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Corporeidade e teatro de animação na escola:
esconder ou mostrar
Jailson Araújo Carvalho
Para citar este artigo:
CARVALHO, Jailson Araújo. Corporeidade e teatro de
animação na escola: esconder ou mostrar.
Urdimento
Revista de Estudos em Artes Cênicas, Florianópolis, v. 1 n. 43,
abr. 2022.
DOI: http:/dx.doi.org/10.5965/1414573101432022e0109
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Jailson Araújo Carvalho
Florianópolis, v.1, n.43, p.1-18, abr. 2022
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Corporeidade e teatro de animação na escola: esconder ou mostrar
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Jailson Araújo Carvalho
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Resumo
Um dos maiores desafios encontrados no ensino das artes da cena é o de colocar o
estudante em evidência no momento de compartilhar com os colegas sua criação
cênica, sobretudo, quando o que normalmente é posto em destaque é o seu corpo.
Ao refletir sobre tal aspecto, o presente texto tratou da possibilidade do trabalho
corpóreo com estudantes do Ensino Fundamental com o ponto de partida no Teatro
de Animação reflexão teórica a partir da minha pesquisa de Doutorado em Artes
Cênicas, em andamento, na Universidade de Brasília. Este artigo abordará os
seguintes aspectos: o percurso corpóreo dentro do Teatro de Animação, voltado
para o Ensino Fundamental; o corpo na sombra; a corporificação do boneco com as
mãos e o corpo em cena na animação direta. Como procedimento metodológico,
fez-se uso de análise de artigos, dissertações e teses. Concluiu-se que a
corporeidade no teatro de animação apresenta nuances únicas para a experiência
nas aulas de teatro no Ensino Fundamental.
Palavras-chave
: Corporeidade. Teatro de Animação. Pedagogia do Teatro.
Corporeity and animation theater at school: hide or show
Abstract
One of the biggest challenges encountered in teaching the performing arts is to put
the student in evidence when sharing his scenic creation with colleagues, especially
when the focus is usually the body. When reflecting on this aspect, the present text
dealt with the possibility of the body work with students in Elementary School with
the starting point in the Theater of Animation theoretical reflection based on my
Doctorate in Arts research Scenic, in progress, at the University of Brasília. This article
will address the following aspects: the bodily course within the Animation Theater
aimed at Elementary Schools; the body in the shade; the embodiment of the puppet
with the hands; and, the body in the scene in direct animation. As methodological
procedures analysis of articles, dissertations and theses were used. It was concluded
that the corporeity in the puppet theater presents unique nuances to the experience
in drama classes in elementary school.
Keywords
: Corporeity. Animation Theater. Theater Pedagogy.
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Revisão ortográfica e gramatical do artigo realizada por Mircéa Cândida Ferreira, Mestre em Educação (UnB),
Graduada em Letras Português-Espanhol (UnB). Professora de Língua Portuguesa na Secretaria de Educação
do Distrito Federal. mircea.letras@gmail.com
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Doutorando em Artes Cênicas (UnB). Mestre em Artes (UnB). Graduado em Licenciatura Plena em Artes
Cênicas (FADM) e Bacharelado em Interpretação Teatral (FADM). Especialista em Metodologia do Ensino das
Artes (UNINTER), Gestão Escolar (UnB). Professor de Artes Cênicas na Secretaria de Educação do Distrito
Federal. jailson.carvalho@edu.se.df.gov.br
http://lattes.cnpq.br/6215356946936715 https://orcid.org/0000-0002-0888-0634
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Corporeidad y teatro de animación en la escuela: esconder o
mostrar
Resumen
Uno de los mayores desafíos que enfrenta la enseñanza de las artes de la escena es
poner el estudiante en evidencia al momento de compartir con los colegas su
creación escénica, sobre todo cuando lo que suele destacarse es su cuerpo. Al
reflexionar sobre tal aspecto, el presente texto abordó la posibilidad del trabajo
corpóreo con estudiantes de la Enseñanza Básica con el punto de partida en el
Teatro de Animación - reflexión teórica a partir de mi investigación en curso en el
Doctorado en Artes Escénicas, en proceso, en la Universidad de Brasilia. Este artículo
abordó los aspectos subsecuentes: la trayectoria corpórea dentro del Teatro de
Animación destinado a la Enseñanza Básica; el cuerpo en la sombra; la
corporificación del muñeco con las manos; y el cuerpo en escena en la animación
directa. Como procedimientos metodológicos se ha hecho uso de análisis teórico de
artículos, disertaciones y tesis. Se concluyó que la corporeidad en el teatro de
animación presenta matices únicos para la experiencia en las clases de teatro con
estudiantes de la Enseñanza Básica.
Palabras clave
: Corporeidad. Teatro de Animación. Pedagogía del Teatro.
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Corpos em formação
Imagine uma sala de aula em uma escola pública brasileira, com muitas
cadeiras e mesas ou carteiras (uma espécie de cadeira com um suporte na frente
para escrever), quadro negro e, talvez, em algum canto, armários. Em uma parede,
encontra-se a porta de entrada; e, no topo, as janelas pequenas. À frente, janelas
maiores estão a mais ou menos um metro e meio do chão. Nesse cenário, dentro
de tal espaço, vale a tentativa de visualizar uma aula de teatro com estudantes do
Ensino Fundamental – 6º ao 9º ano.
Tal momento na vida estudantil é aquele em que o corpo está em plena
formação. Sob esse viés, as aulas de teatro poderiam ser experiências incríveis
para o autoconhecimento, uma vez que o teatro, “como um dos componentes do
ensino na escola básica e na universidade, é um processo de educação e formação
humana que acentua o potencial humanista, propulsor da consciência estética,
crítica, ética e solidária” (Gaiger apud Cruvinel; Concilio, 2019, p.43). Logo, o teatro
na escola tenta oportunizar diversas experiências no decorrer dessa formação
corporal.
Dessa forma, tratar da corporeidade para as artes da cena encaminha para o
fato de que “o corpo é a fonte primária para a produção de possíveis e variadas
formas de conhecimento” (Vicente, 2017, p.10), sobretudo, quando o que é
experienciado remete ao autoconhecimento. Sobre a questão, Aschieri (2013) leva-
nos a pensar sobre o corpo um lugar de questionamentos da arte como espaço
de criação e experimentações unidas às sensações e emoções que podem ser
partilhadas entre ator e espectador.
Ao refletir sobre o corpo na escola, em especial, nas aulas de teatro, faz-se
necessário ponderar a respeito deste indivíduo que está em formação e que nem
sempre quer ser visto ou posto em evidência. As aulas de teatro, na Secretaria de
Educação do Distrito Federal, ofertadas por um professor com formação em Artes
Cênicas, podem ter seu início no ano do Ensino Fundamental “pode ter”
porque os professores de Artes têm sua formação em diversas linguagens
artísticas.
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Infelizmente, um estudante pode passar por todos os anos do Ensino
Fundamental sem aulas de teatro. Entretanto, quando o estudante se depara com
o professor de Artes Cênicas, um dos maiores desafios dá-se no momento da
exposição e do compartilhamento da criação cênica quando o corpo é posto em
evidência. Para que essa experiência aconteça com significação, segundo Viana
(2016, p.29), um dos caminhos poderia ser o Teatro de Animação:
Pensar o teatro de animação é de alguma forma, pensar na relação do
ser vivo com o não-vivo, que em cena está na relação do ator com o
objeto que anima. Por mais que se tente evitar as dicotomias corpo e
alma, vida e morte, matéria e espírito, sempre acaba existindo uma
comparação entre os modos de ser objeto, coisa, dos modos de ser vivo,
ser.
Com a animação, o processo corpóreo continua existindo, mas com outro
olhar sobre a exposição visual do corpo do estudante em cena. Nesse sentido, as
linhas que se seguem tratam das reflexões iniciais para a escrita da minha tese de
Doutorado sobre a corporeidade a partir do Teatro de Animação.
Assim, uma das possibilidades da animação é a mudança de foco. Com isso,
o que é evidenciado deixa de ser o próprio ator em si, em prol do objeto animado.
No entanto, isso não exclui a necessidade que o trabalho corpóreo exige do ator,
seja com a animação seja com seu corpo em total visibilidade em cena. Logo, este
texto apresentará os seguintes aspectos: o percurso corpóreo dentro do Teatro de
Animação voltado para o Ensino Fundamental; o corpo na sombra; a corporificação
do boneco com as mãos e o corpo em cena na animação direta.
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Corpo e ato de animar em sala de aula
Figura 1 – Experimento pedagógico com teatro de bonecos, em aula com estudantes do
CEF 101 do Recanto das Emas/DF, novembro de 2021. Foto autoria própria.
As experimentações com o Teatro de Animação na escola podem ser
percebidas como um momento de (re)descoberta de dois corpos, quais sejam: o
corpo do estudante e o corpo do objeto que será animado. A Figura 1 apresenta
uma situação em que os estudantes necessitam animar o boneco – caminho que
tem seu início na energia de seus próprios corpos, que será emanada para dar
ânima
aos objetos. Sobre a questão, Roques (2017, p.5) afirma que o “teatro é corpo
e é justamente que se encontra sua especificidade”. Segundo Piragibe (2018,
p.108), no Teatro de Animação, o corpo em questão pode ser o próprio corpo do
ator ou o corpo que será animado:
O Teatro de Animação oferece corpos a ideias e transforma objetos em
corpos na medida em que confere a eles significado dramatúrgico.
Sempre que adequadamente posto no espaço, tornado presente e
dotado de contexto por meio da animação, o objeto-corpo é capaz de
produzir uma impressão violenta sobre a percepção da plateia, uma vez
que passa a ser mais do que uma representação, mas uma
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corporificação.
Assim, no Ensino Fundamental, o estudante em sala de aula pode se enxergar
como uma parte de um todo, para que os elementos composicionais de cena
sejam apresentados e compartilhados para quem for assistir. Esse corpo é uma
parte cujos caminhos corpóreos estão atrelados à relação que se com o objeto
animado. Nesse sentido, é preciso ter em mente que
entender o corpo como um território possível de criação de topografias
internas e externas, de conexões, desconexões, caminhos, meridianos,
constelações, totalidades, vazios, cicatrizes, acumulações, ossos
quebrados, articulações, centros de força, traumas, fortalezas, dores,
etecetera, pode ser uma estragia fértil no desenvolvimento de
processos de criação (Cunha, 2016, p.230-231).
Tal processo, conforme Cunha (2016), necessita percorrer por um corpo que
se coloca à disposição das artes da cena. Quando pensamos nesse estado de
alerta com o Teatro de Animação, é possível ter em mente que o ato de animar
um objeto ocorrerá no momento da partilha do sensível e do imaginário.
Também vale destacar que essa partilha acontece após um vasto processo
de experimentação com a animação e que, antes da animação propriamente dita,
faz-se necessário todo o treinamento corpóreo para que o
ator/estudante/animador se doe e que, por meio de seu corpo, ocorra a magia, e
a ideia de ânima – vida – seja percebida pela plateia.
A corporeidade na ação de animar um boneco, uma sombra ou um objeto
leva a pensar no que será partilhado. Nesse percurso, o corpo aprende sobre si,
sobre suas potencialidades, sobre seus pontos frágeis. Dessa forma, Perlbart
(2008, p.1) conclui que:
vamos aprendendo a selecionar o que convém com o nosso corpo, o que
não convém, o que com ele se compõe, o que tende a decompô-lo, o
que aumenta sua força de existir, o que a diminui, o que aumenta sua
potência de agir, o que a diminui, e, por conseguinte, o que resulta em
alegria, ou tristeza. Vamos aprendendo a selecionar nossos encontros, e
a compor, é uma grande arte.
No Ensino Fundamental, ao transpor a ideia corpórea para a sala de aula, é
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necessário recordar que o aprendizado sobre o corpo, descrito por Perlbart (2008),
acontece ao mesmo tempo em que o corpo está em processo de formação. E
esse desenvolvimento vem carregado de medos e anseios, sobretudo, quando diz
respeito a momentos de exposição para toda a turma.
Nesse sentido, o Teatro de Animação pode ser um excelente aliado do
estudante, pois a evidência da exposição ocorrerá, em grande parte, no boneco, na
sombra ou no objeto animado. Entretanto, para chegar a esse momento, é
importante levar o estudante à compreensão sobre a importância que seu corpo
terá no processo composicional para a cena com o Teatro de Animação.
É a partir do corpo em formação, em ebulição, em uma mistura de medo
com alegria, que emerge o ato de dar a vida. O estudante necessita compreender
que as técnicas no Teatro de Animação dependem de treinamento corporal do
ator/estudante/animador. Sem esse cuidado prévio, a animação poderá se tornar
mecânica, assim a magia de dar a vida poderá não ser aceita pela plateia.
A consciência corpórea que antecede a animação é necessária para que o
processo de criação cênica suceda com mais fluidez. No Ensino Fundamental, tal
processo em sala de aula requer um tempo maior para que os conceitos sejam
assimilados, ampliando-se, por conseguinte, a sensibilidade criativa do estudante.
Tal ampliação pode ocorrer concomitantemente ao desenvolvimento do sensível
que habita em cada ser humano, resultando em maior consciência de si uma
consciência crítica de suas possibilidades corpóreas –, além de possibilitar a
percepção de suas limitações e de como o corpo se portará em cena.
De fato, para que ocorra a relação corpo-animação, no Ensino Fundamental,
o estudante necessita compreender como seu corpo reagirá diante de um objeto
inanimado; como focar naquilo que for animado seja um boneco, uma sombra
ou um objeto –; como a preparação corpórea ocorrerá via criação cênica e como
pensará na limpeza e na contenção de movimentos, na velocidade destes
movimentos, na respiração de seu próprio corpo e na respiração do que for
animado. Além disso, é preciso ter em mente a energia necessária do existir entre
o corpo do estudante e o objeto animado.
Para que a compreensão do corpo no processo de criação do Teatro de
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Animação na escola ocorra com maior tranquilidade, a seguir, apresentam-se
possibilidades do corpo: em sua sombra, corporificando o boneco com as mãos e
em cena na animação direta.
O corpo na sombra
Figura 2 – Cena do espetáculo Iara e o Encanto das Águas, apresentado online para os
estudantes do CEF 101 do Recanto das Emas/DF, novembro de 2021. Fonte: autoria própria.
O teatro de sombras é uma arte tão antiga quanto a própria humanidade.
Podemos perceber experimentos desse tipo de animação em algumas
representações de arte rupestre em cavernas pelo mundo afora. A Figura 2
representa bem tal momento cênico. Nela podemos ver uma cena do espetáculo
Iara
e o
Encanto das Águas
, da Cia Lumiato, apresentado em novembro de 2021,
para as escolas públicas do Distrito Federal dentro do projeto Mediato Teatro de
Sombras.
É possível identificar dois tipos de corpos em cena: os corpos dos atores e
os corpos das personagens de sombra. Mesmo enxergando apenas as silhuetas,
cada corpo pode ser percebido de lugares distintos, ou seja, os corpos dos
atores/animadores estão em cena para animar as personagens/silhuetas. Assim, a
sombra é percebida de dois lugares diferentes existentes em cena: 1) Onde tudo é
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visível para a plateia – a ânima – ideia de vida – é vista diretamente; 2) A sombra
por detrás do pano branco que é animada por corpos que transmitem sua
energia para a personagem.
Para que essa sombra em exposição se torne visível para a plateia, é
fundamental a existência de um corpo preparado para que o processo de
composição de cena aconteça. Tal sombra pode existir de diferentes modos no
espaço, ou seja, pode variar conforme o foco de luz ou pelo tamanho aumentado
ou diminuído a partir da distância em que o corpo é posto da luz.
A sombra pode ser sentida durante a cena como uma poesia que será
[re]descoberta no decorrer da ação. Ela apresenta uma grandiosidade com
caminhos que levam a diversos lugares corpóreos em cena. Quando esse corpo,
através da sombra, é proposto em uma aula de teatro no Ensino Fundamental, a
dinâmica propicia um outro olhar para o estudante.
Figura 3 – Experimentações com teatro de sombras em aula com estudantes do CEF 101
do Recanto das Emas/DF, novembro de 2021. Fonte: autoria própria.
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Na Figura 3, outra possibilidade do trabalho do corpo na sombra em sala
de aula. Ali, o estudante concentra sua corporeidade para animar as silhuetas
dentro da caixa cênica para o teatro de sombras.
A tensão muscular, o tônus, a energia corpórea e a atenção do estudante
estão voltadas para o processo de animação dos corpos das personagens. ali
três corpos em cena: o corpo da criança animadora; os corpos das personagens
de sombras animadas dentro da caixa e os corpos das personagens de sombras
na mesa ao lado, à espera de entrar em cena.
Ao olharmos duas imagens dos corpos na sombra, é possível inferir que as
possibilidades para a ampliação expressiva do corpo em cena, no teatro de
sombras, acontecem em um imenso universo. Tal fato, levado para a aula de teatro
no Ensino Fundamental, pode ofertar mais um caminho de possibilidade para que
o corpo do estudante em formação se veja em cena e se perceba como parte
integrante e importante do processo composicional cênico. Sobre tal percepção,
Oliveira (2018, p.138) afirma que:
no teatro de sombras, como estamos no escuro, a todo momento
acionamos a atenção para a detecção de sinais, os estímulos a todo
momento estão presentes e precisamos estar com essa função aflorada
principalmente para que consigamos detectar erros durante o espetáculo
e conseguir corrigi-los a tempo.
A sombra do próprio corpo ou do corpo da personagem de sombra/silhueta
revela a necessidade de três preparações corpóreas: 1) A anterior à cena; 2) A
durante a cena e 3) A posterior à cena. Antes da cena, o estudante/animador eleva
a sua atenção corporal, seu tônus, sua energia e coloca-se em estado de alerta
para o processo de animação. Durante o compartilhamento cênico, o
estudante/animador coloca-se em cena seu corpo em sombra de forma visível
ou não. Todavia, o corpo está ali, em cena, presente, animando a sombra.
Posteriormente à cena, o estudante necessita voltar para seu estado de calma
um lugar neutro (habitual, diário).
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Figura 4 – O corpo na sombra, janeiro de 2022. Foto autoria própria.
Com base nos três lugares de atenção corpórea, o estudante/animador
compreenderá com mais amplitude o seu corpo na sombra, antes da cena,
durante a cena ou posterior à cena. Em todas as situações, o estudante do Ensino
Fundamental, com seu corpo em formação, terá a oportunidade de experienciar
momentos diferentes em relação ao momento cênico.
Corporificando o boneco com as mãos
Figura 5 – Experimentações com boneco de luva em aula com estudantes do CEF 101 do
Recanto das Emas/DF, novembro de 2021. Foto autoria própria.
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O percurso do Teatro de Animação envolve diversas possibilidades corpóreas
que ampliam a experiência cênica com estudantes do Ensino Fundamental. A
Figura 5 apresenta um experimento teatral com bonecos de luva fantoches.
Estes apresentam uma característica particular: dois corpos em um durante a
cena, ou seja, o corpo do estudante corporifica o corpo do boneco com suas mãos.
Quando pensamos no corpo na sombra, temos a possibilidade de o corpo do
estudante não ser visto em cena, pois ele pode animar uma personagem/silhueta.
com o boneco de luva, o seu corpo normalmente não é visto, mas uma parte
dele está, literalmente, em cena: uma parte do braço e a mão.
A atenção corporal do estudante precisa visualizar dois lugares distintos: por
trás da cena e dentro da cena. A primeira corporeidade encontra-se escondida
durante o processo de animação da personagem. É importante pensar que tudo o
que ocorre nesse lugar pode reverberar e interferir na atuação do boneco de luva.
O segundo é o lugar da cena. Aqui, uma parte do braço junto à mão do
estudante vida,
ânima
, ao boneco. Ele é corporificado e, com isso, a plateia
visualiza um corpo em cena. Esse corpo precisa de tônus, energia, atenção nos
movimentos, ações que se apresentam a partir do corpo por detrás da cena, ou
seja, do corpo do estudante.
A relação mão/boneco/personagem compõem a cena ao interpretar
ideias, sentimentos e desejos impressos na criação. Para os educadores,
que fizerem a opção em trabalhar com esse tipo de boneco, é essencial
não esquecer a contribuição das mãos no processo de sensibilização,
confecção, animação dos bonecos em geral e dos bonecos de luva em
particular (Silva, 2004, p.100).
Assim como Silva (2004) alerta para a potencialidade das mãos para todo o
caminho composicional para a cena com o boneco de luva, as mãos, como parte
do corpo do estudante, são também integrantes do corpo do boneco. Um exemplo
disso é a imagem apresentada na Figura 6.
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Figura 6 – Experimentações com boneco de luva em aula com estudantes do CEF 101 do
Recanto das Emas/DF, novembro de 2021. Foto autoria própria.
Na Figura 6, percebemos dois corpos a partir da corporeidade do estudante.
A ampliação desse corpo em formação é um dos caminhos possíveis para se
trabalhar a expressividade do corpo com estudantes do Ensino Fundamental.
Corpo em cena na animação direta
Foto 7 – Experimentações com boneco de animação direta em aula com estudantes do
CEF 101 do Recanto das Emas/DF, novembro de 2021. Foto autoria própria.
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O processo de animação direta coloca em cena o boneco (ou o objeto que
será animado) junto ao ator/animado. Quando pensamos no teatro de animação
no ambiente escolar, vemos em cena a criança junto ao boneco, o que nos leva à
visibilidade de dois corpos expostos.
Aqui, o trabalho e a atenção corpórea devem levar em questão a dinâmica da
cena. Para tanto, existem alguns questionamentos: se a iluminação deixará o corpo
do estudante em exposição ou não; como será a dramaturgia da cena e que tipo
de boneco será confeccionado. A partir destes, a preparação corporal será
pensada para que o estudante esteja em cena com seu corpo e anime o corpo do
boneco.
Outro aspecto desse processo corporal ofertado ao estudante é o
desenvolvimento de pontos interessantes para a vida. Reis, Santos e Piassi (2019,
p.110), por exemplo, afirmam que o “Teatro de Bonecos assume a possibilidade de
desenvolver a imaginação criativa da criança, a expressividade individual e coletiva
no meio teatral”. Nisso, voltado para o processo escolar, sobretudo, na
corporeidade em cena, alguns fatores são envolvidos, tais como: “a percepção
visual, percepção da sequência dos fatos através da noção de espaço-tempo,
expressão gestual, imaginação, memória, socialização e vocabulário” (Reis, Santos;
Piassi, 2019, p.109).
O caminho em busca do conhecimento e da aprendizagem com significação,
para o estudante, passa, no teatro de bonecos, pelo seu corpo. Esse corpo, como
dito antes, em formação, em crescimento, em busca de uma afirmação ou
pertencimento, ou não. Somente um corpo crescendo no seu devido tempo.
Mostrar ou esconder como reflexões finais
Os caminhos para o corpo do estudante entrar na cena teatral são os mais
variados. Uma das possiblidades é o Teatro de Animação, em que se percorre
por lugares cuja preparação corpórea necessita refletir momentos diferentes da
criação cênica. O corpo antes da cena, em cena e depois da cena deveria ser
uma preocupação de qualquer professor de teatro, em especial, na Educação
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Básica. No Ensino Fundamental, o estudante ainda não compreende suas
possibilidades corpóreas e, se o trabalho não for devidamente conduzido, a
criança poderá se sentir desmotivada e, com o tempo, afastar-se das aulas de
teatro.
O processo de preparação do corpo no Teatro de Animação,
independentemente do objetivo, apresenta suas particularidades. Este texto
propôs pensar sobre este corpo nas aulas de teatro com estudantes do Ensino
Fundamental. Para chegar às nossas reflexões, passamos por três momentos
distintos: o corpo na sombra, corporificação do boneco com as mãos e o corpo
em cena na animação direta.
Entendemos que, em cada circunstância, o trabalho com o corpo exige uma
particularidade diferente. Quando pensamos no corpo do estudante na sombra,
temos um corpo atrás da sombra e um na sua frente. Isso por si só já nos remete
a uma infinidade de treinamentos corpóreos. No entanto, todos buscam um corpo
vivo, alerta, pronto para a animação da sombra, seja ela o próprio corpo, seja uma
personagem de sombra/silhueta.
Outro momento corporal aqui pensado foi a corporificação do boneco com
as mãos. Diferentemente dos caminhos da sombra, neste momento, o estudante
terá uma parte do seu corpo em cena animando o boneco de luva. Sua mão e uma
parte do braço estarão, literalmente, em cena. Isso exigirá outro nível de atenção
corporal, que não é o mesmo da sombra, nem melhor nem pior, mas apenas
diferente.
Por último, pensamos no corpo do estudante em cena no processo de
animação direta. Aqui, os dois corpos estarão visíveis ao público: o corpo do
estudante e o corpo do boneco que será animado. Além disso, também será
diferente a atenção dada na animação com sombra ou com o boneco de luva.
De fato, o Teatro de Animação está intimamente ligado aos processos
corpóreos teatrais. É por intermédio desse corpo vivo que o boneco, a sombra ou
o objeto serão animados. Essa dinâmica é mais um caminho que o professor de
teatro pode utilizar nas aulas de Artes com o estudante do Ensino Fundamental.
É importante não esquecer que a criança se encontra em processo de formação
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corporal, de autoconhecimento e que ainda, a grande maioria, não compreende a
extensão que seu corpo pode alcançar.
Referências
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Subjetividad en movimiento: reapropiaciones de la danza Butoh
en Argentina
. 2013. Tese (Doutorado em Antropologia) Facultad de Filosofia y
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partilha do sensível nas representações do corpo em criação.
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GAIGER, Paulo. O teatro como educação para a liberdade. In: CRUVINEL, Tiago;
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PIRAGIBE, Mario Ferreira. Objeto, corpo, espaço, e... Provocações sobre dramaturgia
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Recebido em: 11/01/2022
Aprovado em: 19/02/2022
Universidade do Estado de Santa Catarina
UDESC
Programa de Pós-Graduação em Teatro
PPGT
Centro de Arte CEART
Urdimento Revista de Estudos em Artes Cênicas
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