Malabarismo de fogo: Uma etnografia entre imaginário e simbólico
Fabio Dal Gallo | Cristina Alves de Macedo
Florianópolis, v.1, n.46, p.1-28, abr. 2023
Encontra-se aqui mais uma variável limite:
a lógica do risco do instrumento
,
pois o perigo da manipulação do fogo, dependendo do instrumento utilizado, pode
envolver um risco real de morte. É suficiente pensar no que aconteceu com Linda
Farkas, artista húngara que revolucionou o malabarismo de fogo, na primeira
década de 2000, consolidando o que tem sido comumente denominado de “teatro
de fogo”. Ela faleceu em 2018, com apenas 34 anos, ao testar uma estrutura de
fogo, que utilizaria em seu espetáculo.
Vale destacar que, apesar da existência de um risco real de morte, este é um
acontecimento remoto no número da saia, pois a prospecção detalhada dos riscos
reduz, ao mínimo, a possibilidades de incidentes. Este tipo de risco, portanto, se
distancia daquele experimentado, por exemplo, na performance
Rhythm 0
realizada por Marina Abramovich, em 1974, quando a possibilidade de morte
vigorava realmente na cena. No espetáculo
Wiking: uma batalha sonora
,
especialmente no número da saia de fogo de Velga, o risco de morte está presente,
mas principalmente no registro simbólico, se o artista não morre.
Para tratar do registro simbólico, se tornam relevantes as considerações
feitas por Fontana (2019) no livro
La scena
, quando este analisa a cena a partir dos
registros: imaginário, simbólico e real. Como indica Piermario Vescovo, no posfácio
do livro de Fontana (2019, p.119), a cena imaginária, a cena simbólica e a cena real
não podem ser entendidas como caixas separadas entre si, mas como um
“deslocamento de acento”, pois a própria cena não deve ser concebida como um
objeto absoluto ou uma atividade independente.
O imaginário é da ordem da apresentação, e corrobora com o estar no mundo
em relação à imagem com que o sujeito se identifica, o qual encontra, nos outros,
espelhos e pontos identificativos que o sustentam.
Considerando que a dimensão do imaginário é a projeção do sujeito no outro,
a cena imaginária vai envolver uma espetacularização da cidade e da sociedade,
entrando, assim, na esfera do “não isso, mas aquilo” ou “não, mas” (Fontana, 2019,
p.119); na cena imaginária, se apresentam a maioria dos fenômenos lúdico-
espetaculares das tradições festivas. No caso do espetáculo em análise, a morte