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(Des)Escolarização performativa: rituais
escolares e a dança na escola
Jair Mario Gabardo Junior
Thaís Castilho
Para citar este artigo:
GABARDO JUNIOR, Jair Mario; CASTILHO, Thaís.
(Des)Escolarização performativa: rituais escolares e a
dança na escola.
Urdimento
Revista de Estudos em
Artes Cênicas, Florianópolis, v. 1 n. 43, abr. 2022.
DOI: http:/dx.doi.org/10.5965/1414573101432022e0105
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Jair Mario Gabardo Junior; Thaís Castilho
Florianópolis, v.1, n.43, p.1-34, abr. 2022
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(Des)Escolarização performativa
1
: rituais escolares e a dança na
escola
2
Jair Mario Gabardo Junior
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Thaís Castilho
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Resumo
A partir dos Estudos da Performance na Educação, esta investigação buscou
compreender alguns dos sentidos da noção de estudante em performance
por meio de uma experiência com dança em aulas de Arte numa escola
pública de educação básica. Ao partir da análise de uma audiovisualidade
produzida nessa experiência, observou-se um ritual escolar que, assentado
sobre símbolos de controle, é subvertido por estudantes em performance
que constantemente reconfiguram as suas ordens. Ao adentrar às
performances sociais no espaço escolar, estudantes passaram a tensionar as
suas posições de sujeito, tornando-se, pois, necessário, maior atrelamento ao
corpo, cuja dança se fez inquietação sobre práticas performativas mais
(des)escolarizadas.
Palavras-chave
: Performance. Rituais escolares. Educação performativa.
Dança. (Des)escolarização.
1
Revisão ortográfica e gramatical do artigo realizada por Luzia Araújo, formação acadêmica: Doutora e Mestre
em Linguística Aplicada-Tradução pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP).
2
Trabalho realizado com o apoio (bolsa de mestrado) da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal
Docente (CAPES) e vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do
Paraná (PPGE-UFPR) intitulado Ensino da dança e a educação performativa: possibilidades de corpo na
(re)criação do espaço escolar (2020).
3
Doutorando pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Paraná (PPGE-
UFPR). Mestre em Educação (UFPR). Bacharel e licenciado em Dança pela Universidade Estadual do Paraná
(UNESPAR). Docente dos Cursos de bacharelado e licenciatura em Dança da UNESPAR Campus II FAP.
jr_gabardo2@hotmail.com
http://lattes.cnpq.br/2486959099861750 http://orcid.org/0000-0003-1903-4748
4
Doutora e mestre em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do
Paraná (PPGE-UFPR). Bacharela e licenciada em Dança pela Universidade Estadual do Paraná (UNESPAR).
Docente do Curso de bacharelado e licenciatura em Educação Física da Universidade Estadual de Londrina
(UEL). tahcastilho@hotmail.com
http://lattes.cnpq.br/7555008672049215 http://orcid.org/0000-0002-3555-7074
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Performative (Un)schooling: school rituals and dance at school
Abstract
Based on Performance Studies in Education, this investigation sought to
understand some meanings of the notion of student in performance through
an experience with dance in Art classes in a public elementary school. From
the analysis of an audiovisual work produced during that experience, a school
ritual was observed that, based on control symbols, is subverted by students
in performance who constantly reconfigure their orders. When entering social
performances in the school space, students began to tension their subject
positions, making it necessary, therefore, to have a greater attachment to the
body, whose dance became a concern about more (un)schooled performative
practices.
Keywords
: Performance. School rituals. Performative education. Dance.
(Un)schooling.
(Des)escolarización performativa: rituales escolares y danza en la
escuela
Resumen
Con base en los Estudios de Performance en Educación, esta investigación
buscó comprender algunos significados de la noción de alumnos en
performance a través de la experiencia con la danza en las clases de Arte en
una escuela pública de educación básica. A partir del análisis de un trabajo
audiovisual resultante de dicha experiencia, se observó un ritual escolar que,
a partir de símbolos de control, es subvertido por el alumno en performance
que constantemente reconfigura sus órdenes. Al ingresar a las
representaciones sociales en el espacio escolar, los estudiantes comenzaron
a tensionar sus posiciones de sujeto, haciéndose necesario, por lo tanto, tener
un mayor apego al cuerpo, cuya danza se convirtió en una preocupación por
prácticas performativas más (des)escolarizadas.
Palabras clave
: Desempeño. Rituales escolares. Educación performativa.
Danza. (Des)escolarización.
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Para dar início às ideias…
O presente texto foi escrito a duas mãos, por dois artistas, docentes e
pesquisadores da dança, que partilham o mesmo interesse em refletir sobre as
urdiduras escolares através do corpo em movimento. É fruto da dissertação de
mestrado do autor, desenvolvida no Programa de Pós-Graduação em Educação da
Universidade Federal do Paraná (PPGE-UFPR), e atravessado pelas provocações da
autora, visto que ambos são membros do Labelite Laboratório de estudos em
Educação, Linguagem e Teatralidades (UFPR/CNPq).
O objetivo deste estudo foi buscou compreender os sentidos da performance
do papel social de estudantes como modo de ser-estar-mover-se no cotidiano
escolar, por meio de uma experiência com o ensino da dança numa escola de
educação básica. Para tanto, estudantes do ano do Colégio Estadual Professora
Luiza Ross, no munícipio de Curitiba/PR, tornaram-se
performers
da pesquisa, que
se dispuseram a trazer para as vivências dançantes suas impressões refletidas em
gestos, cujos significados são objeto de nossa atenção.
Nas trilhas pelas quais se percorreu esse trabalho, a Educação performativa
(Gonçalves; Oliveira, 2020) serviu de embasamento teórico para a observação dos
rituais escolares. Sobretudo, na análise de como as/os performers, ao representar
seus papéis sociais de estudantes, puderam estabelecer diálogos críticos capazes
de problematizar hábitos incorporados em prol de práticas artísticas mais
(des)escolarizadas.
Ao aplicar ao cotidiano escolar uma noção ampliada de ritual, Peter McLaren
(1991) oferece à educação lente para a observação de rituais escolares que partam
da ação dos sujeitos que, em performance, experienciam o processo de
escolarização. Sua contribuição parte dos amplos estudos sobre performance, um
eixo teórico que, desde a década de 1970, tem animado a intersecção de diferentes
campos epistêmicos, que se estendem desde a antropologia, a filosofia, a
linguagem, a sociologia até a arte, suscitando discussões no campo da educação
com base em investigações que tomam o corpo como objeto de interesse.
Deslocar o entendimento tanto de performance quanto de ritual à experiência
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em educação tem sido foco de diferentes autores (McLaren, 1991; Pineau, 2010;
Gonçalves, 2020; Pereira, 2010). Entende-se como Educação performativa os
modos de aproximação da performance em “contextos educacionais, o que
implica um leque de possibilidades teórico-práticas que abrigam desde os estudos
de recepção e estética até literaturas relacionadas ao estudo do corpo e suas
fronteiras e diversidades” (Gonçalves, 2020, p.189).
Nesta direção, assume-se a Educação performativa como aporte teórico, a
qual, atrelada às vivências dançantes, oportunizou aos sujeitos desvelar seus
diálogos com o espaço, conferindo-lhes modos de percepção para os seus corpos,
dentro e fora da sala de aula.
Ademais, a respeito da metodologia escolhida para as práticas corporais,
baseamo-nos no Pensamento Labaniano (Laban, 1978; 1990), especialmente nos
pressupostos da Eucinética, relacionados à expressividade e aos impulsos do
movimento. A escolha dessa perspectiva se deu por ela trazer elementos
dançantes, como os Fatores de Movimento, no intuito de engajar os corpos das/os
estudantes a elaborarem de maneira poética suas performances sociais de modo
a identificar e tensionar os símbolos oriundos da escola.
Assim, a Educação performativa e o Pensamento Labaniano se convergem,
formando a base teórica e metodológica deste trabalho, sendo a primeira uma
lente para propor e analisar os rituais escolares, e a segunda a abordagem
artístico-pedagógica das aulas de dança.
Dito de outro modo, estudos ancorados na Educação performativa têm se
apresentado como lentes dos rituais escolares nas suas dimensões física e
simbólica, dimensões estas capazes de induzir comportamentos incorporados, e
espaços de (res)significação e questionamentos dos modos pelos quais os corpos
escolares performam seus papéis sociais enquanto sujeitos da educação.
as práticas didáticas ancoradas no Pensamento Labaniano procuraram
oferecer estratégias que levaram em conta um dançar que permitiu aos corpos
investigarem a si mesmos como agentes primários de reflexão/ação/partilha,
levando-os tensionar a realidade a eles dada, analisar os rituais escolares
presentes em seus próprios contextos de formação e a intervenção nas dimensões
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física e simbólica assentadas em um educar para o não-movimento.
Isto posto, o imbricamento desses aportes, teórico e metodológico, culminou
no convite aos estudantes à elaboração de audiovisualidades, que se tornaram
corpus de análise do estudo. Tais produções percorreram a seguinte matriz
geradora: “Os espaços da escola como propositores de movimento”. As/Os
estudantes foram convidadas/os a dançar em ambientes pouco convidativos
senão proibidos – ao movimento expressivo, tal como a biblioteca, o chão da sala
de aula, quadra de esportes, corredores etc.; a fim de que pudessem desde a
elaboração, execução e edição dos vídeos ressignificar os rituais ali incorporados.
Uma dessas produções é aqui analisada com base nas seguintes questões de
investigação: Quais os sentidos atribuídos ao corpo e ao movimento a partir de
performances de estudantes podem ser percebidos por práticas de dança no
componente curricular de Arte? O que pode o corpo mover (n)a escola? O que o
corpo que dança revela a respeito dos símbolos oriundos de rituais escolares?
Quais novas abordagens e lógicas rituais o corpo em performance de estudante
possibilita à dança na escola e vice-versa?
Como subsídio a todas essas perguntas está a ideia de que a dança como
meio para uma Educação performativa convoca de nossas performances sociais
como artistas, docentes e pesquisadores um dançar crítico e capaz de intervir
sobre rituais escolares que ainda (de)marcam as experiências corporais com
inércia.
Fez-se necessário e urgente levantar perguntas que incitassem a
(des)escolarização expressada nos corpos, cujo o prefixo “des” nada tem a ver com
o descompromisso com uma formação elaborada, no avesso disso, requer
coragem para recusar performatividades dominantes e ousadia pedagógica e
artística para pluralizar moveres, brincar com os espaços e (re)inventar os
símbolos.
Educação performativa e (des)escolarização
Notavelmente, os rituais são parte da ordem natural das coisas (como na
ritualização dos animais), bem como consequências da ação humana
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(como nas regras e rotinas da vida em sala de aula). A maneira pela qual
ritualizamos nossas vidas é cultura somatizada cultura encarnada em
nossos atos e gestos corporais e através deles (Peter McLaren, 1991, p.73).
Observar o cotidiano e os fenômenos escolares sobretudo a como os
sujeitos dão sentidos aos seus processos educativos pode se tornar um percurso
instigante para o exercício artístico, servindo de orientação às diversas práticas
pedagógicas.
Ao aplicar sobre o cotidiano escolar a noção ampliada de ritual, Peter McLaren
(1991) oferece à educação uma instigante lente para observar fenômenos escolares
a partir da ação dos sujeitos que, em performance, experienciam e ritualizam os
seus processos de escolarização. Significa compreender a performance como
análise daquilo que se ritualiza por intermédio das ações dos sujeitos em
processos de formação, sobretudo na ênfase de como os seus corpos se
apresentam nas dimensões simbólicas da escola. Para o autor, um estudo da
performance como atuação corporal dos sujeitos em seus rituais escolares auxilia
na compreensão de como os processos da escola se organizam tanto tacitamente
quanto de forma exteriorizada.
Para McLaren os símbolos rituais são intrínsecos à educação tomada como
um sistema cultural oriundo nas urdiduras dos convívios sociais a partir de
situações singulares. Os símbolos rituais são compreendidos como instrumentos
mediadores capazes de permitir ao sujeito moldar a sua realidade. Isto requer
reconhecer nos símbolos rituais “um grande poder conotativo pelo próprio fato de
serem multivalentes, físseis, incongruentes, polissêmicos, inefáveis, imponderáveis
e intangíveis. Eles podem entrar em ação simbólica e são capazes de circular
visões de mundo complexas” (McLaren, 1991, p.33).
Por símbolos rituais entende-se o meio pelo qual “os homens se comunicam,
perpetuam e desenvolvem seu conhecimento e atitudes em relação à vida”
(McLaren, 1991, p.32). Trata-se da elaboração complexa e subjetiva de uma cultura
somatizada. Por esta razão, padrões historicamente transmitidos e seus
significados são corporificados em gestos, orientando as diferentes práticas da
vida cotidiana, os modos de pôr o corpo em performance e o assumir de atos
encarnados. Ao corporificar símbolos, os indivíduos expressam em suas
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gestualidades, verbal e não-verbal, o que a eles é transmitido, sendo eles mesmos
sujeitos transmissores e produtores de cultura. Os rituais extrapolam as suas
significâncias para além dos signos: eles criam o mundo para os atores sociais.
A performance, por sua vez, compreende o corpo como centralidade de
discurso e significação. Reconhece a existência estruturada de acordo com modos
de comportamentos repetidos e socialmente reconhecíveis, possibilitando que
qualquer atividade humana possa ser considerada como performance, ou, ao
menos, que toda atividade seja realizada tendo na ação estados de consciência
sobre si mesma. Carlson sugere que a diferença entre
fazer
e
performar
não está
localizada tão somente no teatro em comparação com a vida real, mas na atitude,
quer dizer, “podemos fazer ações sem pensar mas, quando pensamos sobre elas,
isso introduz uma consciência que lhes dá a qualidade de performance” (Carlson,
2009, p.15).
As ideias de McLaren e Carlson partem de uma ampla gama dos estudos
sobre performance, um eixo teórico que, desde a década de 1970, tem animado a
intersecção de diferentes campos epistêmicos, que se estendem da antropologia,
filosofia, linguagem, sociologia até a arte, suscitando discussões no campo da
educação com base em investigações que tomam o corpo como objeto de
interesse. Este último, investigado por intermédio da atuação dos papéis sociais
expressados nas diferentes posições de sujeito que são aprendidas, reforçadas,
negociadas e transformadas cotidianamente por meio da restauração de condutas
performadas em uma cultura ritualmente teatralizada
5
(Schechner, 2000).
Deslocar o entendimento tanto de performance quanto de ritual à experiência
em educação tem sido foco de diferentes autores (McLaren, 1991; Pineau, 2010;
Gonçalves, 2020; Pereira, 2010). A partir de Gonçalves (2020, p.189), por exemplo,
entende-se como Educação performativa os modos de aproximação da
performance em “contextos educacionais, o que implica um leque de
5
Ao que se possa inferir ainda a respeito de cultura ritualmente teatralizada, McLaren (1991) enfatiza a
necessidade de ampliação daquilo que se pode, por meio da performance, chamar de ritual e/ou
teatralidade, permitindo dar a esses termos uma conotação para além daquela vinculada ao contexto
místico/sagrado e/ou a prática teatral in situ. Significa atribuir a essas palavras uma condição nata à
performance humana, como distintas maneiras de (re)organização da vida cotidiana, nos modos de
(r)elaboração das nossas experiências, sobretudo frente àquelas corporalizadas e expressas nas diferentes
posições ocupadas pelo sujeito.
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possibilidades teórico-práticas que abrigam desde os estudos de recepção e
estética até literaturas relacionadas ao estudo do corpo e suas fronteiras e
diversidades”. No decorrer da presente escrita, a Educação performativa é
assumida como suporte teórico-metodológico que busca sustentar a concepção
de performance dos papéis sociais de sujeitos em situação de educação refletidos
a partir das práticas de dança na escola.
O deslocamento aqui apontado, a performance na/como educação, requer
dar aos processos escolares maiores estados de presença aos corpos que
coabitam espaços, físico e simbólico, de produção e partilha do conhecimento.
Significa colocar em comum acordo a atenção às performatividades ainda
fundadas na invisibilidade dos corpos, na previsibilidade dos convívios e nas
práticas pedagógicas que não concebem o exercício, do ensinar e aprender,
permeado e transpassado pela experiência do corpo. Acreditamos ser importante
sinalizar algumas questões mais amplas dos estudos em Educação performativa
que corroboram para as reflexões a respeito da (des)escolarização como mote
para pesquisa em dança na escola.
Um primeiro impulso à prática (des)escolarizada está no exercício constante
de convites à não-fixação de papéis sociais e na desorientação no modo como os
corpos da educação devem performar as suas posições de sujeitos. Isto posto,
ampliam-se os espaços para as múltiplas performances de vida, sabidas e
imagináveis, porquanto, sempre subjetivas e transitórias, capazes de “possibilitar
a apropriação de diferentes papéis e experimentar fronteiras de identidade que
possam questionar padrões dominantes” (Gonçalves; Oliveira, 2020, p.395).
Trata-se, então, de oferecer aos corpos um dançar aberto para além dos
binarismos e hierarquias sociais acentuados nas diversas formas de preconceitos.
(Des)escolarizar processos de educação em dança é permear por práticas de
ensino e aprendizagem que abracem as diferenças, porque as reconhece como
construídas nas fronteiras e na processualidade como condição de existência.
O que temos apresentado até o momento pode dialogar com o conceito de
comportamento restaurado aprofundado por Schechner, teatrólogo e expoente
estudioso da performance. Na perspectiva do autor, a noção de comportamento
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restaurado compreende processos sociais aos quais correspondem as sequências
organizadas de acontecimentos sempre vivenciados pela segunda vez. Para
Schechner, a performance constitui-se como atividade cultural sempre dinâmica,
refeita e reelaborada, que demanda das/dos
performers
, como devem e/ou
deveriam representar/atuar suas posições de sujeitos em determinadas situações
da vida pública. Ou seja, para Schechner (2000), o comportamento restaurado se
faz modelo cultural para práticas e ações a fim de que condutas sejam
armazenadas, transmitidas, manipuladas e/ou transformadas.
O corpo, nesta perspectiva, serve de território para promover atualizações e
é convocado à consciência frente à sua própria realidade no intuito de intervir e
(re)organizar a cultura somatizada na qual se envolve. Interessa aqui, pensar uma
(des)escolarização como Educação performativa a partir de comportamentos
restaurados que denunciem hábitos subjugados às ordens dominantes, não
percebidos pelo contato superficial com as demandas dos corpos. Mas, trazidos à
tona por meio da insistência de práticas dançantes capazes de desafiar e tensionar
a si próprios para atuar de maneira responsiva e inventiva criando, pois, novas
performances de sujeitos da educação.
As aulas se tornam o que Pineau (2013) chama de um convite a educadoras/es
e estudantes a lutarem com os conteúdos da disciplina com o envolvimento de
seus próprios corpos. A metáfora da luta se expressa em situações em que os
sujeitos terão que se dispor a mover os seus corpos mediante estruturas físicas e
culturais sustentadas em ordens estabelecidas e, por isso, demandam do corpo
estados de presença:
O corpo assume a centralidade na performance, ele participa, age,
recupera e reproduz hábitos apreendidos em sua trajetória de
construção. Por ele e por meio dele sintetizam-se significações de ordem
histórica, social e cultural que podem ser analisadas na sua relação com
o espaço e com o tempo.
Pela perspectiva da Educação performativa, os corpos, na sala de aula,
são estudados como corpos em ação, fisicamente em ativismo. O
empenho dessa vertente teórica está na pesquisa de corpos particulares
que representam a si mesmos na sala de aula, promovendo uma análise
evocativa de como cada um desses corpos vê e experimenta a vida e as
interações (Pineau, 2013) (Gonçalves; Oliveira, 2020, p.396).
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Para McLaren (1991), os rituais escolares surgem da padronização das formas
de ser/estar no ambiente escolar, porque deles se originam os meios de controle
das condutas e de reparo constante daquilo que, por intermédio do corpo,
desestabiliza as regras. Trazendo tal concepção às práticas de dança,
compreendemos que a performance pode nos instigar a uma Educação
performativa como meio para animar ações pedagógicas mais (des)escolarizadas
por intermédio de presenças que, no encontro, ampliam sentidos, questionem as
regras e coletivizam experiências.
A (des)escolarização aqui empreendida entende que educadoras/es e
estudantes são sempre muito mais do que papéis unicamente escolares; na
qualidade de sujeitos da educação e de corpos em presença, suas corporeidades
são reconhecidas como territórios capazes de provocar e ampliar a atuação de
novas performances. No ritual da sala de aula, a performance dos papéis sociais
acessa antigas e novas condutas, redimensionando atuações esperadas e
promovendo a ruptura de antigas estruturas.
Abarca-se, ainda, nesta reflexão, a abertura para novas propostas de
intervenção em diferentes realidades, tomando da experiência corporal um
caminho metodológico e analítico das práticas educacionais. Esse olhar
performativo para uma educação em dança permite dar significações de como os
corpos representam a si mesmos em prol de novas representações das suas
identidades. Incluem-se aqui, os “modos de ser, agir, ocupar lugares e posições
que, por sua vez, resultam em discursividades” (Gonçalves; Oliveira, 2020, p.395),
sendo sempre possível nesse processo, produzir as condições de diálogos, leituras
e interpretações da realidade vivenciada.
Dançar sob o prisma da Educação performativa pressupõe conexões
sensíveis entre a arte, as maneiras de aprendê-la e o contexto social onde a dança
é ensinada a fim de incorporar a restauração de comportamentos capazes de
impregnar de novos sentidos os rituais que atravessam os corpos.
No caso deste estudo, o foco está nas discursividades no papel social de
estudantes, que são exteriorizadas na medida em que os corpos das/dos
performers ocupam os espaços da escola e, ao dançar, tensionam os símbolos
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existentes nos rituais de uma instituição pública.
Para dançar uma Educação performativa: Pensamento
Labaniano e práticas de dança na escola
Se, por um lado, a Educação performativa aponta para a experiência da
presença do corpo em toda a dimensão da (des)escolarização, por outro, é possível
indagar como tal dimensão aprofunda-se por meio da arte dentro da escola. Para
isso, o objetivo aqui consistiu em compreender os sentidos acerca da performance
do papel social de estudante por meio de uma experiência com a dança na
educação básica. Interessava saber: i) como a performance social de estudantes
pode ser percebida, problematizada e subvertida a partir da experiência das/dos
performers
com o movimento em aulas de dança na escola, e ii) como
metodologias apoiadas na Educação performativa poderiam contribuir para a
observação dos rituais escolares por meio da dança como presença do corpo em
práticas pedagógicas mais (des)escolarizadas.
Para Laban (1990), a escola pode possibilitar o cultivo da consciência dos
impulsos naturais da expressão corporal, e o atentar à espontaneidade e
desenvolvimento de práticas individuais e coletivas por intermédio do movimento.
A dança, em muitas ocasiões, é praticada com as/os estudantes nas aulas
regulares de Arte e, por esta razão, demanda algumas particularidades para a sua
realização.
Uma dessas particularidades é o fato das/os discentes, muitas vezes, terem
nas aulas de Arte um primeiro contato com essa linguagem artística. Não significa
que a dança não faça parte das suas vidas, mas é nas aulas que ocorre uma
aproximação com os conteúdos estruturantes da dança, de um saber
esquematizado e de repertório teórico e prático próprios, integrados como parte
do currículo escolar e não apenas como atividade extracurricular/eletiva, o que
inclui a obrigatoriedade da experiência com a dança no percurso formativo da
educação básica (Gabardo Junior, 2020, p.100).
Entretanto, pode-se perceber que vivências dançantes nas aulas de Arte têm
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continuamente exigido estratégias de professoras e professores de dança, para
práticas pedagógicas que acessem os diferentes corpos, que propiciem a
ampliação e ressignificação das memórias discursivas dos sujeitos quanto a dança,
e a uma contínua desconstrução de paradigmas, sobre qual corpo pode dançar e
quais espaços a legitimam como forma da arte
6
.
Ao avançar sobre essas questões, vê-se que a dança na escola está para além
de exercitar a criatividade, uma vez que ser criativa/e/o não é apenas uma
peculiaridade do campo artístico. Por outro lado, engajar corpos que, num primeiro
momento, não foram até a escola para praticar a dança, é um desafio que
certamente se faz presente na sala de aula de muitas/os educadoras/es. Afinal,
qual dança dançar? Que práticas em dança são exigidas por meio de prescritivos
normativos, como currículos e projetos político-pedagógicos?
É sabido que os pressupostos de Rudolf Laban têm sido amplamente
debatidos e aprofundados em diversos documentos que orientam os planos de
trabalho docente em inúmeras escolas públicas e privadas do nosso país
(Marques, 2007). Todavia, esta orientação não significa a padronização de
procedimentos didáticos nem receitas que se aplicam a qualquer realidade. Pelo
contrário, as pesquisas sobre a Coreologia, sua propagação e aplicabilidade em
diversos espaços artísticos e etapas/níveis, desde a educação básica até o ensino
superior, têm se mostrado um sistema aberto e passível de interlocuções
(Gabardo Junior; Castilho, 2020).
Como Pensamento Labaniano são tomadas aqui as múltiplas vozes que
atravessam os estudos do movimento inicialmente propostos por Laban no início
do século XX, como uma cadeia dialógica que se permite contaminar e atualizar
os seus pressupostos em diferentes contextos, por onde suas ideias têm
provocado modos de articular pedagogicamente a dança, para os diferentes
propósitos artísticos na contemporaneidade.
Como suporte metodológico, o Pensamento Labaniano forneceu elementos
para que as/os performers refletissem corporalmente as suas impressões sobre
os rituais escolares o que, por sua vez, forneceu subsídios para as estratégias de
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Essas discussões podem ser aprofundadas em Marque (2007) e Strazzacappa; Morandi, (2006).
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leituras de dança, e, portanto, leituras de mundo, capazes de estabelecer conexões
entre os sujeitos e suas realidades (Marques, 2007).
No presente estudo, entende-se o Pensamento Labaniano como uma
abordagem que buscou apresentar a dança por via de suas qualidades expressivas,
e como algo tomado como abertura às múltiplas diferenças que cotidianamente
são encontradas nas salas de aula. A dança, nessa perspectiva, pressupõe do
movimento corporal a interlocução com as circunstâncias impostas aos sujeitos,
a crítica perante os afetamentos sofridos pelo corpo numa cultura somatizada e,
principalmente, a capacidade de atuação corporal frente às ritualidades
igualmente impostas aos sujeitos.
Propor estratégias didáticas a partir do Pensamento Labaniano requer
convidar corpos dançantes à experiência de uma Educação performativa como
reavaliação de suas posições de sujeitos da educação até então vividas ou
percebidas, ampliando, assim, os modos de reivindicar novas performances de
ser/estar estudante, indagando, sempre que possível, as performatividades
impostas e as novas maneiras de aderir com estados de presença.
Para Marques (2007, p.39, ênfase da autora), “aprender uma dança significa
antes de tudo literalmente
incorporar
valores e atitudes”. Isto convida ao exercício
reflexivo a respeito de como as/os estudantes têm incorporado condutas
performativas expressadas em seus corpos ao longo da escolarização e quais as
possibilidades oferecidas por um dançar crítico nas ressignificações das suas
visões de mundo, e por consequência, na ampliação para novas performatividades
mais (des)escolarizadas.
Foi igualmente relevante o interesse nas condutas exigidas por papéis sociais
que, em performance, são representados dentro da escola. Pensá-las nas práticas
de dançar significou reconhecer nos espaços físico e simbólico de urdiduras
escolares, suas reais interferências nas formas pelas quais nos movemos, os
limites e os não-limites do que um corpo poderia, ou não, mover na/com/sobre a
escola. É nas fronteiras entre as performances dos papéis sociais e a dança, que
ritualidades foram postas em cena, tomando desse último, lugar de diálogos entre
as/os
performers
que dançam outros modos para ser/estar estudantes.
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A pesquisa foi realizada no Colégio Estadual Professora Luiza Ross, escola
pública de educação básica localizada na cidade de Curitiba/PR. O estudo
exploratório foi desenvolvido ao longo de um semestre, durante as aulas regulares
do componente curricular de Arte para a etapa de 9º ano do Ensino Fundamental
II. Dele participaram 153
performers
, com idade entre 13 e 14 anos, divididos pela
gestão escolar em cinco turmas, denominadas por essa instituição de 9ºA, B, C, D
e E. Os encontros contaram com: i) aulas teóricas a respeito dos conteúdos da
dança para essa etapa da educação básica, de acordo com o documento
normativo estadual
7
; ii) práticas de dança a partir do Pensamento Labaniano, mais
especificamente, a Eucinética de Laban (1978; 1990), e por fim iii) processos de
criação em dança por meio de audiovisualidades como corpus de análise para o
estudo.
Quanto às aulas de dança de cunho teórico-práticas, buscou-se nos quatro
Fatores do Movimento Fluxo, Peso, Tempo e Espaço as condições para
convidar os corpos das/dos
performers
ao movimento dançado. Nesse percurso,
envolveram-se as práticas de improvisação e composição em dança e de
exercícios de consciência corporal, como mostram os registros nas figuras 1 e 2.
Figura 1Práticas de dança a partir do Pensamento Labaniano em aulas do
componente curricular de Arte na educação básica. Trabalho com improvisação
Fonte: Arquivo do pesquisador (2018).
7
Diretrizes Curriculares da Educação Básica, Arte. Secretaria de Estado da Educação do Paraná, 2008.
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Figura 2 Práticas de dança a partir do Pensamento Labaniano em aulas do componente
curricular de Arte na educação básica. Trabalho com os Fatores do Movimento
Fonte: Arquivo do pesquisador (2018).
Para os estudos anatômicos, foram utilizados métodos de observação do
sistema ósseo com o apoio de um modelo do esqueleto humano, além de
observações de si e dos corpos de outras/os, por meio de exercícios com o toque,
abordados como mapeamento corporal, e realizados de maneira individual e/ou
em duplas/trios. O interesse estava nas sensações sentidas através dos ossos,
músculos e pele; exemplificadas na figura 3.
Figura 3 Práticas de dança a partir do Pensamento Labaniano em aulas do componente
curricular de Arte na educação básica. Trabalho com mapeamento corporal
Fonte: Arquivo do pesquisador (2018).
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Tratou-se, pois, de um conjunto de processos pedagógicos em dança que
demandou das/dos
performers
novas performatividades perante os símbolos por
elas/eles percebidos, como por exemplo, a concepção de novas relações com a
espacialidade física do corpo e da escola demarcação e novas lógicas do que
poderia ser as direções frente/lado/atrás ou cima/baixo/lado –, a prontidão
corporal em ações dançantes que se construíram mediante as relações que cada
performer
assumia na coletividade, ou até mesmo, nas discussões a respeito das
práticas de toque e suas barreiras ideológicas como a hipersexualização na fase
da adolescência.
A dança se constitui, assim, em saberes do corpo na escola na medida em
que são apresentados por meio dos processos em sala de aula, os símbolos de
uma ritualidade escolar capaz de propor novas relações da/do estudante consigo
mesmo e com o seu entorno. Pode-se, então, afirmar que:
A escola pode, sim, fornecer parâmetros para sistematização e
apropriação crítica, consciente e transformadora dos conteúdos
específicos da dança e, portanto, da sociedade. A escola, teria, assim, o
papel não de “soltar” ou de reproduzir, mas sim de instrumentalizar e de
construir conhecimento em/ por meio da dança com seus alunos, pois
ela é forma de conhecimento, elemento essencial para a educação do
ser social. (Marques, 2007, p.23-24).
Instrumentalizar criticamente o corpo por meio da dança implicou em
identificar e adentrar aos rituais escolares sabidos pelas/os performers com o
intuito não apenas de reconhecê-los, mas também de assumir a ideia do corpo
como território de tensões e condições para atuar, agir e performar suas novas
posições de sujeitos da educação.
No intuído de atribuir sentidos às ideias e aproximações empreendidas até o
momento, as aulas de dança, convergiu no convite à produção de
audiovisualidades, a fim de compreender como o movimento dançado reflete e/ou
tensiona as lógicas dos rituais no cenário de uma instituição pública de educação
básica.
Como parte do percurso metodológico desta investigação, destacam-se dois
procedimentos que sustentam as práticas em dança que formam a elaboração
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das materialidades audiovisuais: o primeiro inclui as respostas individuais e
coletivas, dadas por escrito e de maneira anônima, à seguinte questão disparadora:
o que pode o meu corpo mover na escola? Esta pergunta teve o intuito de
compreender os sentidos que o movimento corporal têm às/para os
performers
,
e o quanto das suas percepções se dão conscientemente, ou não, em seus papéis
de estudantes em seus rituais escolares.
Embora não seja objeto principal da análise proposta, vale destacar algumas
das respostas obtidas por compreendê-las pertinentes à pesquisa em educação
e pelo modo como os símbolos dos rituais escolares podem ser notados e, ao
mesmo tempo, ser orientadores das experiências pedagógicas com a dança na
escola:
Legenda: Durante as aulas posso me mover sentada.
Figura 4 Materialidade discursiva da/do Performer 1 a respeito da pergunta disparadora “O
que pode o meu corpo mover na escola?”
Fonte: Arquivo do pesquisador (2018).
Nota-se que certa contradição da resposta da/do Performer 1 demonstra a
ausência da presença, questão cara ao que se almejou compreender ao longo
desse percurso metodológico. A/O
performe
r denuncia o movimento corporal cuja
escola, por meio dos seus símbolos rituais, admite apenas na posição sentada.
Evidencia-se uma concepção de movimento corporal atrelada a uma ritualidade
escolar que pouco convida à presença do movimento. Ou, como bem apontou
Strazzacappa (2001), uma educação para o não-movimento.
Sentidos de movimento como práticas de expressão e conhecimento
no/do/sobre o corpo pouco aparecem nos relatos recolhidos. O movimento como
percepção mais consciente aparece permeado por performances marginalizadas
como estratégias de fuga entre uma aula e outra, ou como invencionice nos
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pedidos de ida aos banheiros:
Legenda: Quando eu dou um migue na professora para ir ao banheiro.
Figura 5 Materialidade discursiva da/do
Performer
2 a respeito da pergunta disparadora
“O que pode o meu corpo mover na escola?”
Fonte: Arquivo do pesquisador (2018).
Na resposta da/do
Performe
r 2, é possível recorrer a McLaren (1991) quando
este se refere ao modo como os corpos da educação canalizam e jogam com os
símbolos da escola. Dito de outro modo, as circunstâncias rituais, presentes na
escola, da mesma forma com que se empenha na corporificação das
performances de ser/atuar o papel de estudante, é, ao mesmo tempo, subjugada
à subversão de suas próprias regras ao mentir sobre o ato de ir ao banheiro. O
corpo não apenas faz dessa prática de “migué” uma ação de ruptura com os rituais
escolares, como também aduz para outras posições de sujeitos que
corporalmente promovem nos rituais espaços para crises. Professoras/es e
gestores da instituição, por sua vez, dedicam-se constantemente a oferecer
modos de reparação das crises suscitadas pelas atuações dos corpos.
Os relatos indicam que não significa que o movimento para além da cadeira
como descrito pela/o
Performer
1 não exista. Ao contrário, sua realização se faz na
simulação da conduta (Goffman, 2014), por quebra das regras ritualizadas, sob
contínua reparação das normas. A partir das respostas colhidas, pode-se refletir
que o movimento por meio da dança requer acolher, justamente, as condutas que,
marginalmente, são expressadas diariamente nos rituais e que por isso, escapam
ao centro dos discursos impostos e das regras que visam as condutas do que é
ser/estar estudante nesse cenário.
Diz respeito aderir a uma ritualidade escolar que possa incentivar as/os
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performers
a impregnar de sentidos os símbolos rituais que as/os interpelam. Não
se trata de incentivar práticas de “migué”, mas de reconhecê-las como parte
constituinte das performances escolares e que, como ato performativo, deve ser
refletido e convocado ao exercício crítico e responsivo do corpo que, em sua
realidade, performa. Segundo Marques:
A “impregnação” de sentidos de nossos atos cotidianos se dá na relação
crítica e dialógica com o mundo, ela se
entre
, no entrelaçamento entre
as instâncias políticas, culturais e sociais e as vivências espaçotemporais
que em nós transitam. Revestimos, impregnamos, contaminamos de
sentidos nossos cotidianos quando somos capazes de conectar nossos
atos às narrativas de nossas histórias em tempos e espaços comuns
(Marques, 2010, p.28, ênfase da autora).
A escola como lugar de experiências coletivas faz parte da construção de
narrativas e histórias corporais, o que conduz ao entendimento de que os rituais
escolares, por aderirem às formas previsíveis e padronizáveis, requerem ser
tensionados por uma Educação performativa que incite processos mais
(des)escolarizados e (des)escolarizantes.
No segundo procedimento, está o convite para a elaboração das
audiovisualidades. Um percurso escolhido como meio de atrelar as práticas de
dança desenvolvidas ao longo do semestre, por compreendê-las como
materialidade discursiva passível de futuros acessos e, principalmente, por dar
às/aos
performers
a condição para expressão e escolhas de composição em dança
mais autônomas. Adotou-se a ideia de matrizes geradoras, entendidas, segundo
Salles (2006), como procedimentos de criação que refletem as escolhas e os
processos que possibilitam à obra tecer relações com o seu entorno. É dessa
conjuntura que se propõe um processo metodológico de criação em dança e vídeo
e uma reflexão sobre alguns dos seus sentidos.
Como matriz geradora foi proposta a ideia “Os espaços da escola como
propositores de movimento”, a fim de se chegar a uma compreensão do modo
como os corpos se percebiam em suas performances como estudantes diante
dos rituais escolares, bem como dos seus símbolos e das relações que estes
podem tecer com corpo, movimento e espaço.
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A elaboração e a edição das audiovisualidades foi realizada da seguinte
maneira:
1. As/Os
performers
, divididas/os em grupos de cinco ou seis integrantes,
como intérpretes-criadoras/es, puderam elaborar um plano de criação em dança
composto de movimentos, coreografados ou não, conforme o desejo de cada
grupo, no intuito de compor a cena, e estipulando entre elas/eles quem iria dançar,
gravar, definir as estratégias para compor a cena, e o instigar do pesquisador do
estudo durante o percurso. Como meios de instigá-las/los, buscou-se propor
perguntas: quais as razões das opções de composição? Qual o porquê de suas
escolhas em relação a determinados locais da escola? A partir dessas
espacialidades, de que modo a ideia do não-movimento se faz presente?
Foi possível verificar que, embora alguns locais fossem tidos como de acesso
proibido pela gestão, as/os
performers
cotidianamente os ocupavam. Tratavam-
se de espaços como a parte superior de um contêiner, utilizado para encontros,
conversas, partilhas de lanches e até mesmo, namoros. O que reforça as práticas
de “migué” como ações corporais altamente subversivas, das quais o corpo joga
continuamente com os rituais escolares. Acentua-se não apenas a necessidade de
acolhimento dessas práticas como motriz de conhecimento de como os corpos
ocupam e recriam novas ritualidades, como produzir espaços para uma educação
crítica e responsiva perante como agem as/os
performers
na escola.
2. A segunda etapa consistiu na ocupação das diferentes espacialidades da
escola, como salas de aula, corredores, pátios, quadras etc. Entretanto, a
espacialidade escolhida pelos grupos deveria ser entendida pelas/os
performers
como pouco convidativa ao corpo em movimento. Isto é, esperava-se um dançar
enquanto ato performativo subversivo de espacialidades tomadas por rituais para
o não-movimento, propondo, assim, novas relações entre os corpos das/dos
performers, seus movimentos e a realidade física e simbólica da escola, como
buscam mostrar as figuras 6 e 7.
Durante o processo de criação, todas as gravações foram acompanhadas
pelo pesquisador, sendo um grupo de
performers
por vez. As/Os demais, que não
estavam incluídas/es/os no momento da gravação, ocupavam a sala de aula a fim
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de elaborar os seus roteiros de criação e/ou ensaiavam suas ações performáticas
no local por elas/eles escolhido, o que impulsionou fazeres mais autônomos e a
ocupação coletiva da espacialidade da escola.
Figura 6 Processos de criação em dança e elaboração das audiovisualidades a partir da
matriz geradora “Os espaços da escola como propositores de movimento”.
Ações corporais nos espaços da sala de aula
Fonte: Arquivo do pesquisador (2018).
Figura 7 Processos de criação em dança e elaboração das audiovisualidades a
partir da matriz geradora “Os espaços da escola como propositores de movimento”.
Ações corporais nos espaços do refeitório
Fonte: Arquivo do pesquisador (2018).
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3. Compartilhamento das cenas criadas ao final de cada encontro por meio
do aplicativo
WhatsApp
ou
Bluetooth
. O procedimento contou, quando necessário,
com o empréstimo do aparelho celular do pesquisador e as/os
performers
puderem utilizar seus próprios aparelhos. Vale ressaltar a inclusão das novas
tecnologias como parte constituinte dos planos de aula em dança, o que pode
levar a uma discussão sobre (des)escolarização na escola contemporânea e
estratégias convidativas às demandas digitais cada vez mais inseridas na
sociedade.
4. A seleção das cenas foi realizada pelas/os
performers
, resultando, ao final,
em cinco arquivos de audiovisualidades, sendo uma para cada turma. O programa
utilizado para a edição do material foi manipulado pelo pesquisador do estudo. Ao
final, as cinco materialidades audiovisuais foram apresentadas nas aulas de Arte
para fruição e diálogos coletivos, como buscam mostrar as figuras 8 e 9.
Figura 8 Processos de criação em dança e elaboração das audiovisualidades a partir da
matriz geradora “Os espaços da escola como propositores de movimento”.
Etapa de edição coletiva
Fonte: Arquivo do pesquisador (2018).
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Figura 9 Processos de criação em dança e elaboração das audiovisualidades a partir da
matriz geradora “Os espaços da escola como propositores de movimento”.
Etapa de apresentação e fruição para todas as turmas
Fonte: Arquivo do pesquisador (2018).
A seguir, analisa-se uma dessas produções, tendo como orientação as
seguintes questões de investigação: Quais os sentidos atribuídos ao corpo e ao
movimento a partir de performances de estudantes podem ser percebidos por
práticas de dança no componente curricular de Arte? O que pode o corpo mover
(n)a escola? O que o corpo que dança revela a respeito dos símbolos oriundos de
rituais escolares? Quais novas abordagens e lógicas rituais o corpo em
performance de estudante possibilita à dança na escola e vice-versa?
Análise da dança na escola sob as lentes de uma Educação
performativa
Os procedimentos metodológicos consideraram um pensar-fazer dança
orientado à autonomia e ao interesse de cada
performer
diante de suas relações
com o modo de perceber seu movimento em urdiduras rituais da escola. Tratou-
se de uma metodologia que buscava nos pressupostos da Educação performativa
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promover experiências em dança capazes de ressignificar sentidos acerca do
corpo como território de intervenção para uma (des)escolarização.
Dado o número significativo de imagem e minutagem no conjunto das
audiovisualidades, optou-se por selecionar uma cena entre todas as
materialidades recolhidas empiricamente. O trecho, denominado de “Galera do 9ª
ano A", foi analisado à luz dos estudos sobre performance e dos seus
imbricamentos no campo educacional, numa abordagem teórica entendida como
Educação performativa, tal qual de início mencionado.
Na materialidade discursiva “Galera do ano A”, é possível identificar uma
cena construída por seis corpos que dançam no espaço escolar da quadra de
futebol, conforme a figura 10.
Figura 10Fragmento da audiovisualidade “Galera do 9º ano A” [02:26] como parte do conjunto
de cenas resultantes dos processos de criação em dança e elaboração das audiovisualidades a
partir da matriz geradora “Os espaços da escola como propositores de movimento”. Ações
corporais nos espaços da quadra de futebol.
Fonte: Arquivo do pesquisador (2018).
O momento da cena denota um jogo de improvisação em dança, instigado
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pelas seguintes matrizes geradoras elaboradas pelos seis
performers
: i) exploração
do nível baixo, médio e alto; ii) investigação do movimento a partir do Fluxo
contínuo e no Fator Tempo desacelerado, conforme estudados na Eucinética,
proposta por Laban, e vivenciados na sala de aula.
Por ser parte da vida ordinária, o movimento “é o denominador comum dos
seres humanos, pois ele existe para satisfazer nossos desejos e interesses”
(Marques, 2010, p.110). A fala de Marques é trazida para a presente análise por
denotar como o movimento corporal é motriz de desejo e interesse gestuais. A
escolha da espacialidade da quadra de futebol demonstra os desejos/interesses
dos seis performers para com este local. A dança, como ideologia de um corpo,
revela sobre a opção da quadra de futebol uma escolha nada desinteressada; ao
contrário, a seleção feita pelos performers está permeada por condições das suas
subjetividades implicadas socialmente sobre os seus corpos.
Nota-se, como bem aponta Schechner (2000), certa conduta restaurada de
sujeitos que, ao serem todos do sexo masculino, parecem ter assumido a escolha
de uma espacialidade ainda demarcada pela performatividade de masculinidade
e relações de gênero, o que, para Schechner, aduz para comportamentos que são
realizados sempre pela segunda vez. Dito de outro modo, adota-se
constantemente da cultura somatizada condutas socialmente construídas,
resgatando delas nossas performances e maneiras de representar nossos
diferentes papéis.
No caso dos seis
performers
, o futebol faz parte das suas ritualidades
escolares: nos jogos durante os recreios, nas partidas nas aulas de Educação Física
ou nas atividades de lazer dentro e fora da escola. Embora a opção pela quadra
de futebol apresente hábitos socialmente aprendidos dentro de uma cultura
escolar teatralizada, onde símbolos operam por meio de uma performatividade de
ser sujeito masculino, é pertinente trazer para esta análise os desejos e interesses
que são reorganizados por meio da prática da dançante.
Segundo McLaren (1991), corpos são territórios performativos capazes de
examinar e remexer nas ideologias dos códigos culturais. No excerto aqui
examinado, os
performers
, por meio da elaboração e experiência de suas matrizes
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geradoras, ressignificam os seus rituais na quadra de futebol, transformando-a,
por intermédio do corpo que dança, em outros símbolos e, por esta razão, em
espacialidades do corpo e espacialidades da escola, abertas para outros
significados além daqueles impostos a respeito deles. O corpo, ao subverter
sentidos de performance previsível, instaura sobre si e sobre o seu entorno
condições para novas leituras por intermédio de seu performativo.
É possível ainda indagar o que há de novos símbolos da dança na quadra de
futebol. A experiência como professor/a da educação básica, tem servido de apoio
empírico para (d)escrever sobre nossas danças na escola, especialmente como
exercício de autoconhecimento, aprofundamento pedagógico e criticidade sobre
nossas práticas. Marques (2007) nos ajuda na resposta, quando enfatiza a dança,
o trabalho de mover não apenas o corpo, mas também, a mobilidade de ideias e
padrões arraigados na cultura escolar a respeito dessa linguagem artística dentro
da escola.
Embora a fala de Marques seja de longa data e a dança tenha alcançado
novos desdobramentos na pesquisa em educação, ainda se vivencia o desafio de
contribuir para a ampliação das percepções estéticas sobre essa arte,
especialmente no compromisso incansável de abrir espaços de discussões sobre
a sua importância na formação cidadã das/dos estudantes.
Cabe a educadoras e educadores a desconstrução dos preconceitos sobre
gênero, esclarecendo que “alunos do sexo masculino a experimentar e discutir
possibilidades de movimentos leves e indiretos (tradicionalmente em nossa
sociedade associados ao feminino) pode levá-los a perceber que não ‘perderão
sua virilidade’ caso se expressem com mais delicadeza” (Marques, 2007, p. 55).
Somado a isso, a necessidade de aprofundar na dança o que se pode entender
na atualidade por virilidade, masculinidade e feminismo.
A cena evoca um performativo dançante e criador de rupturas,
desencadeando novas concepções de ocupar um local rotineiro para propor outras
gestualidades. Afinal, seria a quadra de futebol um lugar para dançar?
Pineau, ao discutir o conceito de corpo ideológico, ressalta que uma
observação da performance na educação consiste na “ênfase dialética no que um
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corpo faz na sala de aula e quais
significados
poderíamos atribuir a essas ações”
(2013, p. 42, ênfase da autora). Nisso está a consideração para com o retorno dos
performers
da audiovisualidade à quadra de futebol, pois tal regresso se
estabelece como outras performances de ser/estar estudantes.
A experiência das suas matrizes geradoras conecta-se às memórias e
afetividades oriundas de desejos e interesses na forma de dança, implicando neste
caso a “capacidade dos corpos de aprender a agir de maneiras diferentes, que eles
já o fazem” (Pineau, 2013, p.43). O que se relaciona com a escolha dos
performers
para um espaço que, embora não denote inicialmente a concepção de não-
movimento, passou a ser um território simbólico para novas formas de ocupação
dos seus corpos em movimento.
Pode-se entender aqui o conceito de comportamento restaurado de
Schechner como repetição, mas também como atualização dos
performers
em
situações anteriormente por eles experienciadas. O dançar na quadra de futebol
passou a ser compreendido como atualização das suas memórias em experiências
de repertórios individuais e coletivos. Ao tratarmos de comportamentos que
resgatam sobre si performances armazenadas, transmitidas e aprendidas ao longo
da vida, os seis
performers
puderam tensionar e atribuir novos símbolos à
ritualidade impressa em seus corpos, dando aos rituais escolares outros sentidos
performativos. A dança é, ao mesmo tempo, propositora e resgatadora de ações
cotidianas com as quais os estudantes, como
performers
das suas experiências,
se expressam corporalmente.
Por ser simbólico e jamais vazio, o comportamento restaurado se fez
multivocalidade dançada e condição para remexer nas estruturas simbólicas de
rituais escolares. Mesmo que os símbolos trabalhem sob lógicas de uma educação
para o não-movimento, ao se esbarrar nas performances das/os estudantes,
rituais subversivos e marginalizados, e por vezes apequenados aos olhos de
professoras/es e gestores, parecem vir à tona. Por esta razão, nota-se na presente
análise que o corpo continuamente adentra aos rituais escolares rompendo sobre
eles brechas para ressignificação e estados de presenças mais (des)escolarizados.
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(Des)Escolarização que nos incita a (não) finalizar
Os estudos sobre performance (Schechner, 2000; Goffman, 2014; McLaren,
1991) ampliam nossas conversações a respeito de como observamos o corpo no
interior de uma cultura somatizada, cuja análise dos fenômenos encontra na
corporeidade um lugar de discurso e significação. São travessias que conduzem a
performance em direção à educação para propor ao pensamento educativo
processos de ensino e aprendizagem imbricados em maiores estados de presença
daquelas/es que vivenciam os diferentes contextos escolares. Espaços de ensino
que, por estarem no entre-tramas dos seus próprios rituais “se tornam parte dos
ritmos e metáforas socialmente condicionados, historicamente adquiridos e
biologicamente constituídos” (McLaren, 1991, p.348), rompendo e afirmando sobre
o campo da educação suas conotações ideológicas, imparcialidades e marcas
sobre todos os corpos.
Acerca do que até aqui pode ser dialogado, requer colocar em comum acordo
que uma (des)escolarização como prática de dança envolve restaurar nossas
condutas performativas para se contestar a atuação dos nossos papéis sociais no
mundo e lançar sobre nossas performances inúmeras perguntas, diferentes
hipóteses e, sobretudo, nos convocar para nossa capacidade crítica, se não
inventiva, de oferecer a nós mesmos novos contornos performativos, outras
maneiras de se colocar em relação com nossa própria corporeidade e com a
corporeidade que em outras/es/os. Portanto, a dança na escola requer uma
invenção das novas performances de ser/estar no mundo e, assim, ao
(des)escolarizar a educação, estaríamos intimamente ligadas/es/os a uma
característica de recepção (Pereira, 2010), cuja dialética pouco ou nada se atrela à
nossa omissão, indiferença ou inércia, mas, ao contrário, se coloca como
permanente diálogo e intervenção.
Pensar e propor pedagogicamente à dança uma Educação performativa
resultou em vislumbrar metodologias que levam em consideração a potência
daquilo que é discursivamente corporal das/dos
performers
para além daquelas
práticas assentadas na reprodução mecanizada de passos; resultou no avesso
dessas coisas, na constante e desafiadora exigência do atrelo da presença corporal
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em todo processo de planejamento didático e nas novas balizas para se planejar
o trabalho docente. Entende-se que educar performaticamente está localizado na
contínua descentralização frente a costumeiras certezas e na abertura para aquilo
que se mostra como desejos do corpo e discursados por ele mesmo.
A Educação performativa como ensino da dança construído a partir de um
Pensamento Labaniano, passou a respaldar os anseios do presente estudo por dar
a ver a restauração de comportamentos mais subversivos sobre lógicas rituais
escolares ainda assentadas na condensação do movimento. Escolha ritual que
parece imperar por não entender o corpo em movimento como parte integrada
dos sujeitos da educação. Tal atenção requer dar a ver as insignificâncias do
ordinário escolar e potencializar práticas tidas como marginalizadas, assim como
aquelas das práticas de “migué”, oferecendo a elas o convite ao ato responsivo e
crítico de um educar mais (des)escolarizado.
O movimento dos sujeitos escolares conduz à concepção de que suas
performances nunca serão estáticas, mas, sim, uma constante condição social
para se jogar com as regras e para agir na reivindicação de novas performances
(Goffman, 2014; McLaren, 1991). Tal afirmação complementa as ideias de Laban
que, “por sua vez, lutava pela (re)conquista do discurso corporal, por entender os
gestos como a parte visível do pensamento” (Castilho, 2022, p.196), por essa razão,
expressados na forma exteriorizada. Um pressuposto que nos tem convocado
cada vez mais para partilhas sensíveis e atentas aos corpos das/dos estudantes,
cuja dança apresenta apenas uma das inúmeras provocações que um corpo pode
e deve oferecer à educação.
Passa-se a compreender os corpos como territórios performativos capazes
de propor trânsitos multirreferenciais, isto é, não apenas como representações
sociais unicamente performadas como estudantes, mas como
performers
que
trazem e levam para dentro da escola as múltiplas performances de vida, públicas
e privadas. Por esta razão, performar o papel social de estudante não será apenas
uma representação social estudantil, mas uma performance atravessada por
outras posições de sujeitos às quais o presente estudo reconhece como
intrínsecas às culturas escolares das/dos performers e que devem ser levadas em
conta em práticas artístico-pedagógicas mais libertadoras.
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Percebe-se que o corpo pode se mover na escola e em relação a ela própria.
As aulas de dança, como parte constituinte do ensino da Arte, têm se mostrado
como caminhos inquietantes no desvelamento de rituais escolares que desafiam
percursos mais alargados ao corpo em movimento, cujo prisma artístico-educativo
tem contribuído criticamente ao exercício do pensamento sobre como os corpos,
mesmo em situação de aparente inércia, jogam, produzem, arriscam e recuperam
meios para se fazer movente. O desafio aqui parece, então, ser o de localizar as
estratégias educacionais que tornem o mover um produto do conhecimento,
desafio que extrapola aquilo que se possa tomar apenas como questão inerente à
experiência com a arte.
Ao dançar, sujeitos são afetados e afetam. A dança incita o corpo à dimensão
dialética enquanto se faz impregnada de sentidos. O corpo dançante na escola
revelou urdiduras que, ao mesmo tempo em que expressa um mover dito apenas
sentado, tensiona e instaura por suas práticas de “migué” contínuas rupturas para
as quebras dos protocolos dos símbolos rituais da escola. Como mencionado
pouco, o desafio de tornar o movimento um mote para o conhecimento requer
novas balizas e insistentes perguntas sobre quais movimentos queremos tornar
saberes e sabidos dentro e fora das salas de aula. Afinal, “educar para a
possibilidade de leituras críticas, perceptivas e entrelaçadas que compõem e
impregnam o mundo de sentidos inicia-se por contrapor-se ao senso comum”
(Marques, 2010, p.30). É necessário reconhecer o movimento corporal existente
nas entrelinhas dos símbolos rituais e trazê-lo às linhas de destaque.
Certamente os saberes da dança possuem um importante lugar nas
discussões sobre corpo, movimento e espaço, e seus prismas têm sido
amplamente discutidos nas pesquisas em educação e arte. O corpo dançante
pode possibilitar, por meio do tripé das relações Arte, Ensino e Sociedade, novas
problematizações, articulações, críticas e transformações (Marques, 2010) aos
símbolos oriundos dos rituais do ordinário escolar, dando a eles não apenas a
restauração de condutas corporalmente apreendidas, mas a instauração de gestos
capazes de se colocar criticamente no mundo e de tecer escolhas mais
conscientes de seu entorno.
As novas ocupações e os modos de ressignificação dos sujeitos da educação
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para com os símbolos emergidos dos rituais escolares passaram a ampliar as
perspectivas acerca do ensino e aprendizagem da dança. Assume-se de uma
Educação performativa a perspectiva de aderir com modos de acolhimento da
corporeidade imersa numa escolarização permeada na previsibilidade dos
convívios e desejos pré-determinados de corpo rumo aos novos comportamentos
das performances de ser/estar
performers
mais (des)escolarizados.
Vislumbrou-se, por intermédio desse estudo, o incitar à não-finalização,
porque se tomou como urgência a continuidade das discussões sobre como os
rituais escolares podem e devem tensionar, por meio das inúmeras singularidades
corporais que coabitam as escolas, os modos de fazer-pensar arte, ensinar e
aprender a criar dança, incitando a partir das performances de professores e
estudantes novos percursos metodológicos em prol dos estados de presença em
incansável (des)escolarização.
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Universidade do Estado de Santa Catarina
UDESC
Programa de Pós-Graduação em Teatro
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