e-ISSN 1984-7246
Carmen
Sylvia Vidigal Moraes[ii]
Universidade de São
Paulo (USP)
lattes.cnpq.br/4971024492460323
Felipe Alencar[iii]
Universidade de São
Paulo (USP)
lattes.cnpq.br/8382339312873192
Márcia Aparecida Jacomini[iv]
Universidade
Federal de São Paulo (UNIFESP)
lattes.cnpq.br/4864013782006939
Internacionais de Trabalhadores, Gramsci e a relação trabalho-educação:
reflexões para a política educacional
Resumo
Defrontando-se com as contrarreformas neoliberais
contemporâneas que aprofundam as desigualdades sociais e educacionais, este artigo
tem como objetivo revisitar concepções e propostas de educação e sua relação
com o trabalho, presentes historicamente nos movimentos de trabalhadores, e
analisar em que medida podem contribuir, hoje, para as ações de resistência e
organização de políticas educacionais das classes subalternas nas lutas por
hegemonia. A discussão é realizada por meio de um estudo teórico-bibliográfico,
que visa à divulgação de ideias do campo socialista para a educação. Indicamos
que as propostas para uma educação emancipatória possuem longa trajetória
histórica, e que os espaços de participação ativa dos movimentos do século XIX,
em particular das Internacionais de Trabalhadores e na Comuna de Paris, foram
meios de circulação de ideias pedagógicas para a educação integral da classe
trabalhadora. São retomadas as formulações de Karl Marx, Paul Robin, Antonio
Gramsci, Anatoli Lounatcharski e Nadezhda Krupskaya sobre o trabalho como
princípio educativo. Destacamos as contribuições de Gramsci considerando a
atualidade de seu pensamento para o debate educacional contemporâneo, no que
diz respeito ao vínculo da escola com o processo de disputa de hegemonia e
apreensão da realidade. Desse modo, situamos os desafios para a defesa intransigente
da educação pública, laica, democrática e de qualidade socialmente referenciada
numa formação humana, integral e científica, que dê aos filhos das classes
subalternas a possibilidade de serem dirigentes e construírem o seu próprio
futuro.
Palavras-chave: educação
contemporânea; movimentos socialistas internacionais de trabalhadores; Antonio
Gramsci; relação trabalho-educação.
The International
Workingmen's Association, Gramsci and the labour-education relationship:
reflections for contemporary educational policy
Abstract
Facing contemporary
neoliberal counter-reforms that deepen social and educational inequalities, the
article aims to revisit conceptions and proposals for education and its
relationship with labour, historically present in workers' movements, and to
analyse to which measure they can contribute today to actions of resistance and
the organisation of educational policies of the subaltern classes in the
struggles for hegemony. The discussion is carried out through theoretical-bibliographical
research, which aims to disseminate ideas from the socialist approach to
education. We point out that the proposals for an emancipatory education have a
long historical trajectory, that the spaces of active participation of the
19th-century movements, in particular the International Workingmen's
Association and the Paris Commune, were the means of circulation of pedagogical
ideas for the integral education of the working class. We take up the
formulations of Karl Marx, Paul Robin, Antonio Gramsci, Anatoli Lounatcharski
and Nadezhda Krupskaya on labour as an educational principle. We emphasise
Gramsci's contributions considering the relevance of his thinking to the
contemporary educational debate, concerning the link between the school and the
process of disputing hegemony and apprehending reality. In this sense, we set
out the challenges for the intransigent defence of public, secular, democratic
and socially-referenced quality education in human, integral and scientific
formation, which provides the children of the subaltern classes the possibility
of being leaders and building their own future.
Keywords: contemporary education; socialist movements
international workingmen's association; Antonio Gramsci; the labour-education
relationship.
Introdução
A educação,
institucionalizada em escolas e universidades, tem sido campo de disputa das
classes essenciais da sociedade moderna e de respectivas frações de classe,
tanto no que se refere à sua forma organizacional quanto às concepções e aos
conteúdos de ensino. A
conquista de escolarização pública para crianças e adolescentes configura-se
como um dos direitos essenciais na maioria dos países, assim como no Brasil,
conforme a Constituição Federal de 1998 (Brasil, 1998) (CF/88) e a Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei n. 9394/1996 (Brasil, 1996)
(LDB/96). A educação na forma escolarizada constitui requisito fundamental para
que os sujeitos possam usufruir de outros direitos (Oliveira, 2001).
A dualidade estrutural da escola na sociedade capitalista
expressa a divisão social do trabalho e contribui para reproduzir as
desigualdades sociais. As
inovações na educação, ao longo da história, são consoantes ao desenvolvimento
técnico-científico e cultural de modo que os conteúdos e a forma escolar correspondam
aos interesses hegemônicos das classes dominantes. Na disputa permanente por
hegemonia, as classes dirigentes, por meio do Estado, visam definir sua própria
escolarização em instituições públicas ou privadas, e também a escolarização
das classes populares em condição de subalternidade. Historicamente, a direção
das políticas de Estado, resultantes desse embate, expressa a correlação de
forças entre as classes.
Nessa perspectiva, o
direito à educação escolar das classes populares tem sido marcado pela luta em
torno de sua ampliação com qualidade e limitado por políticas públicas aquém
das necessidades relativas a recursos financeiros e ao estabelecimento de
currículos que favoreçam a apropriação de conhecimentos pelos trabalhadores e
os capacitem a ocupar na sociedade o papel de dirigentes.
Desde a Conferência
Mundial sobre Educação para todos, em Jomtien, no ano de 1990, que aprovou a
Declaração Mundial sobre Educação para Todos, e a aprovação da comercialização
internacional da educação por meio do Acordo Geral sobre o Comércio de
Serviços/GATS (1995), temos observado crescente interesse de setores da
sociedade civil vinculados ao capital na área educacional, seja como forma de
mercantilizar a educação, tornando-a um negócio rentável, seja pela participação
na definição das políticas públicas para educação, configurando distintas
formas de privatização (Adrião, 2017; Ball, 2020).
No atual contexto,
houve uma mudança na linguagem da educação (Biesta, 2013) na qual o direito à
educação foi transmutado para direito à aprendizagem, em claro estreitamento do
papel formativo que a educação escolar deve cumprir na vida das novas gerações
de trabalhadores. Essas mudanças se explicitam na definição de um currículo
empobrecido, alinhado às demandas do mercado de trabalho e baseado em
habilidades e competências que pouco contribuem para a formação integral dos
estudantes e para o desenvolvimento do senso crítico. Trata-se, do ponto de
vista das classes dirigentes, de educá-los para um conformismo que os mantenha
na condição de subalternidade frente à perda de direitos e à ausência de
mobilidade social impostas por políticas neoliberais austericidas, em resposta
às crises cada vez mais frequentes do sistema capitalista.
Diante desse quadro
difícil, o artigo tem como objetivo revisitar algumas concepções e propostas de
educação e sua relação com o trabalho, presentes historicamente nos movimentos
de trabalhadores, e analisar em que medida podem contribuir, hoje, para as
ações de resistência e organização de políticas educacionais das classes subalternas
nas lutas por hegemonia. Trata-se, em resumo, de um estudo
teórico-bibliográfico, que visa contribuir com a divulgação de ideias do campo
socialista para a educação e refletir sobre suas contribuições para pensar a educação
contemporânea e disputar a hegemonia de classe nesse campo.
Na sequência desta
introdução, é importante também indicar que as propostas para uma educação
emancipatória possuem longa trajetória histórica. Apresentamos algumas das
principais discussões sobre educação da classe trabalhadora que circularam nos
movimentos do século XIX, em particular na I Internacional de Trabalhadores/AIT[1]
e na Comuna de Paris, e sua possível relação com as orientações educacionais
desenvolvidas pela Escola do Trabalho, na jovem Revolução Russa de 1917, e com
as contribuições de Antonio Gramsci[2],
considerando a atualidade de seu pensamento para o debate educacional
contemporâneo. Nas considerações finais, mais do que finalizar, indicamos os
desafios que estão postos para aquelas e aqueles que, enquanto intelectuais
orgânicos das classes trabalhadoras, dedicam-se às questões educacionais e se
comprometem com a defesa intransigente da educação pública, laica, democrática
e de qualidade socialmente referenciada numa formação humana, integral e
científica, que dê aos filhos das classes subalternas a possibilidade de serem
dirigentes e construírem o seu próprio futuro.
Circulação de ideias pedagógicas sobre trabalho e educação no
movimento socialista
A partir do aprendizado do cotidiano da luta operária e incorporando
as contribuições de pensadores socialistas anteriores, Marx e Engels elaboraram
uma contribuição síntese que, embora não seja detalhada, fornece os princípios
básicos da educação socialista (Machado, 1989; Moraes, 2019). Sua
obra representa uma ruptura com os modos de pensar anteriores por formular uma
nova teoria, com bases científicas e filosóficas, a respeito do desenvolvimento
histórico-social e formas de constituição das sociedades, especialmente o modo
de produção capitalista, e, com essa perspectiva, promoveram “uma revolução no
âmbito da pedagogia” (Machado, 1989, p. 91).
A importância de suas reflexões no campo da educação reside
principalmente no fato de se apresentarem integradas à crítica radical das
relações sociais capitalistas e à necessidade de sua superação para a
construção da nova sociedade e do novo homem. Tais análises apresentam-se de forma
coerente em um intervalo de mais de 30 anos e coincidem com os momentos
cruciais da investigação desenvolvida pelos autores e da história do movimento
operário (Moraes, 2019, p. 90).
A primeira grande crise do capitalismo industrial
(1830-1840) foi o período que correspondeu à formação do pensamento de Marx
(antes de 1848 e até 1850). Em toda a Europa aquele foi o momento das grandes
revoluções burguesas que tiveram seu apogeu em 1848, na França, acontecimentos
que estimularam a reflexão marxiana: expansão rápida do capitalismo, formação
de um sistema internacional de Estados capitalistas, organização do movimento
operário (I Internacional), início da agitação social na Rússia (primeiro país
não desenvolvido a manifestar crise) e, marcando o fim das revoluções jacobinas
e o começo da era das revoluções proletárias, a eclosão da Comuna de Paris
(Machado, 1989).
Além das considerações de Marx sobre as ações da Comuna de Paris no
campo do ensino em 1871, Marx e Engels trataram da questão educacional em três
programas políticos redigidos no período: para criação do movimento que assumiu
o nome de Partido Comunista (Manifesto do Partido Comunista), às vésperas da
revolução de 1848; para as Conferências da I Associação Internacional dos
Trabalhadores, entre 1866 e 1868; para o Primeiro Partido Operário Unitário, na
Alemanha, em 1875 (na Crítica ao Programa de Gotha). Há contribuições ao
tema em A ideologia alemã (1845/46), no primeiro volume de O Capital
(1867) e (1875), e, também, umas rápidas notas sobre educação profissional no
manuscrito anexo a Trabalho assalariado e Capital (1849), intitulado O
salário (Moraes, 2019; Nogueira, 1990; Machado, 1989; Palácios, 1978).
Embora haja mudanças nas propostas educacionais de Marx e
Engels durante todo período, o que persiste é a ideia da necessidade, para os
trabalhadores, da união do ensino com o trabalho. Num contexto em que as
crianças eram exploradas como mão de obra na produção fabril em condições
insalubres, as exigências referentes à associação entre trabalho e instrução
são incorporadas, já em 1848, no Manifesto do Partido Comunista, em que além da
defesa da “educação pública para todas as crianças” e a abolição do trabalho
infantil nas fábricas, propõe-se “a integração da educação com a produção
material” (Marx; Engels, 1998, p. 28).
Contudo, a questão será retomada quase 20 anos depois, nas
intervenções de Marx feitas na Associação Internacional dos Trabalhadores
(AIT), submetidas aos congressos da organização em Genebra (1866) e na Basileia
(1869), nos quais o modo como a educação deveria se organizar na prática teve
tratamento mais preciso. Para Nogueira (1993, p. 110), o texto de 1866
“representa o mais completo escrito de Marx sobre o assunto e onde a sua
concepção educativa se encontra exposta de modo mais explícito”:
A sociedade não pode permitir nem aos
pais, nem aos patrões o emprego de crianças e adolescentes para o trabalho, a
menos que se combine o trabalho produtivo com a educação (Marx, 1965, p. 1468, apud Nogueira, 1993, p. 109).
As propostas educacionais formuladas para a organização
programática da AIT evidenciam a preocupação de apreender a educação na sua
relação com o trabalho naquela conjuntura histórica. Por isso, o caráter de
recomendações ou instruções para o movimento operário que buscavam preservar a
infância e a juventude de efeitos perversos à sua saúde física e mental, oriundos
das condições de trabalho, e viabilizar a elas uma formação geral, técnica e
política. Desse modo, as propostas se dirigiam ao futuro e também tinham como
alvo a sociedade tal qual ela se apresentava.
Anos mais tarde, em 1875, dirigindo-se ao Partido
Social-Democrata Alemão reafirmam sua preocupação
com o desenvolvimento físico e mental da criança operária e a regulamentação de
suas condições de trabalho, declarando:
[...] desde que se garanta uma rigorosa regulamentação do tempo de
trabalho segundo as faixas etárias, bem como outras medidas de proteção das
crianças, o fato de combinar, desde tenra idade, o trabalho produtivo com a
instrução constitui-se num dos mais poderosos meios de transformação da
sociedade atual (Marx; Engels, 1972, p. 49).
A
insistência de Marx e Engels na necessidade da união do trabalho com a
instrução, de superar a cisão entre o trabalho intelectual e o trabalho manual,
deve ser entendida no interior de sua crítica geral à divisão do trabalho
existente na sociedade capitalista. É nesse sentido que Marx encoraja a AIT a
incluir em sua plataforma a reivindicação por uma formação politécnica para os
trabalhadores. A ata do
Congresso de Basiléia, de 1869, nos apresenta a percepção de Marx sobre a
discussão dos trabalhadores da AIT a respeito
da proposta:
O cidadão Marx diz
que todos estão de acordo sobre certos pontos determinados. A discussão ocorreu
após ter sido proposto ratificar a resolução do congresso de Genève, que
reivindica combinar o ensino intelectual com o trabalho físico, os exercícios
de ginástica à formação politécnica. Ninguém tem feito objeção a este projeto.
A formação politécnica, que foi sustentada por escritores proletários, deve
compensar os inconvenientes resultantes da divisão do trabalho que impedem os
aprendizes de assimilar um conhecimento aprofundado de seu ofício. Sobre este
ponto, sempre se partiu do que a própria burguesia entende sobre educação
politécnica, e foi isto que provocou interpretações errôneas (Marx, 1869 apud Dangeville, 1978).
Acerca deste aspecto, no manuscrito anexo a Trabalho Assalariado e Capital (1849), intitulado
O Salário, Marx considera:
Uma outra reforma muito apreciada pelos burgueses é a educação,
particularmente a educação profissional universal. Não pretendemos realçar a
absurda contradição segundo a qual a indústria moderna substitui cada vez mais
o trabalho complexo pelo trabalho simples para o qual não há necessidade de
qualquer formação; também não queremos realçar que ela empurrou cada vez mais
crianças a partir dos sete anos para detrás das máquinas, fazendo delas uma
fonte de lucros tanto para a classe burguesa como para seus próprios pais
proletários. O sistema manufatureiro põe em causa a legislação escolar – como é
disso testemunha a Prússia (Marx, 1849 apud Dangeville, 1976; 1978).
Em seus escritos sobre A guerra Civil na França
(1871), ao analisar as medidas no campo da cultura e do ensino tomadas pela
Comuna de Paris, Marx afirma que a maior conquista da Comuna foi “a sua
existência efetiva”, em clara referência à “transgressão da divisão que atribui
a alguns o trabalho manual e a outros a atividade de pensar” que ela promovia.
Como afirma Kristin Ross (2021, p. 83-84), “mais importante do que qualquer lei
que os comunardos colocaram em prática, foi o fato em si de que os seus
trabalhos cotidianos inverteram as hierarquias e divisões enraizadas –
especialmente a divisão manual e trabalho artístico ou intelectual”.
E, continua:
O mundo é dividido entre aqueles que
podem e aqueles que não podem se dar ao luxo de manipular palavras ou imagens.
Quando essa divisão é superada, como foi durante a Comuna, [...] o que de fato
importa, mais do que quaisquer imagens transmitidas, leis promulgadas ou
instituições fundadas, são as capacidades postas em movimento. Não é preciso
começar pelo início – pode-se começar de qualquer lugar (Ross, 2021, p. 84).
É relevante recuperar que as origens da concepção de educação
integral se devem aos debates da Primeira Internacional, na qual o termo é
ratificado para distinguir a educação a que as classes trabalhadoras deveriam
almejar daquela que lhes fora destinada pela classe burguesa. A proposta de educação integral, ligada à
história do movimento revolucionário do século XIX, colocava-se contrária à
existência de dois tipos de instrução – uma “aprimorada”, reservada aos
burgueses, e outra, “simplificada”, destinada aos trabalhadores, expressão da
dominação de classe – e em defesa de uma educação igualitária que
possibilitasse o pleno desenvolvimento de todas as capacidades do indivíduo,
integrando o trabalho manual e o intelectual (Bakunin, 2003).
A concepção de educação integral apresentada nos Congressos
da Internacional dos Trabalhadores em Lausanne (1867) e em Bruxelas (1868),
formulado por Paul Robin, enfatizará a existência de três dimensões, necessariamente
integradas: a dimensão física, a dimensão moral e a dimensão intelectual. Os
princípios educacionais, vigentes na AIT sob o “Programa de Ensino Integral”,
com as nuances próprias da histórica caracterização entre socialistas e
anarquistas, foram aprovados consensualmente pelos participantes, inclusive por
Marx, Bakunin e Proudhon e pelas tendências que representavam (Luizetto, 1986;
Moraes; Accioly e Silva, 2013).
Coube ao educador Paul Robin (1837-1912) o protagonismo na
construção dessa proposta de pedagogia libertária, e seu projeto, aprovado na
AIT, foi posto em prática, mais tarde, quando dirigiu por 14 anos o orfanato de
Prévost, em Cempius (1880-1894). Os aspectos de seu projeto político-pedagógico
libertário, baseados na concepção da educação integral e emancipatória, no
ensino laico, racional-científico e em sua relação com o trabalho, na
coeducação sexual e na autogestão pedagógica, contribuíram para a formação de
educadores que pautavam a melhoria das práticas e concepções da pedagogia
contemporânea, como Sebastien Faure e Francisco Ferrer (1849-1909) até Célestin
Freinet (1896-1966) (Moraes; Accioly e Silva, 2013).
Entre 1880 e 1890, as conquistas sociais do movimento
operário são ampliadas, com a consolidação das reivindicações no alargamento do
campo da legislação social e consequente melhoria das condições de vida aos
trabalhadores. Ao mesmo tempo, a burguesia aprofunda seu crescimento produtivo,
fomenta as bases da II Revolução Industrial e se expande colonialmente. Esse
novo contexto também produz mudanças na organização do movimento operário e nas
iniciativas da II Internacional, fundada em 1889 (Carone, 1993). Nos congressos
internacionais, realizados entre os anos de 1889 e 1914[3], predominam
as discussões a respeito da tomada do poder e da utilização de métodos que a
viabilizem, ao passo que os temas relativos à educação são tratados de modo
lateral.
De todo modo, a AIT é um meio de circulação de ideias
pedagógicas que debateu propostas educacionais, em distintos momentos. Conforme
Carone (1993, p. 50), “a questão da criança operária, das suas condições de
trabalho e da respectiva legislação protetora” é analisada em sua Comissão de
Educação e Desenvolvimento Físico no Congresso de 1896, na diversidade de
posições entre socialistas e anarquistas, antes da definitiva expulsão dos
últimos em 1896. O combate à influência do clericalismo nas escolas “ditada
pelo desejo de abafar, no espírito da juventude proletária, o germe do
pensamento de emancipação” e o trabalho em favor da educação laica, são
priorizados no congresso de 1904 (Congrès Socialiste International, 1904, p.
180-181, apud Carone, 1993, p. 74);
e, no congresso de 1910, a ênfase é atribuída ao papel educativo das
cooperativas pela autonomia de trabalhadores, de forma a arregimentar a
disciplina operária e dispensar intermediários (Carone, 1993, p. 106), e
manifesta-se solidariedade a Francisco Ferrer y Guardia, educador espanhol,
fundador da Escola Moderna de Barcelona que, em 1909, fora executado sob pena
de morte (Carone, 1993, p. 110).
Diante da Primeira Guerra Mundial (1914-1918) a pressão
imperialista manifestou interesses inescrupulosos da classe dominante contra a
humanidade e o movimento de trabalhadores teve o marco histórico da Revolução
Russa em 1917, expressando que o socialismo, de uma utopia, poderia se tornar
uma experiência historicamente realizável, e, em 1919, é fundada a III
Internacional Comunista, tendo Lenin como seu principal dirigente. O tema da
educação foi tratado a partir do Segundo Congresso da Internacional Comunista,
realizado em 1920 (Diniz; Bauer; Delcorso, 2019).
Já no período pré-revolucionário da Rússia, a vanguarda de
educadores não era indiferente com o movimento de “escolas novas”. Em 1915,
Nadezhda Krupskaya (1869-1939), formuladora e construtora da pedagogia
soviética revolucionária, analisa mudanças pedagógicas na Inglaterra, em alguns
países europeus e nos Estados Unidos, com muitas menções a John Dewey,
destacando características de uma educação progressista que constituiria base
da educação pós-revolução na Rússia, na qual a transformação da escola de
ensino em escola do trabalho seria uma inevitabilidade (Krupskaya, 2017a).
Em meio à ruína causada pela Primeira Guerra Mundial e pela
Guerra Civil, ao lado da construção econômica foi iniciada a construção da
escola soviética com a mobilização da campanha pelo fim do analfabetismo.
Paralelamente a essa, a plataforma educacional bolchevique considerava que “a
nova concepção pedagógica exigia revisão estrutural dos conteúdos atinentes à relação
entre trabalho e educação” que possibilitasse relações orgânicas entre a escola
e a nova vida social, de modo a vincular “educação geral, de cunho humanístico
e trabalho socialmente útil” (Bittar; Ferreira Jr., 2021, p. 73).
Ocupando Krupskaya e Anatoli Lounatcharski (1875-1933)
funções diretivas no sistema educacional soviético, no que diz respeito ao
método, recorre-se a Dewey e às experiências educacionais que adotaram o
ativismo pedagógico (Bittar; Ferreira Jr., 2021). Quanto à organização dos fundamentos
da educação do trabalho, como se constata na Declaração sobre os Princípios
fundamentais da Escola Única do Trabalho de 1918 (Krupskaya, 2017b, p.
288-289), expõem-se posicionamentos próprios “contra a educação técnica
especial para as idades mais avançadas” e “energicamente contra qualquer
estreitamento específico do círculo da educação do trabalho nos níveis mais
elementares da escola única, ou seja, pelo menos até a idade dos 14 anos”
(Krupskaya, 2017b, p. 289-290). E, assim, com base nessa crítica, na Declaração
afirma-se que o objetivo da escola do trabalho é a “educação politécnica”: “que
dá às crianças, na prática, o conhecimento dos métodos de todas as mais
importantes formas de trabalho, em parte na oficina escolar ou na fazenda
escolar, em parte nas fábricas, usinas e semelhantes” (Krupskaya, 2017b, p.
290).
Dando prosseguimento à forma de organização dos
conhecimentos da escola do trabalho, a Carta metodológica sobre o ensino por
complexos (Krupskaya, 2017c) de 1924, elaborada pela Seção científico-pedagógica
do Conselho Científico Estatal soviético, dirigida por Krupskaya, anuncia suas
propostas. O referido sistema de complexos buscava dar lugar à organização
disciplinar de conhecimentos, demonstrando a pesquisa por inovação pedagógica implementada
nas escolas da União Soviética[4].
O intercâmbio proporcionado nos encontros da Internacional
Comunista, ou a Terceira Internacional (1919-1943), também foram meios de
circulação de ideias pedagógicas e, obviamente, de debates polêmicos. No contexto
em que as proposições mencionadas eram feitas, Antonio Gramsci (1891-1937) teve
convívio com intelectuais soviéticos em função de sua participação como
representante do Partido Comunista da Itália nas conferências da Internacional
Comunista realizadas em Moscou, em 1922.
Conforme alerta-nos Manacorda (2019), é difícil determinar,
no período pré-carcerário, até que ponto a influência do exemplo soviético
faz-se presente em Gramsci ao cunhar sua proposta educativa, dado que havia se
desenvolvido grande polêmica a respeito da escola do trabalho, ao passo que
também se percebem referências quase diretas à referida política educacional[5]. Contudo,
nos Cadernos do cárcere, ao explicitar sua ideia de escola unitária, Gramsci
mostra ter acompanhado o debate educacional soviético, assim como conhece o
legado de Marx e das Internacionais. A concepção de escola unitária, elaborada
em contraposição à reforma educacional implementada pelo governo fascista
italiano, consiste em esforço analítico que contribui decisivamente até os dias
atuais para o campo de pesquisa Trabalho-Educação, para a formulação de
políticas de educação integral opostas à escola dualista, criticada por
educadores democráticos ao contribuir para a reprodução das desigualdades
sociais (Moraes, 2015; Jacomini, 2022).
Contribuições de Gramsci ao debate da educação contemporânea
As reflexões de Gramsci sobre a educação no contexto da
Itália do início do século XX contêm um conjunto de análises sobre
escolarização e formação humana numa perspectiva crítica à sociedade
capitalista e atenta às necessidades de uma nova sociedade. Retomar o
pensamento gramsciano neste momento de reformas educacionais que comprometem a
realização do direito constitucional à educação das classes populares, pode
contribuir tanto para a compreensão do significado das reformas no contexto de
crise e reprodução do capital, quanto para a construção de instrumentos
teóricos, conceituais, para a disputa de hegemonia no campo educacional. As
noções de ideologia, hegemonia e bloco histórico, desenvolvidas nos Cadernos do
cárcere, são fundamentais para a elaboração gramsciana relativa à educação das
classes subalternas e do princípio educativo no sentido estrito (Broccoli,
1977).
Como observa Eagleton (1997, p.106-107), é com Gramsci que se
efetua “a transição crucial de ideologia como sistema de ideias para ideologia
como prática social, vivida, habitual, que deve presumivelmente abranger as
dimensões inconscientes, inarticuladas da experiência social, além do
funcionamento de instituições formais”. Diferentemente do marxismo
“estruturalista” – para o qual o estabelecimento da
hegemonia só pode se realizar “por meio da transformação no terreno ideológico,
historicamente posterior à transformação econômica possibilitada pelo acesso ao
‘político’, fundamento da hegemonia” (Cardoso, 1978, p. 74-75) –, com a relação
dialética entre coerção e direção (consenso), a hegemonia passa a incluir a
possibilidade de uma reforma intelectual e moral antes da tomada do poder do
Estado (sociedade política) pelos grupos dominados, aspecto relevante para a
transformação social (Moraes, 2015; 2023).
Nessa direção, cabe enfatizar que as instituições privadas
de hegemonia diferem da noção althusseriana de Aparelhos Ideológicos de Estado
na medida em que estes apenas reproduzem as relações sociais existentes e sua
forma de atuação só se modifica após a conquista direta do aparelho estatal
repressivo. A esse respeito, é importante esclarecer, com a ajuda de Lefebvre
(1973), que a extensa elaboração de Marx sobre a gênese e a história do
capitalismo “pressupõe apenas a análise crítica da produção e reprodução dos
meios de produção” (Lefebvre, 1973, p. 47). É no Capítulo Inédito de O
Capital (Marx, 1984), que Marx desenvolve o conceito de reprodução das relações sociais: há produção de relações sociais no seio da
reprodução, isto é, não há reprodução sem produção de novas relações (Moraes,
2015; 2023).
A leitura filológica das elaborações de Gramsci indica que
ele não chegou a conhecer esses escritos de Marx. No entanto, a nosso ver, tal
como em Marx, sujeitos, processos e formas fazem parte das análises de
Gramsci. Como salienta Bianchi (2008, p. 138), em sua acepção original, o
conceito de Bloco Histórico surge como ferramenta teórica para a interpretação
crítica “das relações históricas, da unificação dos processos de reprodução
social das relações políticas e reprodução político–ideológica das relações
sociais” na sociedade capitalista contemporânea.
As instituições privadas de hegemonia desenvolvem-se como
partes constitutivas da sociedade civil. E um dos pontos centrais do marxismo
de Gramsci consiste em não separar de modo hipostasiado nenhum aspecto do real
(economia, sociedade, Estado, cultura). A concepção gramsciana de Estado integral
inclui o aparelho hegemônico (Gramsci, 2019b, C. 10, § 12). Como Gramsci afirma
diversas vezes, “sociedade civil e Estado se identificam na realidade dos
fatos” (Gramsci, 2019a, p. 47, C. 13, §18, p. 1590), ou “sociedade civil
‘também é ‘Estado’, aliás é o próprio Estado” (Gramsci, 2014, p. 2302, Q. 26, §
6).
A referência ao pensamento althusseriano remete a uma
concepção marxista “muito influente na sociologia acadêmica” que “inseriu as
classes na ‘história’ como suportes de variações estruturais das relações de
produção”, aprisionando a ação humana em estruturas que a definem
aprioristicamente (Secco, 2006, p. 63). O método “resolutamente historicista”
(Lowy, 2017), que informa os estudos gramscianos sobre hegemonia, abre um fértil campo de reflexão “sobre o fazer-se das
classes sociais nas suas lutas e antagonismos” (Secco, 2006, p. 63).
Para Marx, como para Gramsci, não há classes sem luta de
classes, sem lutas políticas. Uma classe não existe senão virtualmente (é uma
“classe em si” e não “para si”), até entrar na arena política, no nível
superior da práxis, com uma práxis revolucionária. O que nos remete, do ponto
de vista analítico, a que a apreensão dos conflitos permite chegar à unidade e,
reciprocamente, a apreensão da unidade deve levar à elucidação da essência do
conflito. Em síntese, a constelação de classes e de frações de classes, isto é,
a estrutura da sociedade, muda historicamente e com a conjuntura (Moraes, 2005;
2013).
A partir das determinações mais gerais da teoria das classes
sociais e do Estado, o marxista italiano analisa novas situações históricas,
geradoras de novas determinações conceituais. Os seus estudos sobre os grupos e
as classes subalternas, e as condições da subalternidade, e sua abertura para a
dimensão “existencial do senso comum” (Baratta, 2011, p. 180) incorpora a dinâmica subjetiva dos agentes
históricos como um dado objetivo da realidade (Secco, 2006, p. 66). A “questão
política dos intelectuais” está relacionada, em Gramsci, ao problema crucial
“do aprofundamento do nexo teoria-prática no interior dos mais recentes
desenvolvimentos do marxismo” (Voza, 2017, p. 427). Como argumenta Frosini,
sobre a relação estrutura e superestrutura, em referência explícita às
apropriações/interpretações de Althusser sobre a questão:
se a chave da unificação das classes
sociais é a função intelectual – que
é ao mesmo tempo econômica, política e cultural, a ideia mesma de uma
interpretação sobre a ‘determinação’ da política pela economia (como esferas
reciprocamente externas, em que uma seria ‘determinante em última instância’)
perde seu significado. A atuação (orgânica) do intelectual não anula a noção de
determinação, mas a desloca para uma dimensão política e organizacional que
suprime a exterioridade entre os diferentes níveis (e suprime também a ideia de
‘última instância’) (Frosini, 2015, p. 31).
Nessa perspectiva, a análise das relações de poder nos Cadernos
possibilita também distinguir a teoria da hegemonia das teorias da dominação
simbólica de inspiração weberiana, como das pesquisas de Pierre Bourdieu e J.
Claude Passeron (1971)[6]. A
concepção de hegemonia e, em decorrência, a de ideologia, pensadas por Gramsci,
impedem que se reduza a relação pedagógica unicamente a um trabalho de
violência simbólica, e a escola a “simples aparelho de sujeição à ideologia
dominante” ou de reprodução social. Em concordância com Frandji (2015, p.
46-47), entendemos que a relação pedagógica apreendida por Gramsci não se trata
de “um simples processo de interiorização ou inculcação”, mas visa também
assegurar o consenso, a mobilização
dos sujeitos ou grupo de sujeitos para a intervenção social.
Contrastando com a visão gramsciana, a ideologia – um dos
conceitos-chave das teorias da reprodução cultural – assume conotação
extremamente restritiva: a de “legitimar as relações dos homens entre eles”
(Tanguy, 1986, p. 108). A dialética “economia-política-cultura” que caracteriza
a noção de hegemonia gramsciana é aqui substituída por uma hegemonia restrita
ao momento cultura/ideologia. A luta pela hegemonia ocorre apenas no plano dos
discursos, das “ideologias” (Rebuccini, 2015, p. 88). Podemos ainda afirmar,
nessa direção, que tal análise “passa ao largo de um problema central: o do
conteúdo do saber e do seu lugar na divisão do trabalho, confundindo todo e
qualquer saber com ideologia” (Lefebvre, 1973, p. 62).
De acordo com Lefebvre (1973, p. 63), Bourdieu e Passeron,
em Les Héritiers (1964) e mesmo na Reproduction (1970), ao examinarem o
recrutamento do pessoal dirigente na sociedade burguesa, “não vão além, senão
incompletamente, da reprodução dos meios de produção, meios de que os agentes
da produção fazem parte”. Nesse sentido, as contribuições gramscianas nos
permitem avançar na análise da escola e de seu papel nas sociedades
capitalistas numa dialética que não se limita à função de reprodução.
Para Gramsci, a crise da escola e da formação de
intelectuais “é em grande parte um aspecto e uma complexificação da crise
orgânica mais ampla e geral” (Gramsci, 2000, C. 12, § 1 p. 33) que caracteriza
o contexto histórico da Itália dos anos 1920-1930, no qual os fascistas
chegaram ao poder[7].
A reforma educativa de 1923, realizada pelo filósofo
Giovanni Gentile, expressou a “ambição totalitária” do “Estado ético”. Para o
Ministro da Educação daquele período, o ensino público não deveria assumir “a
forma da transmissão de um saber positivo, material e enciclopédico”, mas ser
“um momento de profunda unidade espiritual” (Landji, 2015, p. 48-49). No campo
do ensino elementar, Lombardo-Radice, o diretor geral da instrução primária e
popular, seguindo as orientações do educador Pestalozzi, introduz “a pedagogia
da descoberta, o ensino mútuo, o apelo à espontaneidade da infância, baseado no
desenho, no canto, no folclore e nos trabalhos manuais, contra o culto do livro
e do ensino religioso” (Landji, 2015, p. 49).
Gramsci se opõe fortemente a essas orientações e acompanha
as discussões pedagógicas que ocorriam no movimento fascista italiano em torno
da “escola unitária de base” (Debrun, 2001, p. 260). As correntes favoráveis à
escola unitária foram vencidas, prevalecendo nas reformas Gentili a tendência,
assinalada por Gramsci (2000, p. 33, C. 12, § 1), de “difundir cada vez mais as
escolas profissionais especializadas, nas quais o destino do aluno e sua futura
atividade são predeterminados”. Nas palavras de Broccoli (1979, p. 174), o
marxista italiano lutou contra o “estreito nexo estabelecido pela escola
gentiliana entre educação e economia”.
O projeto gramsciano de “escola unitária” para a “formação
humanista (entendido este termo, ‘humanismo’, em sentido amplo e não apenas em
sentido tradicional)” (Gramsci, 2000, p. 36, C. 12, § 1), aparece como uma das
soluções à crise diagnosticada e, nele, são analisadas inúmeras questões e
formulados elementos centrais da crítica baseada em uma abordagem relacional
das desigualdades escolares que, como vimos, será desenvolvida mais tarde, nos
anos 1960, pela história e sociologia da educação (Landji, 2015, p. 49).
É preciso, inicialmente, reconhecer à escola unitária um
significado que vai além daquele da oferta de iguais oportunidades educativas,
como resposta a exigências de tipo democrático, mas não supera o modelo de
escola seletiva, legitimada pelo princípio meritocrático da igualdade de
chances. A leitura integrada dos Cadernos permite verificar, na análise
da escola e da relação educativa, uma “íntima unidade e profunda coerência de
significados” (Broccoli, 1979, p. 174-175). Essa leitura possibilita definir,
como um dos primeiros objetivos da escola unitária, a realização – em termos
gramscianos – das condições do “mesmo clima cultural” (Gramsci, 2019b, p. 399,
C. 10, II, § 44), indispensável à criação de um novo bloco histórico, de uma
nova hegemonia.
Em seu diagnóstico sobre a crise educacional na Itália dos
anos 1920, Gramsci rejeita tanto a defesa nostálgica da escola tradicional
italiana, “oligárquica pelo seu modo de ensino”, quanto as orientações
“positivistas” e “idealistas” (Gramsci, 2000, p. 49, C. 12, § 2) para a
edificação de uma educação ajustada à moderna sociedade industrial em gestação.
O problema central para Gramsci é “a manutenção de um sistema escolar
socialmente diferenciado”, que se torna cada vez mais fragmentado
(‘particularizado’, como define no Caderno 12, § 1), na lógica da divisão
social do trabalho que contribui a cristalizar e a reproduzir (Landji, 2015, p.
49). Para se destruir essa “trama”, segundo Gramsci, deve-se “não multiplicar e
hierarquizar os tipos de escola profissional, mas criar um tipo de escola
preparatória (primária-média) que conduza o jovem até os umbrais da escolha
profissional, formando-o como pessoa capaz de pensar, de estudar, de dirigir ou
de controlar quem dirige” (Gramsci, 2000, p. 49, C. 12, § 2).
Diferentes passagens dos Cadernos detalham o programa
da escola unitária. A maior parte de suas reflexões dirige-se à concepção
dialética do trabalho intelectual. O princípio educativo de base, definido por
Gramsci, é o do “trabalho”, a “atividade teórico-prática” (Gramsci, 2000, p.
43, C. 12, §2). É esse princípio que lhe possibilita repensar a “cultura
humanista” e a organização escolar fragmentada e hierarquizada que a ameaça e,
ao mesmo tempo, reproduz a lógica capitalista da divisão entre trabalho
industrial, técnico e manual, e intelectual. Trata-se de superar a mutilação do
homem, a separação entre homo sapiens
e homo faber (Gramsci, 2000, C. 12, §
3). Contra essa “formação de massa”,
que prepara “especialistas” e não “dirigentes”, ele propõe:
a escola única de cultura geral,
humanista, formativa, que equilibre [...] o desenvolvimento da capacidade de
trabalhar manualmente (tecnicamente, industrialmente) e o desenvolvimento das
capacidades de trabalho intelectual. Deste tipo de escola única, através de
repetidas experiências de orientação profissional, passar-se-á a uma das
escolas especializadas ou ao trabalho produtivo (Gramsci, 2000, p. 33-4, C. 12,
§ 1).
O
advento da escola unitária significa
o início de novas relações entre o
trabalho intelectual e o trabalho industrial não apenas na escola, mas em toda
a vida social. O princípio unitário, por isso, irá se refletir em todos os
organismos de cultura, transformando-os e emprestando-lhes um novo conteúdo
(Gramsci, 2000, p. 40, C. 12, § 1).
Entendemos que, na perspectiva marxista de Gramsci, o
trabalho enquanto princípio educativo incorpora as duas dimensões do trabalho,
conceito abstrato e experiência concreta. Nesse registro, apontado por Marx nos
Grundrisse (1987), o trabalho não
visa unicamente à produção de coisas, mas à produção de relações sociais; ele
exerce sua ação no plano subjetivo, singular: “o trabalho aparece como pleno
desenvolvimento da atividade (pessoal)”, como desenvolvimento da
individualidade ou como “produção de si”; e no plano coletivo, na “produção da
política” (Moraes, 2015). O trabalho, como atividade
humana, pode então ser definido de maneira extensiva como a “produção da
sociedade”, ou a “produção social da vida” ou simplesmente como “produção do
viver”[8]. Gramsci
imprime sua própria particularidade a essa visão ao enfatizar as mediações
entre estrutura e superestrutura, “ampliando o estudo do trabalho na esfera
superestrutural como componente essencial do processo educativo” (Semeraro,
2015, p. 239). Nessa perspectiva, a educação
é vista como trabalho, trabalho de produção do humano, da realidade
social.
Em outros termos, “a relação homem-ambiente tende a
tornar-se reciprocamente ativa por meio da mediação de um elemento
historicizante e socializante, o trabalho” (Broccoli, 1979, p. 176). É com esse
significado, enquanto atividade “teórico-prática” que o trabalho, segundo
Gramsci, deve informar a construção dos conteúdos curriculares e as finalidades
da escola unitária (Gramsci, 2000, C. 12, § 2).
A outra reflexão fundamental sobre os conteúdos do ensino,
na criação do “mesmo clima cultural”, consiste na relação desses saberes com o
“folclore”, designação que, para Gramsci, inclui o “pensamento mágico”, as
“superstições”, “a barbárie individualista” e todas as outras “formas de
sedimentações tradicionais das concepções de mundo” (Gramsci, 2000, p. 42, C.
12, § 2).
As notas dos Cadernos são frontalmente críticas tanto às
proposições de Lombardo Radice de “ensinar o folclore às crianças” como
“elementos pitorescos”, quanto às de Gentile, para quem “a religião e a
mitologia” eram “boas para o povo”. Para Gramsci, tais concepções expressam a
convicção na existência de dois mundos separados e contrapostos, o do
menino-povo e do adulto/racional (ou o do senso comum e o da filosofia),
impedindo o nascimento de uma nova cultura nas grandes massas populares
(Broccoli, 1979, p. 168). O folclore, ao contrário, deve ser “tomado a sério”,
e se é um obstáculo contra o qual a escola deve lutar, constitui também um
recurso mediador da aprendizagem (Gramsci, 2000, C. 12, § 2). Toda atividade é
intelectual, toda linguagem contém “elementos de uma concepção de mundo”, de
uma filosofia (Gramsci, 2000, C. 12, § 1) e estas teses “não podem ser
unicamente abstratas”. Gramsci percebe a heterogeneidade dos elementos
constitutivos do folclore, principalmente quando ele se transforma em senso comum, o que o leva a analisar
permanentemente as possibilidades do reencontro dinâmico entre os saberes
escolar e popular (Fandji, 2015, p. 56).
Nesse ponto, convém voltar à analogia sobre a instauração da
relação hegemônica entre os intelectuais e as massas e o modo como se expressa
na relação educativa, entre professor e aluno. Em plena consonância com as
Teses sobre Feuerbach e o Prefácio de 1859, a ideologia como concepção do mundo
representa, em Gramsci, a tentativa tangível da classe hegemônica de produzir o
consenso (“direção”) necessário à manutenção/reprodução de sua posição de
preeminência (“domínio”) na sociedade. O conceito de ideologia é fundamental
porque permite “uma consideração unitária” das formas de conhecimento/saberes
“em todas as declinações possíveis (do folclore à religião, ao senso comum, à
ciência e à filosofia)”. Gramsci nos propõe, através de sua visão de ideologia,
“uma reflexão gnoseológica surgida no horizonte da política e vice-versa, uma
proposta política que tem suas raízes na reflexão gnoseológica: ideologia e
hegemonia tornam-se nesse sentido os dois conceitos por meio dos quais se
realiza a unidade teoria e prática” (Gaboardi, 2017, p. 76-77).
Na luta hegemônica, o trabalhoso processo de
“autoconsciência crítica” é descrito por Gramsci como “vinculado a uma
dialética intelectuais-massa”. O grupo dos intelectuais se desenvolve
quantitativa e qualitativamente, mas o salto qualitativo que lhe possibilita
atingir uma “nova amplitude e complexidade” está “ligado a um movimento análogo
da massa dos simples, que se eleva até os níveis superiores de cultura e amplia
simultaneamente seu círculo de influência […] para o estrato dos intelectuais
especializados” (Gramsci, 2019b, p. 104-5, C. 11, § 12). No Caderno 3, nota 48,
abordando a mesma temática no plano da política, Gramsci reivindica “a
fecundidade e justeza” da linha diretiva do “movimento de Turim”, dos Conselhos
de Fábrica, que – para ele – consiste na “unidade da ‘espontaneidade’ e da
‘direção consciente’”, unidade da ação política real das classes subalternas
(Baratta, 2011, p. 180).
São esses os pressupostos que informam a análise gramsciana
da educação escolar. Em termos marxistas, o ambiente educativo deve ser
educado. Da mesma maneira, a relação pedagógica é, para Gramsci, uma “relação
criativa e recíproca” (Gramsci, 2000, C. 12, § 2), no sentido de que a escola
deve propiciar ao aluno “a condição de investigar os termos de sua própria
historicidade”, para que ele “possa indagar sobre si mesmo e elaborar
criticamente sua própria personalidade, modificar-se e modificar as relações
históricas, e, portanto, modificar o ambiente no qual é educado e também o
mestre que é seu intérprete genuíno” (Broccoli, 1979, p. 162).
À guisa de conclusões
Diante do contexto de redemocratização da sociedade
brasileira – ainda no constante e acelerado desmonte de direitos, de
disputas para ampliação da participação popular, de nefasta simbiose entre o
público e o privado, quando agentes empresariais avançam ideologicamente sobre
a escola pública e, utilizando discursos de modernização, assumem a condução de
reformas educacionais (Todos pela Educação, Fundação Lemann, Ayrton Senna,
Itaú- Unibanco etc.) promovendo “avassaladora mercantilização da educação sob
dominância financeira e a drástica precarização do trabalho” (Leher, 2023, p.
233) – que
desafios nos colocam as proposições das Internacionais de Trabalhadores e
aquelas elaboradas por Antonio Gramsci? Quais suas contribuições para as lutas
populares, a juventude trabalhadora e os setores educacionais democráticos na
resistência à atual reforma do ensino médio e para a construção da escola
unitária de currículo integrado?[9]
Contrariamente à proposta da escola unitária, tanto na
Itália de Gramsci como no Brasil de hoje, a política educacional amplia as
desigualdades sociais e aprofunda a distinção entre escolas que são destinadas
a formar os quadros intelectuais e políticos do país e as que, dirigidas às
classes subalternas, devem prepará-las tão somente para as chamadas “profissões
do novo século”. Atreladas supostamente aos interesses e sonhos da juventude,
mas, na realidade, alinhadas às demandas do mercado e vinculadas aos ditames do
capital, as reformas educacionais do atual período realizam profundas
reformulações no conteúdo da educação com imposições e sérias implicações para
a gestão escolar, as metodologias de ensino e os currículos orientados segundo
a pedagogia das competências.
O Novo Ensino Médio (NEM), como a Reforma ficou conhecida,
representa grande retrocesso em relação à Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional de 1996 (Brasil, 1996), que estabelece a educação básica (educação
infantil, ensino fundamental e ensino médio) como direito de todos, cuja
finalidade é a formação ampla e comum, respaldada no conhecimento humanista e
científico. O princípio público de uma educação geral, comum a todos, como
forma de democratização, foi rompido pelos organismos multilaterais e governos
neoliberais por meio de uma mudança estratégica nos objetivos da educação
pública, que passa a focar o direito à aprendizagem, deslocando o conceito do
direito à educação, direito extensivo a um conjunto de outros direitos que
compõem a qualidade educacional.
Esse fenômeno, que atinge todos os níveis, etapas e
modalidades de ensino, se expressa de forma mais contundente e perversa no
ensino médio, última etapa da Educação básica. A atual reforma do ensino médio
produziu um fosso ainda maior entre as escolas privadas, destinadas às elites e
aos setores da alta classe média brasileira, e as escolas públicas, que formam
os filhos das classes trabalhadoras, promovendo um verdadeiro apartheid
educacional.
De acordo com o art. 36 da Lei 13.415/2017 (Brasil, 2017), o
currículo do ensino médio será composto pela BNCC e por itinerários formativos
que deverão “ser organizados por meio da oferta de diferentes arranjos
curriculares conforme a relevância para o contexto local e a possibilidade
dos Sistemas de Ensino”. Nessas circunstâncias, enquanto nas escolas
privadas a diversificação curricular ou, na designação mais correta, a
fragmentação curricular não afetará a formação geral básica, na medida em que
os itinerários darão continuidade aos conteúdos das disciplinas da Base
Nacional Comum Curricular/BNCC, cujas aulas foram reduzidas, outra é a realidade
das escolas públicas.
Nas diversas redes estaduais, a ausência de políticas
públicas que garantam condições estruturais para o ensino de qualidade
aprofundará a fragmentação e o aligeiramento da formação dos estudantes,
cerceando o acesso ao conhecimento científico – das ciências da natureza e das
humanidades – indispensável à apreensão do mundo e à construção da identidade
individual e social. Ao mesmo tempo, as imposições legais provocam a
desescolarização do ensino técnico profissional via itinerário formativo, que
assume o formato de formação continuada, de organização modular e/ou de EAD,
promovendo e aprofundando a privatização do ensino (Moraes, 2023).
Concordamos com Freitas (2023) quando observa que a
categoria de “estudante protagonista” está associada à categoria trabalhador
empreendedor, e que a liberdade de escolha do estudante se articula à liberdade
de escolha do trabalhador. Segundo o autor, tudo se passa
como se fosse um truque de
prestidigitação, em que independentemente das escolhas de cartas, o resultado é
sempre aquele predefinido pelo mágico. O que se verifica, portanto, não
sinaliza para o protagonismo juvenil, e sim o protagonismo do capital na
condução da política educacional do país (Freitas, 2023, p. 167).
Desse modo, ao refletirmos sobre os debates e embates de
movimentos socialistas em torno da educação das classes trabalhadoras,
verificamos as enormes dificuldades enfrentadas historicamente e os obstáculos
quase intransponíveis nas disputas de hegemonia, hoje, para libertar a educação
da determinação e do condicionamento dos ditames do capital. Tarefa que,
evidentemente, só se realizará com a superação do capitalismo e da sociedade de
classes. Não obstante, a história ensina que nesses avanços e recuos, cuja
sensação é de um perpétuo passado, as contradições se afloram de forma cada vez
mais intensa e a dialética transformação/conservação coloca possibilidades para
que o presente se desfaça da dualidade escolar e tome a concepção de escola
unitária gramsciana como um elo com o futuro. Nessa direção, a luta coletiva
deve fazer avançar os passos já dados na organização do ensino médio integrado
ao técnico nos Institutos Federais, o que pressupõe a urgente revogação do Novo
Ensino Médio e da Base Nacional Comum Curricular.
No
“debate social”, hoje, o pensamento de Gramsci torna-se, mais do que nunca,
referência indispensável para analisar o capitalismo atual na sua hegemonia
política, cultural e econômica e nas suas crises orgânicas, e para pensar
dialeticamente a forma que a luta hegemônica das classes subalternas e seus
movimentos contestatórios podem tomar nas diferentes realidades sociais. E,
sobretudo, para pensar as relações pedagógicas, as relações “culturais” e
escolares no âmbito das “formas capitalistas híbridas que se manifestam de modo
recorrente na história do nosso país” (Bianchi, 2015, p. 110) e nos processos
de modernização e conservação/atualização dessas formas dirigidas pelo “alto”.
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[1] Os escritos e
pronunciamentos de Marx nas Conferências da Primeira Internacional são
encontrados em Instruções para os delegados do Conselho Geral Provisório a
propósito de diversas questões (extrato), reproduzido por Dangeville, R.
(1976, 1978), e em La Première Internationale (FREYMOND, J. (org.). La premiere internationale. Genève: Droz, 1962.
2 v.).
[2] As citações de escritos
de Gramsci (2000; 2014; 2019a; 2019b) neste trabalho se referem aos Cadernos do
cárcere em versão traduzida para o português e a versão em italiano da edição
crítica dos Quaderni del carcere do
Istituto Gramsci indicando-se o Quaderno (Q)/Caderno (C) e o parágrafo (§) em
que a citação pode ser localizada.
[3] São realizadas as
seguintes reuniões: I Congresso Internacional Operário Socialista (tendência
marxista), Paris 14-21.07.1889; II Congresso Internacional Operário Socialista,
Bruxelas, 16-23.08.1891; III Congresso Internacional Operário Socialista,
Zurique, 06-12.08.1893; IV Congresso Internacional Socialista dos Trabalhadores
e das Câmaras Sindicais Operárias, Londres, 26.07-02.08.1896; V Congresso
Socialista Internacional, Paris, 23-27.09.1900; VI Congresso Socialista
Internacional, Amsterdã, 14-20.08.1904; VII Congresso Socialista Internacional,
Stuttgart, 16-24.08.1907; VIII Congresso Internacional, Copenhague,
28.08-03-bhgtfh09.1910; IX Congresso Internacional Extraordinário, Bâle,
24-25.11.1912; X Congresso Socialista Internacional, 23-28.08.1914 (não se
realiza, impedido pela guerra) (Carone, 1993, p. 33-34).
[4] Cabe assinalar que no
enfrentamento para a edificação do sistema estatal de educação russo, em bases
socialistas, o Comissariado Nacional anunciou em 1918, na primeira sessão de
professores internacionalista, a criação das Escolas Experimentais –
demonstrativas, entre elas, as Escolas Comunas que funcionaram como internato
entre 1918 e 1937, quando foram definitivamente fechadas durante o regime
stalinista. Entre essas escolas, encontrava-se a Lepeshinskiy, conduzida por
Moisey Pistrak que desenvolveu relevante trabalho relativo à elaboração de
programas de ensino que eram transformados em política pública educacional por
todo o território russo (Freitas, 2009; Abreu, 2017).
[5] Como afirma Bianchi
(2017), o período no qual Gramsci viveu em Viena e Moscou, até agora pouco
conhecido, tem recebido novas luzes com as pesquisas em torno da edição
nacional em andamento na Itália, as quais alimentaram a biografia
político-intelectual do sardo. Sabe-se um pouco mais hoje sobre sua proximidade
com o grupo de intelectuais que se organizavam em torno de Anatoli
Lounatcharski, de suas atividades como representante do PCI no Comitê Executivo
da Internacional Comunista na segunda metade de 1922.
[6] BOURDIEU, P.;
PASSERON, J. C. La reproduction. Paris: Ed. De Minuit, 1971.
[7] A respeito da história da educação na Itália,
ver Broccoli (1979) e Frandji (2015).
[8] Marx já explicara, em uma curta passagem de O
Capital (tomo III), que a estruturação tripartite das classes (trabalho,
terra e capital) correspondentes à lógica fundamental do modo de produção é
complexificada pela manutenção das relações mais antigas na formação social
concreta e pela divisão sempre mais desenvolvida do trabalho. Em a Ideologia Alemã, a possibilidade da
unidade da classe face à tendência da divisão é apontada por Marx e Engels: “Os
indivíduos singulares formam uma classe somente na medida em que têm de
promover uma luta contra uma outra classe; de resto, eles mesmos se posicionam
uns contra os outros, como inimigos, na concorrência” (2007, p. 63).
[9] Alguns indicadores são importantes
para a caracterização do cenário educacional, em particular do ensino médio no
país. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística/ IBGE, entre
2003 e 2020, o Brasil registrou sua maior população com idade entre 15 e 29
anos em números absolutos, cerca de 50 milhões de pessoas, o equivalente a ¼ da
população nacional. No que se refere à escolaridade, temos hoje 8 milhões de
estudantes matriculados, 83% nas redes públicas estaduais; 6% dos jovens com
idade entre 15 e 17 anos estão fora dessa etapa de ensino médio (2 milhões no
ensino fundamental e 1 milhão sem qualquer vínculo escolar). Nesse mesmo
período, o percentual de jovens desempregados é recorde: 41,88% na faixa de 14
a 17 anos, e 26,8% entre 18 e 24 anos, em 2021.
[i] Artigo recebido em: 31/10/23
Artigo aprovado em: 29/05/24
[ii] Contribuições da autora: conceituação; metodologia; escrita – rascunho original; escrita – análise e edição.
[iii] Contribuições do autor: conceituação; metodologia; escrita – rascunho original; escrita – análise e edição.
[iv] Contribuições da autora: conceituação; metodologia; escrita – rascunho original; escrita – análise e edição.