A dramaturgia antiescravista no Brasil Imperial
Edélcio Mostaço
Florianópolis, v.1, n.43, p.1-10, abr. 2022
sínteses, raciocínios e demais cálculos intertextuais entre noções e conceitos que
poderiam espraiar, territorializar e melhor destrinçar o objeto histórico em recorte:
“demonstrar que o teatro brasileiro colaborou intensamente para a formação de
uma consciência antiescravista nos espectadores” (p. 24). Para tão alentado
volume, a intenção soa por demais modesta.
Outro impasse advém do próprio título: o estudo da literatura dramática não
abarca todo o teatro então praticado, a menos que se tome a parcela pelo todo.
Quer dizer, nem a escravatura emerge historicamente circunstanciada no estudo,
nem o teatro então praticado, em suas variadas instâncias, sendo a mais relevante
a que diz respeito aos intérpretes – alguns deles afrodescendentes. Frustra-se o
leitor, desse modo, que pressupõe encontrar no volume as relações entre o teatro
e a escravidão no país. Na Conclusão, quando se aguarda um dimensionamento
mais efetivo da análise, o autor inicia pelo diagnóstico de Evaristo de Moraes em
1924 quanto à participação das letras nas lutas abolicionistas – indicada como
muito modesta −, além da conferência de João Luso na Academia Brasileira de
Letras, em 1938, que remete ao mesmo juízo. Análises posteriores continuaram
insistindo nessa tecla desabonadora e, somente a partir de 1958, com a obra de
Raymond Sayers
O Negro na Literatura Brasileira
, a avaliação muda de ângulo.
Assim, o estudo quer filiar-se à tradição literária, e não à cênica; deixando de
lado a já apreciável estante de incursões de estudiosos sobre o assunto, com
destaque para Miriam Garcia Mendes, Flora Süssekind, Moacyr Flores ou Joel
Rufino dos Santos, além de outras significativas contribuições em teses e artigos
na mesma direção.
Vejamos um passo dessas dissincronias.
Mãe
, um dos relevantes textos de
José de Alencar a colocar em cena uma protagonista preta, é tomado como
“drama romântico”: a escrava Joana, autodenominada como “mulata velha”, se vê
confrontada com uma situação terrível, ao ver seu filho Jorge (branco) em apuros
para quitar uma grande soma em dinheiro devida por seu futuro sogro a um agiota,
e oferece-se para ser vendida e, desse modo, resolver o embaralhado conflito em
Apenas os autores citados: Mendes, Miriam Garcia.
A personagem negra no teatro brasileiro (1838-1888)
. São
Paulo: Ática, 1982; Süssekind, Flora.
O negro como arlequim: teatro & discriminação
. Rio de Janeiro, Achiamé,
1982; Flores, Moacyr.
O negro na dramaturgia brasileira (1818-1888).
Porto Alegre: EDIPUCRS, 1995; Santos,
Joel Rufino dos.
A história do negro no teatro brasileiro
. Rio de Janeiro: Nova Direção, 2014.