel disciplinador desempenhado
pelas artes cênicas. É impressionante, por exemplo, como o regime de
administração neoliberal da cultura utiliza as artes cênicas para conter populações
marginalizadas. Você não tem serviços básicos, você não tem trabalho, você não
tem infraestrutura, mas você tem um grupo de teatro. Você não pode fazer
assembleia, mas você pode fazer oficina de teatro. uma domesticação. O teatro
parece ser um instrumento útil para domar os que estão abaixo. Mas o teatro que
estes grupos produzem não interessa a ninguém. É um teatro, digamos, em geral
de péssima qualidade, que serve a processo de domesticação. Quando se torna
um processo subversivo, deixa de ser aplaudido. Por exemplo, se eu vou a prisão
feminina e digo que quero fazer um programa de rádio para as mulheres falarem
qualquer coisa, desde reclamar de uma dor de estômago, não importa, eles me
dizem que não. Mas se eu vou a prisão feminina e eu digo que quero fazer uma
oficina de teatro para que tenham autoestima, para que preencham seu tempo
livre, a resposta é: “Passe, sem problemas”. Esse caráter inofensivo me preocupa
muito.
Sayak Valência
: O que me parece importante sobre isso é que é justo pensar
em possibilidades não punitivas. Conheço alguns advogados argentinos que
também trabalham em como pensar a justiça em termos não punitivos. Do ponto
de vista do feminismo, acredito que outras formas. Os povos indígenas também
nos dão outras formas de resolver as questões.
Maria Galindo
: um problema com as artes, que é a separação estrutural
das Belas Artes. As Belas Artes correspondem a um conceito que se arrasta até o
século XIX. Não podemos continuar trabalhando com o conceito de Belas Artes. E
o conceito que passa pela disciplina, pela preciosidade, pelo virtuosismo vai
absorvendo uma quantidade muito importante de energias que não me parecem
valer a pena, parece-me que é como uma forma de desgastar o assunto. Eu não
pertenço ao mundo do teatro, mas acho que depois dos paradigmas de Brecht
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(1970), depois dos paradigmas do Dario Fo (1998), é importante ir mais longe.
Como? Onde? Não sei. Eu acredito que o teatro está funcionando como um
confessionário do Século 21. Como lugar para expurgar dores, para expurgar
culpas, para expurgar defeitos. Eu não gosto desses papéis.
Lia García
: Acho muito complicado falar de abolicionismo penal. Vou vincular
isso ao meu trabalho. Quando faço encontros na prisão, seja com homens ou com
mulheres trans, e recentemente eu estou prestes a começar um trabalho em
presídios para adolescentes, eu nunca pergunto sobre os crimes. Eu entro e não
estou interessada em saber por que as pessoas estão lá. Embora às vezes eles te
digam e você ouça. Eu tenho uma posição abolicionista, para mim as prisões não
funcionam. Estou mais interessada em falar sobre justiça restaurativa, justiça
curativa e justiça trans, que são esses processos em que podemos ver as pessoas
que cometeram crimes como um universo muito maior de desigualdades. Que
esse crime é atravessado por um sistema político, econômico, educacional,
cultural, emocional e afetivo que faz a pessoa acreditar ou se constituir como
criminoso. É como pensar em transfeminicídio, por exemplo. Você não precisa
necessariamente pensar nisso como um crime de ódio, porque afirmar isso é
reduzi-lo a uma questão sentimental e emocional entre duas pessoas. Para mim
são crimes do Estado. Porque é o Estado que tem que reparar e é o Estado que
nos obriga a chegar a esses espaços inseguros, pois não nos fornece políticas
trabalhistas para realizar um trabalho sexual decente, livre de violência e com
direitos para as trabalhadoras do sexo e acabam sendo as que mais assassinam.
São crimes de Estado e as prisões são um braço direito do Estado mexicano e do
Estado brasileiro, pois todas essas lógicas em que o Estado opera se estendem a
esses outros espaços. Abolir as prisões significa abolir as prisões físicas e as
prisões mentais. É abolir o sistema de Justiça Mexicano e o sistema de Justiça
Brasileiro, que a única coisa que fazem é assassinar nossas vidas trans. Como diz
Audre Lord: “Vamos destruir a casa do soberano com nossas próprias
ferramentas”. Como você vai reinserir socialmente, como diz o sistema
penitenciário mexicano, uma pessoa que nunca foi inserida na sociedade? Ou seja,
as mulheres trans nunca estiveram dentro da esfera social, do que é politicamente
aceitável, então como a prisão pensa que vai nos reinserir em um mundo onde
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sempre fomos rejeitadas?
Maria Galindo
: Pessoas trans, para as Mujeres Creando, são fundamentais.
Você não pode pensar em nada hoje sem a desconstrução que as pessoas trans
produzem. A desconstrução do gênero. Porque assim como as Mujeres que
estamos produzindo em primeira pessoa um colapso político do poder, as pessoas
trans tem produzindo uma ruptura fundamental de sentidos. E isso é fascinante.
E estão produzindo em um lugar de muita dor.
Sayak Valência
: Eu entendo essas relações sociais a partir de três conceitos.
O primeiro é o da cidadania, que é o mais conhecido. É aquela exercida a partir de
um homem heterossexual branco patriarcal, que seria o contrato social de que
falamos pouco, que é assinado com o estado revolucionário francês. O segundo
é o da cidadania, que vem do cuidado, do trabalho de cuidado, esse trabalho que
está na base material de todo o resto, desde a reprodução até cuidar dos doentes.
As economistas feministas começam a falar deste trabalho de cuidado
muitos anos, pelo menos desde os anos 1970, e falam do eco do trabalho de
cuidado não remunerado. Não somente Silvia Federicci (2019), mas outras, como
Amaya Pérez Orozco (2006) e outras pessoas, também falam sobre esse trabalho
de cuidado e poderíamos chamar isso de cuidadania. O cidadão é um homem,
branco, heterossexual, voltando ao que sabemos, mas a pandemia de covid-19
colocou esse cuidado no centro para sustentar a vida diante e agora acredito que
estamos em um momento de cuidadania. Mas os Estados não estão fazendo isso.
As relações, as redes estão fazendo esses cuidados como os faziam nos
subterrâneos. Essas redes existiam não tinham esse nome. Por outro lado,
cuirdadania, isso seria um pouco como brincar com a palavra queer. Em inglês,
talvez pudesse ser algo como
queersenship
ou cidadania
queer
, é algo em que
venho trabalhando algum tempo, mas em espanhol chamo isso de cuirdadania,
brincar com a palavra
cuir
(
queer
desamerizanizado) e cidadania. A cuirdadania é
algo que nos leva a pensar que esse fenômeno de cuidado também vem
acontecendo muito tempo junto com a dissidência sexual, inventando outras
formas de ser, outras formas de desejar, mas não apenas de desejar, mas também
de cuidar dos outros e de criar essas comunidades de segurança para muitas
pessoas que estão exiladas da normalidade da sociedade ou que não querem ser
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inscritas nessa normalidade. Em sentido amplo, a cuirdadania seria ligada ao
movimento trans, ao transfeminismo, mas também com a diversidade funcional,
com o status de imigração indocumentada, muitas outras questões. Mas aqui vou
pensar na cuirdadania como um marco. Por exemplo, a partir dos anos 1980, com
a pandemia de AIDS e HIV, podemos ver a cuirdadania agindo no cuidado (porque
cuirdadania teria a ver com cidadania e cuidado, mas também atravessada pela
dissidência sexual e outras transversais como classe, raça, gênero e status de
imigração). Para mim, cuirdadania não é algo que emerge agora - mas é algo que
tenho trabalhado a partir da dissidência - e que não tinha nome para fora, mas
sempre teve um nome para dentro e é uma política tremendamente eficaz, que
também mostra a sua cara muito tempo. Cuirdadania é essa comunidade
que abriga aquelas pessoas que não têm lugar e que vão para esses lugares, eu
sinto que o que é importante para mim não é falar de um novo conceito, mas
traçar uma arqueologia política das redes afetivas que foram feitas a partir do
queer muito tempo, ou do torto, do desviado, das bichas, das sapatões, das
travestis, ou como vocês queiram chamar, para que se diga à cidadania: “você é
uma ficção política que parecia estar aí, mas o que realmente moveu o mundo e
a nós foi o cuidado e a dissidência”. Neste caso, o cuidado em reproduzir a vida
para cuidar de nós mesmos, para cuidar dos idosos, para fazer comida, para o que
entendemos como economia do cuidado. Mas também o trabalho da cuirdadania
é desobedecer e dizer que mesmo sendo um contexto completamente aterrador
no sentido de muita violência e cada vez mais exacerbada, continuamos a existir,
continuamos a resistir e também nos damos o luxo de ser felizes. E isso é muito
importante, porque nem sempre estamos tristes, nem a felicidade é a única coisa
que temos, mas o prazer, a beleza, a celebração, a felicidade e também a tristeza
e o drama compartilhado fazem parte da nossa genealogia política. Eu acredito
que isso é algo que é muito negado dentro da racionalidade política sexual que
permeia o próprio conceito de cidadania. Então, para mim, cuirdadania é dizer que
nós estamos em outro lugar, estamos aqui porque vocês estão obedecendo, mas
também estamos aqui porque simplesmente não queremos obedecer e não
queremos mais ser essa humanidade. O que está sendo quebrado agora é a
estrutura do humanismo que usa todos os valores simbólicos do bom, do justo e
do belo para reafirmar uma hegemonia que na realidade nos levou a esta
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catástrofe e também nos leva a esta catástrofe, porque temos sido predadores
com a natureza e com tudo que é vivo, então a pandemia é consequência desse
mundo da colonialidade, da modernidade e da normatividade, não é uma
consequência nossa. Estamos sobrevivendo e sobrevivemos a todos esses cercos,
desde a colônia até agora, mas o que acho importante é dizer que não somos uma
minoria, somos revolucionários sem armas. O que importa na cuirdadania é que
tanto o feminismo como o queer e outras dissidências de raça, de gênero, outras
interseções tornaram possível um mundo habitável. Embora eles tenham sido
responsáveis por criar um mundo distópico dentro de toda a história, continuamos
a viver. Assim como as flores continuam a desabrochar, assim como ainda
pores do sol, assim como os animais não precisam disso para viver nem para nada.
O cuidado fez justamente um trabalho de resistência e de memória profunda que
não passa pelos circuitos da memória aprovada ou capturada do Estado, a
memória oficial, mas trabalha com a memória afetiva e, portanto, é ainda mais
potente, porque tem um maior risco de contágio, é mais empático e por isso acho
que tem um alcance muito maior. Nossa vingança é sermos felizes.
Maria Galindo
: Para as Mujeres Creando, a vida cotidiana é muito importante.
E nossa casa está cheia, é como um Ministério da Justiça. Está cheia de vida. E
nunca sabemos o que vai acontecer. Chega uma mulher que diz que quer fazer a
oficina de costura? Bem-vinda, pode entrar. Outra diz que quer fazer uma oficina
de ciberativismo? Bem-vinda, pode entrar. Nós queremos que o espaço seja vivo.
Até para fornecer um banheiro. Na Bolívia não existe banheiro público. E a ruas
estão cheias de mulheres construindo outra cidade. E elas não têm um banheiro.
Onde ir ao banheiro? É um grande problema para os vendedores ambulantes. Mas,
na Bolívia, nem pagando te deixam usar o banheiro. É uma espécie de apartheid
racista. Você pode usar o banheiro se você consumir um chá, um café. Mas se
você não pode consumir, você não pode usar. Quero dizer, você nem sempre você
pode consumir, porque você não tem dinheiro. Então nós temos uso gratuito de
banheiro. Não é necessário consumir. Esse pode parecer um detalhe, mas é um
elemento político muito importante. Porque estamos no centro da cidade.
Sayak Valência
: Me parece ser muito importante em sistemas muito
fracturados como o nosso, onde a prisão precisamente não vai ser algo efetivo
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porque não funciona desde o princípio. Não funciona, pois é feita para excluir e
não para reformar de maneira justa. Penso que, em países que são altamente
injustos ou criados de forma tão específica para serem desiguais e injustos contra
a maioria das populações, ou populações que não possuem aspectos econômicos,
simbólicos, raciais, temos que fazer esse trabalho de assembleia na busca daquilo
que entendemos por justiça. Porque estamos a pedir justiça ao Estado, mas o
Estado está impune e o Estado não vai nos proteger e o Estado não é nosso amigo.
Em outras palavras, tenho uma grande amiga poetisa, o nome dela é María Salgado
e em um poema, ela diz: “você nunca agradece a alguém que não para de te
atacar”. Neste momento, talvez o que temos que pensar é como nos defender e
como buscar uma justiça que esteja relacionada com a construção de um
consenso coletivo em que a justiça também seja simbólica e restauradora dos
nossos processos emocionais. Porque eu acho que o que mais dói na injustiça é
que o assunto é fraturado, não no nível jurídico, mas no nível psicológico e
emocional, a injustiça faz isso. Aqui no México, infelizmente, temos muitas histórias
de desaparecimento. Porque se presume que não houve ditadura no México, nunca
foi declarada, mas foram 80 anos de ditadura e com a democracia. Muitos
desapareceram e muitos desses desaparecimentos são devidos ao Estado e
outros devido ao tráfico de drogas. pelo menos uma década ressurgiram muitos
grupos, como os que iniciaram nos anos 1970, de busca de pessoas desaparecidas.
São mulheres, mães, esposas, primas, irmãs buscadoras de pessoas
desaparecidas que também estão criando outra forma de conexão e justiça dentro
de sua própria comunidade. Provavelmente não encontrarão seus filhos, mas
encontram os filhos de outras e com isso criam uma rede afetiva, que chamo de
política post mortem. É a afetividade que nos une após a morte de alguém ou o
desaparecimento de alguém, e acredito que isso também acontece nas
comunidades trans. Tenho um texto sobre isso. Aconteceu na Cidade do México,
quatro anos, uma colega trans trabalhadora do sexo foi assassinada e suas
colegas agarraram o responsável, e levaram-no à polícia. O agarraram com a arma
na mão, ele tinha acabado de matá-la, mas o juiz o soltou. Então, algumas dessas
mulheres ficaram com tanta raiva que decidiram, antes de levar o rapaz para “as
ideias”, levar o caixão para manifestar. Fizeram uma manifestação com caixão no
escritório do advogado para demonstrar na rua. Algo me pareceu muito importante
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e foi que comecei a pensar na questão da política
post mortem
. É que essa
pessoa estava se manifestando em corpo presente mesmo não estando mais viva
e os afetos que a levavam para estavam manifestando que eram suas
companheiras e que não queriam mais isso. Não estavam mais pedindo justiça
para prender o homem, até porque estava preso. Elas estavam exigindo outra
coisa que não é mais justiça punitiva. Elas estavam lutando pelo direito de aparecer
de outra forma, aparecer de forma digna, de forma poderosa e não apenas
vitimada, de modo que é a isso que eu me referia em relação à prisão e à forma
de pensar a justiça como um dispositivo muito atroz. Como organizar a nossa raiva
e a nossa dor e as nossas energias também para não pedir ao Estado apenas
punitivismo contra certos indivíduos, mas pensar nisso a partir de outro lugar?
Porque também existe uma escala diferente entre alguém que roubou um pão
para comer e alguém que massacra uma comunidade inteira na Amazônia para
ficar com as terras, isso é muito diferente. Eu também acho que isso é importante
porque os casos são muito diferentes e o que entendemos por justiça é como
queremos ser indenizados, como vamos nos consertar e eles vão reparar o dano.
Acredito que isso é o mais importante, nem tanto em nível institucional, o
soberano não me interessa, não quero falar com o soberano - o soberano não fala
comigo e eu também não quero falar com ele - mas em nível comunitário, como
estamos fazendo. Por tudo que está sendo feito. Refletir sobre isso e politizá-lo e
posicioná-lo como uma possibilidade além de nossa comunidade micropolítica.
Acho que as prisões deviam desaparecer, mas eu acho que a sociedade caminha
no sentido contrário. Creio que as prisões do nosso continente vão ser cada vez
mais privatizadas e vai haver cada vez mais prisões, o movimento deveria ser o
contrário.
O fora
A produção de narrativa foi historicamente importante para legitimar toda
uma sorte de torturas que sempre chegou para as corpas dissidentes ou, como
diz Sayak Valência (2010), dos sujeitos endriagos. Endriagos são monstros
mitológicos que aqui são utilizados como metáfora para aqueles que não
obedecem, ou seja, os monstros da favela, da dissidência de gênero e sexualidade,
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refugiados, pessoas com deficiência, etc. A autora toma a palavra monstro não de
forma depreciativa, mas sim como algo exuberante e complexo e barroco e com
um imaginário cultural com muitas camadas.
Na contramão de nossa exuberância monstruosa natural, a soberania colonial
nos caça por temer nossa potência endriaga. Somos colocadas em canhões,
queimadas, atiradas de prédios, esfaqueadas e, quando com muita sorte, somos
presas por tentarmos sobreviver pelas poucas alternativas que nos restam nesse
mundo CISmado.
Nesses mais de cinco anos atuando com artes cênicas em penitenciárias e
com pessoas sobreviventes do sistema carcerário, tenho percebido a necessidade
de escavar espaços de interseccionalidade que se proponham a dar conta da
tamanha complexidade que existe no pós-cárcere de corpas dissidentes.
As artes cênicas têm se demonstrado um território potente para
transformação, preservação e permanência de nossas comunidades monstras.
Segundo pesquisa realizada pelo CEDEC (2021), a segunda maior fonte de renda
de pessoas trans e travestis são trabalhos com arte em suas múltiplas linguagens,
perdendo somente para a prostituição. Afinal, quais são os imaginários possíveis e
capazes de mudar os rumos daquelas pessoas que tiveram tatuados em seu corpo
um estigma de presidiário, que as mantém sob a vigilância punitivista do estado,
mesmo depois de ter pagado sua pena (e um preço muito alto, não importa o
motivo que a tenha levado até lá).
Me parece urgente, em tempos como os nossos, onde cada vez mais nossas
rebeldias têm sido capturadas pela violência neoliberal e estatal, erigir uma cena
teatral que acione aparatos de fala para aqueles que nunca puderam falar (como
pessoas que estão ou saíram do cárcere), de modo que sejam realmente ouvidas
com interesse público. Para tanto, o que cabe a nós nesse processo é viabilizar as
formas de organizar esses discursos mutados em cena, acessibilizando repertórios
de criação.
Como já nos disse a bruxa travesti Jota Mombaça:
... eles virão para nos matar, porque não sabem que somos imorríveis.
Não sabem que nossas vidas impossíveis se manifestam umas nas
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outras. Sim, eles nos despedaçarão, porque não sabem que, uma vez aos
pedaços, nós nos espalharemos. Não como povo, mas como peste: no
cerne mesmo do mundo, e contra ele (Mombaça, 2017, p.11).
Entendo a importância que a produção de metodologias e narrativas tem,
tanto para a manutenção quanto para a derrocada dos poderes que nos oprimem
e deixam nossas corpas à beira do abismo do mundo.
Enquanto a mídia branca cisgênero e heterossexista utiliza de programas de
narrativa televisivas, como o Cidade Alerta, para reforçar diariamente que somos
perigosas, abomináveis e, justamente por isso, merecemos sofrer toda a sorte de
tortura e expurgo de terror sobre nossas corpas, nossas comunidades resistem
procurando contar outras versões não contadas de nossas histórias. Versões que
nos tiram dos lugares de dor, de marginalidade, de coitadas açoitadas, para
enaltecer nossas potências. Produzir narrativas junto às nossas que ecoem para
os quatro ventos que, apesar do mundo que nos quer em pedaços, nos mantemos
vivas, potentes e criadoras de sabedorias ancestrais no enfretamento à pedagogia
punitivista, carcerária e genocida que por tantos anos nos fizeram aceitar como
única possível.
Sonhar em nossas criações com tanta verdade, até que ela frature o tecido
frágil da realidade, até que as prisões, todas elas, não sejam nada mais do que um
doloroso pesadelo que ficou para trás na história.
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Aprovado em: 01/04/2024
Universidade do Estado de Santa Catarina
UDESC
Programa de Pós-Graduação em Teatro
PPGT
Centro de Arte CEART
Urdimento
Revista de Estudos em Artes Cênicas
Urdimento.ceart@udesc.br