Cabaré das Divinas Tetas
: cruzamentos entre palhaçaria, arte
drag
e feminismos
Dagmar Teixeira Bedê | Raquel Castro de Souza
Florianópolis, v.2, n.47, p.1-20, jul. 2023
[...] ao olhar para o estudo da palhaçaria feminina, o percebo tanto como
espaço de trabalho, de criação e de autoironia quanto um espaço/tempo
de recuperação e de desocultação de tanta coisa… Um espaço que é uma
ruína. Numa ruína sabemos que mais alguém esteve lá. Não vemos quem,
não sabemos exatamente quando. [...] Não que a palhaçaria esteja em
ruínas, ou seja em si uma ruína, mas, para palhaças como eu, que
transitam buscando referências femininas, a sensação de ruína, de
soterramento e de escavação, é frequente. E de desocultação, pois
parece que as precursoras de nossas palhaçarias estão escondidas,
soterradas, invisibilizadas, ocultas pelo tempo e pelo sistema patriarcal
da história (Cardoso, 2020, p. 145).
As palhaças, uai!
Era 2008, ano em que o Coletivo de Palhaços de Belo Horizonte vivia seu
auge. A quarta edição da “Semana Interplanetária de Palhaços”9 era realizada com
uma equipe gestora de aproximadamente 15 pessoas10 – todas palhaças(os)
atuantes. A programação incluía diversas oficinas, espetáculos, cabaré, roda de
conversa, entre outras intervenções espontâneas. Esse evento foi um divisor de
águas no campo das artes
claunescas
locais, devido ao seu impacto e extensão –
foram 29 dias de programação intensa por toda a cidade.
Anos depois, Marcelo Bones11 foi mediador de um bate-papo ocorrido após a
apresentação da Cia Circunstância12, durante a programação do 53º FESTA13, em
Santos/SP (2011), e falou da importância do movimento originado pelo Coletivo de
Palhaços. Por causa de sua extensa programação de oficinas de iniciação às várias
linhas de pesquisa sobre palhaçaria e comicidade, as ações do festival causaram
9 A Semana Interplanetária de Palhaços era um festival realizado pelo Coletivo de Palhaços de Belo Horizonte.
Com sete edições realizadas, o festival juntava uma grande variedade de palhaças e palhaços em sua gestão,
produção e participação. Sua última edição realizada foi em 2017, até o momento.
10 A equipe gestora era formada por Bete Penido, Cícero Silva, Cristiano Pena, Diego Gamarra, Diogo Dias, Junia
Bessa, Lis Nobre, Louisa Mari, Luciano Antinarelli, Marcelo Castillo, Mariana Rabelo, Marisa Riso, Matheus
Ramos, Rafael Marques e Thiago Araujo.
11 Marcelo Bones é diretor, professor e pesquisador teatral. Além de sua extensa trajetória na área – Bones é
um dos fundadores do Teatro Andante, um dos grupos teatrais mais antigos de Belo Horizonte –, Marcelo
pertenceu à velha guarda dos palhaços “não tradicionais” da cidade, apresentando-se inclusive junto com o
Coletivo de Palhaços em parques e ruas da capital.
12 A Cia Circunstância é um grupo que pesquisa palhaçaria e arte de rua em Belo Horizonte. Atualmente é
formada por Dagmar Bedê, Diogo Dias, Evandro Heringer, Luciano Antinarelli, Miguel Safe e Yasmine
Rodrigues. Para saber mais sobre o grupo: www.ciacircunstancia.com.br.
13 Festival Santista de Teatro: https://festivalsantistadeteatro.com.br/.