Um espelho sem reflexo:
A mancha roxa
na crítica teatral brasileira
Clóvis Domingos dos Santos | Paulo Marcos Cardoso Maciel
Florianópolis, v.2, n.47, p.1-26, jul. 2023
As “razões do horror exposto” surgem agora da paralisia da ação exigida pelo
drama, o que incomoda os críticos. Em matéria publicada na revista Visão, Luiz
Carlos Cardoso (1989) retoma esse ponto, observando que a montagem revelava
uma peça dura, brutal e exasperante, cujas breves distensões dificultavam a
continuidade da tensão no texto. Apesar desses comentários, ele ressalta que os
problemas técnicos não afetaram o impacto provocado nos espectadores pelo
encarniçado combate travado em cena, revelador – complementa – do mais
agressivo momento de teatro que já teriam visto, e assim arremata seu raciocínio:
“só um autor com completo domínio da ‘maldição’ pode ir tão longe”. Sua crítica
se pauta na discussão das dificuldades técnicas visando à economia dramática da
peça, em contraponto ao impacto do tema, estilo ou da linguagem. Logo, o eixo da
leitura crítica do espetáculo se desliga até certo ponto do texto e das relações
intersubjetivas nele tecidas, voltando-se para o “combate travado” em cena e seu
impacto no espectador.
As distensões que comprometem a engrenagem da ação dramática, tal como
informado pela crítica já referida, são também consideradas problemáticas por
Alberto Guzik (1989): “o texto, em certas passagens, é desequilibrado por discursos
redundantes, que repisam conceitos explicitados anteriormente na ação. A
exclusão dessas passagens dará mais ênfase à tensão e à violência do original”. A
violência deveria se manter no limite da representação teatral da tensão
dramática. Nesse mesmo sentido, em longo ensaio publicado no
Jornal de Artes
,
Magaldi (1998, p.227) sugere alguns reparos:
O espetáculo dispensa o canto da Professora, previsto em quatro
ocasiões, o que é sem dúvida acertado, porque os versos não são da
melhor qualidade (quebrar, por esse recurso, o realismo do diálogo, não
parece convincente, e prejudica a fluência dos episódios). Às vezes,
introduzem-se repetições, inúteis porque uma réplica já deixou tudo
muito claro (parece forçada, por exemplo, a volta frequente das três
maneiras pelas quais se contrai a Aids). Plínio ganharia, também, em
elaborar mais o pretexto para Linda narrar sua história. Fica visível a
muleta, quando ela diz: "Já te contei meu caso. Mas conto de novo". Por
último, o monólogo da Professora sobre o seu crime vem quase no final,
Esse ensaio viria alguns anos mais tarde a ser republicado no livro
Moderna dramaturgia brasileira
, da Editora
Perspectiva, no qual Magaldi dedica um capítulo a Plínio Marcos e apresenta suas análises a partir da reunião
de obras como
Navalha na carne
,
Abajur lilás
e
Dois perdidos numa noite suja
.