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Editorial
Dossiê Temático: Produção de dramaturgia a partir do Sul -
Perspectivas críticas de formação e criação
Imagem da Capa
Projeto Gráfico
: Marcelo Pires de Araújo
Capa em homenagem aos 25 Anos do periódico
Urdimento
Para citar este Editorial:
MEDEIROS, Elen de; BAUMGÄRTEL, Stephan; VIVIESCAS, Victor.
Editorial Dossiê: Produção de dramaturgia a partir do Sul -
Perspectivas críticas de formação e criação.
Urdimento
Revista de Estudos em Artes Cênicas, Florianópolis, v. 2, n. 44,
p. 1-6, set. 2022.
DOI: http:/dx.doi.org/10.5965/1414573102442022e0903
A Urdimento esta licenciada com: Licença de Atribuição Creative Commons (CC BY 4.0)
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Florianópolis, v.2, n.44, p.1-6, set. 2022
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Editorial
Elen de Medeiros (UFMG); Stephan Baumgärtel (UDESC);
Victor Viviescas (UNCO)
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Florianópolis, v.2, n.44, p.1-6, set. 2022
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Editorial - Dossiê Temático: Produção de dramaturgia a partir do
Sul - Perspectivas críticas de formação e criação
Elen de Medeiros1; Stephan Baumgärtel2; Victor Viviescas3
um pouco mais de um ano, escrevemos na chamada deste número que
pretendíamos “abarcar com esse dossiê contribuições que reflitam os modos de
produção de dramaturgia e a formação de dramaturgos em seus referidos
contextos sócio-históricos de enunciação. Convidamos a interrogar esses
processos e contextos como portadores de um saber situado, crítico e
possivelmente decolonial. O dossiê contemplará textos que tragam uma reflexão
sobre as dramaturgias contemporâneas latino-americanas sob uma visada crítico-
teórica que privilegie aspectos e abordagens da América do Sul, buscando encetar
nesse sentido uma desterritorialização de abordagens de conceitos e métodos de
análise oriundos da tradição europeia em sua formação moderna e pós-moderna.
E abrimos as contribuições para além de textos científicos e de análises
acadêmicas literárias e dramatúrgicas, para ensaios, entrevistas, resenhas, relatos
e diários de processos e experiências de criação.
Em outras palavras, buscávamos iniciar uma discussão sobre as relações
entre práticas de escrita dramatúrgicas ibero-americanas da atualidade e as
práticas modernas e contemporâneas como crises do drama e da forma
dramática. Entendemos também que ambas práticas embora a partir de
experiências e perspectivas distintas – respondem a crises e transformações nas
subjetividades e sociabilidades provocadas pela globalização do modelo
1
Professora Doutora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
2
Professor Doutor da Universidade Federal de Santa Catarina (UDESC).
3
Professor Doutor da Universidade Nacional de Colômbia.
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socioeconômico capitalista ocidental. Entretanto, mesmo que esse contexto
globalizado atravesse as realidades sociais das sociedades ibero-americanas, ele é
apenas um horizonte ante o qual se produzem as dramaturgias local e
regionalmente. Daí nossa ênfase em pensar a produção dramatúrgica como
situada. E, dentro dessa perspectiva, refletir sobre suas características
possivelmente decoloniais.
Dentre os textos recebidos, dentre eles artigos científicos, relatos de criação
e dramaturgias, optamos por aprovar para compor o presente dossiê quatro artigos
e dois relatos. Isso porque, observamos, aventamos que o tempo de reflexão sobre
as produções de dramaturgias entendidas aqui como dramaturgias do texto
ao Sul ainda esteja em processo de maturação e provocações. No entanto,
pensamos que este número da Urdimento pode ser um disparador para que
questões posteriores sejam elaboradas, articuladas e geradoras de um
pensamento tanto sobre os modos de produção de dramaturgia quanto sobre a
formação de dramaturgos.
O que se observa, de algum tempo, é a presença multifacetada de textos
criados por artistas deste Sul, vários inclusive de origem não-europeia e não-
ocidental. Mas a reflexão sobre essas obras, a partir de uma abordagem situada
que reflita sobre as relações variáveis entre as expectativas culturais de produção
e recepção artísticas do público-alvo, as influências de escrita vindas de modelos
do norte, inclusive em suas formas não-mais dramáticas, e as práticas concretas
de dramaturgas e dramaturgos, ainda nos parece lacunar. Não por último, talvez,
porque envolve uma apropriação crítica do aparato teórico europeu destacando
sua distância com práticas narrativas do Sul (não raramente de origem oral e
enraizadas em experiências comunais e ritualísticas, com suas aberturas do
mundo humano ao telúrico e ao espiritual), mas implica também uma
compreensão dessa distância como disparador de suas capacidades de mediação.
Essa função de mediação também se torna frutífera, a nosso ver, quando a situação
de recepção abrange textos de traços não-europeus ante um público de
descendentes de imigrantes europeus.
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Dito isso, chamando a uma produção científica que traga reflexões sobre
nossa produção dramatúrgica sob novos prismas, incluímos como primeiro texto
no dossiê o artigo Antes que o céu volte a cair: o teatro latinofuturista imagina
outros futuros?, de André Felipe. Texto que nos convida a imaginar temporalidades
híbridas cujo centro de gravitação está fora das noções ocidentais. Sugere que para
esse exercício de hibridização temporal é preciso inspirar-se em temporalidades
andinas e afrofuturistas para assim criar o que ele esboça como latinofuturismo.
Além de evocar esse latinofuturismo, o autor também imagina concretamente o
latinofuturismo em diversas criações dramatúrgicas na América Latina.
Na sequência, o texto de Fernanda Vieira Fernandes e Mario Celso Pereira
Junior, nomeado Trilogia Sul Invertido: a criação de textos teatrais a partir de
olhares do sul do Rio Grande do Sul, nos apresenta três dramaturgias, criadas a
partir de experiências de vida marcadas por uma marginalização dupla: vidas do
interior desse estado, e vividas por corpos que não pertencem ao mundo social
hegemônico dessa região. Além de apresentar as dramaturgias como reflexões
sobre esse contexto, nos apresenta também um mapeamento das atividades
formativas em escrita teatral no interior desse estado.
O terceiro texto de Giovani José da Silva, Uma dramaturgia original sobre a
tortura, a partir do Sul: os 50 anos de Torquemada, de Augusto Boal, busca analisar
como nessa dramaturgia as relações entre histórias de vida, tempos históricos,
contextos socioculturais e sujeitos discursivos resultam nesse experimento de
uma escrita sobre a tortura durante a ditadura cívico-militar no Brasil.
E por último, o artigo de Paulo Bio Toledo e Natália Cioffi de Lima, nomeado
Sob melancolia histórica: o pós-64 em Moço em estado de sítio, de Oduvaldo
Vianna Filho, no qual são apresentados aspectos tanto da caracterização dos
personagens quanto da escrita cênica como sintomas do momento histórico pós-
64, mostrando dessa maneira como a escrita de Oduvaldo Vianna Filho modificou
o modelo europeu herdado para poder se situar enquanto poética crítica em seu
contexto histórico.
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Além desses artigos, apresentamos dois relatos sobre processos de criação
que mostram as tendências à fragmentação, sobredeterminação e hibridização em
contextos brasileiros. O relato de Mariana Cesar Corale reflete sobre a criação de
sua peça Soledad, como tentativa de evocar na memória da ditadura militar
brasileira uma perspectiva de resistência e crítica aos contextos atuais. O segundo
relato de Raquel Turco Zepka Senna, com colaboração de Walter Lima Torres Neto,
descreve as preocupações poéticas que atravessaram a criação de uma
apropriação dramatúrgica do tema e da figura de Hipólito a partir da realidade do
feminicídio.
Designamos ainda para a seção de fluxo contínuo o belo texto de Evill
Rebouças sobre Cenografia expandida no Brasil uma abordagem a partir do Sul.
Nesse texto, o autor estabelece uma instigante e bem argumentada reflexão sobre
as relações entre a concepção de uma cena expandida e as perspectivas de
epistemologias do Sul. Como esse texto, que é talvez o que mais responde à
problemática de uma criação dramatúrgica com vias decoloniais, se concentra
unicamente em aspectos da cena e não do texto teatral, achamos adequado incluir
ele nesse número como parte da seção fluxo contínuo.
Esperamos que os artigos incluídos no dossiê ofereçam aos interessados em
dramaturgia elementos instigantes para a própria produção reflexiva ou criativa, em
diálogo com experiências de uma escrita textual situada e elaborada segundo
proposições decoloniais.
Universidade do Estado de Santa Catarina
UDESC
Programa de Pós-Graduação em Teatro
PPGT
Centro de Arte CEART
Urdimento
Revista de Estudos em Artes Cênicas
Urdimento.ceart@udesc.br