Experiências com o nariz vermelho – saúde e o corpo que envelhece
Cristina Andrade Filus | Caroline Munhoz Machado
Elizandra Garcia da Silva | Gláucia Andreza Kronbauer
Florianópolis, v.2, n.47, p.1-28, jul. 2023
poderoso e, maravilhoso e, possui graça, harmonia, inteligência, e lucidez, sendo o
moralista, que tem ideais” (Sena; Oliveira, 2021, p 15).
O Augusto, ao contrário do Branco, se apresenta como pobre, humilde e tem
relação com a vida campesina (Sena; Oliveira, 2021). O clown Augusto representa
o marginal, se caracteriza por seu jeito desajeitado, estúpido, indelicado, as roupas
são extremamente largas e os calçados muitos grandes. Tudo nele é exagerado,
inclusive a maquiagem que dá ênfase à boca, aos olhos e, principalmente, ao nariz
vermelho (Bolognesi, 2003).
Apesar de terem características opostas, o Branco e o Augusto se
complementam em cena, um domina e o outro é dominado. Existe ainda um
terceiro tipo de
clown
: o Contra-Augusto. Ele é um meio-termo entre o Branco e
o Augusto, se caracteriza como um puxa-saco e traz características dos dois: a
delicadeza, o autoritarismo e a inteligência do Branco; e a ingenuidade, a
submissão, o grotesco e a tolice do Augusto (Sena; Oliveira, 2021). Reconhece-se,
nesses arquétipos, a relação entre oprimido e opressor.
Tais elementos dialogam com as análises realizadas por Bakhtin sobre a
cultura popular, nos teatros de rua, nos espetáculos de variedades das feiras da
Idade Média
, com especial atenção aos signos corporais, que continuam sendo
encontrados na arte cômica contemporânea. Se a organização social dominante
na época estava interessada em manter privilégios e posições hierárquicas, tal
ideologia estava presente no corpo coisificado da arte elitista, que elevava, ao nível
das ideias, tudo o que, segundo a elite, era central, puro e superior:
[...] é um corpo perfeitamente pronto, acabado, rigorosamente delimitado,
fechado mostrado do exterior, sem mistura, individual e expressivo. [...]
Todos os sinais que denotam o inacabamento, o despreparo desse corpo,
são escrupulosamente eliminados, assim como todas as manifestações
aparentes de sua vida íntima (Bakhtin, 2013, p. 279).
Por outro lado, Bakhtin descreveu as maneiras encontradas pela arte popular
para expressar as contradições de sua época. Cria-se um outro corpo, o corpo
popular, exposto, inacabado, incompleto, transmutável, criador de novos modos
Em
A Cultura Popular na Idade Média
, Bakhtin analisa as influências populares presentes na obra do escritor
François Rabelais (Bakhtin, 2013).