Políticas e poéticas do circo contemporâneo em
Sisma, Tra Tra e corpo-árvore
Maria Carolina Vasconcelos Oliveira
Florianópolis, v.2, n.47, p.1-29, jul. 2023
A fala abaixo do diretor de
Sisma
expressa bem esse ponto:
[Autora:
Sisma
é um trabalho de circo? Xristo:] Ah, essa questão é minha!
[Risos]. Nós estamos vivendo um período de transição, social, político,
como humanos. Não acho que este é um momento muito fácil para
definir coisas [...], [isso] pode restringir nossas possibilidades. Eu dirigi 30
performances nos últimos 15 anos, todas são circo e nenhuma é circo.
Sisma esconde o princípio do circo, mas ele não projeta o circo em sua
forma final [
Sisma
hides de principle of circus but it doesn’t project
circus]. Para mim, circo é uma plataforma, e é algo próximo de uma
blasfêmia também… (Kaouki em entrevista concedida à autora).
No mesmo sentido, Juliana Pautilla, que assina a dramaturgia de
Sisma
, além
de ter acompanhado Lis como ensaiadora em alguns momentos, reflete:
Não sei se é circo. [...] Acho que é mais orbitar pelas coisas do que tomá-
las como centro. [...] Acho que é muito importante habitar a contradição
e retomar as incertezas nesse período em que vivemos. [...] Para mim, a
corda lisa não tem nada a ver com virtuose, há outras poéticas e sentidos
em jogo. O circo talvez esteja na relação com a matéria, com a corda,
com a pedra. [...] Habitar essa contradição é a beleza dessa própria
experiência. Me lembra o John Cage: eu sento no piano, mas eu não toco.
E a música está ali porque eu sou o John Cage. Todo mundo já sabe, já
imagina o que é o circo. Ele já está. É ser e não ser, estar e não estar. Não
é uma questão de desabitar o circo, mas de estar nessa contradição
(Pautilla em entrevista concedida à autora).
Já Lis não hesita em definir
Sisma
como circo: “para mim é circo, é um circo
filosófico”, “é um circo sobre incertezas”. A autora segue: “o circo é o lugar onde
as incertezas são administradas com alto grau de precisão com a virtuose, e a
filosofia é o lugar onde as incertezas são administradas com alto grau de incerteza
mesmo!” (Nobre em entrevista concedida à autora).
A ideia de partir de um certo pensamento ou lógica circense para depois
deslocá-lo também é mobilizada na reflexão do coletivo A Penca. Antes de mais
nada, o grupo se enxerga como circo pela trajetória das artistas que, além de terem
atuação reconhecida por agentes do circuito circense (programas de apoio,
programações, festivais de circo, esferas de formação), possuem também
engajamento em esferas de ação coletiva relacionadas ao circo (A Penca em
Hablemos de Circo, 2022). Reconhecer-se como circenses, nessa perspectiva,
passa também pelo reconhecimento dos pares. Outro aspecto mobilizado na