e-ISSN 1984-7246  

 


Maria Nicolas (1906-1938): mulher negra, uma “forasteira de dentro” no ensino público primário do Paraná

 

 

Silvana Mendes Schuindt*

Universidade Federal do Paraná (UFPR)

Curitiba, PR - Brasil

lattes.cnpq.br/0649790074542690

orcid.org/0000-0003-3666-2252

silvanaschuindt@gmail.com

 

 

Adriana Vaz**

Universidade Federal do Paraná (UFPR)

Curitiba, PR - Brasil

lattes.cnpq.br/2037918966512896

orcid.org/0000-0003-2172-3008

adriana.vaz@ufpr.br

 

 

 

 

 

 

 

Maria Nicolas (1906-1938): mulher negra, uma “forasteira de dentro” no ensino público primário do Paraná

 

Resumo

Este artigo delineia aspectos da trajetória da normalista Maria Nicolas, que residiu em Curitiba/PR e ministrou aulas no ensino primário nas primeiras décadas do século XX, no Paraná. Orecorte temporal abrange o período entre 1906 e 1938. Reconstrói-se parte do seu percurso pelo prisma da interseccionalidade, o qual foi marcado por episódios de discriminação racial, de gênero e de classe. Igualmente problematiza-se a categoria “outsider within” de Collins (2016) e adotam-se como base teórica os conceitos de trajetória, habitus e capital de Bourdieu (1996, 2017). Nicolas formou-se na Escola Normal de Curitiba entre 1913 e 1916 e itinerou por várias escolas em Curitiba e no interior do Paraná, justamente porque a sociedade republicana respondia ao ideário de civilidade perpassado pela tese eugênica e de progresso nos moldes patriarcais. A população negra, em especial as mulheres, ainda eram vistas ligadas ao trabalho doméstico e servil; havia também uma resistência por parte das mulheres brancas, de elite, em superar as diferenças raciais. Então, por diferentes formas de opressão, a normalista deste estudo viveu à margem, como alude bell hooks (2019), mesmo sendo pertencente e tendo conhecimento de todo sistema.

 

Palavras-chave: história da educação; escola normal; ensino público; população negra.

 

Maria Nicolas (1906-1938): Black woman, an "outsider within" in the primary public education of Paraná

 

Abstract

This article outlines aspects of the life trajectory of Maria Nicolas, a primary school teacher based in Curitiba, Paraná, and who conducted classes in primary school in the early decades of the 20th century, covering the period from 1906 to 1938. Employing the lens of intersectionality, the narrative explores various dimensions of her journey, highlighting instances of racial, gender, and class discrimination. The "outsider within", as articulated by Collins (2016) is also examined. The theoretical basis includes Bourdieu's (1996, 2017) concepts of trajectory, habitus, and capital. Nicolas, an alumna of the Escola Normal de Curitiba (Curitiba’s Teacher-Training School) from 1913 to 1916, taught at multiple schools in both metropolitan Curitiba and Paraná’s countryside cities. This professional mobility was intricately linked to the prevailing societal ethos that embraced notions of civility entwined with eugenic and patriarchal ideas of progress. In this context, individuals of the black community, especially women, found themselves in roles still associated with domestic and servile labor. The resistance from white elite women further hindered efforts to transcend racial disparities. As a result, the primary school teacher in focus experienced marginalization, echoing bell hooks’ (2019) notion of living on the margins despite being an integral part of and possessing insight into the larger societal structure.

 

Keywords: history of education; teacher-training college; public education; black population.

 

 

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Contribuições de autoria

* conceituação; curadoria dos dados; análise formal; investigação; metodologia; visualização; escrita – rascunho original; administração do projeto; e validação.

** escrita- análise e edição; supervisão; administração do projeto; e validação.

1 Introdução

Este artigo apresenta aspectos sobre a trajetória escolar e profissional de Maria Nicolas, que nasceu em 1899 e faleceu em 1988, em Curitiba/PR. O recorte temporal envolve o período entre 1906 e 1938, que demarca sua entrada no universo escolar e a reconversão para o campo literário. Em 1917, Maria Nicolas iniciou no magistério público paranaense como professora voluntária da Escola de Aplicação, após ter concluído a Escola Normal. No decurso de sua carreira atuou em diversos munícipios paranaenses, ministrando aulas no ensino público e particular. Em 1951, por um ensurdecimento, trabalhou na biblioteca da Assembleia Legislativa do Paraná e foi exonerada do magistério público.

A dissertação de Silvana M. Schuindt (2022) tem sintonia com as pesquisas realizadas por Maria L. R. Müller (2016); Eliseu Pinheiro da Cruz et al. (2021); Giane E. S. de Almeida e Claúdia M. C. Alves (2011); Eliane Peres (2022).  Nesse sentido, o texto contribui para ampliar os estudos sobre a atuação de mulheres negras no período da Primeira República, e em outros recortes temporais, ao tratar sobre o acesso à escolarização e o processo de feminização que perpassa o ensino primário no Paraná, nas primeiras três décadas do século XX.

Müller (2016) menciona que no final da década de 1990 existiam poucas pesquisas de cunho historiográfico que abordassem as formas de inserção profissional de mulheres negras, em posições nas quais iriam exercer funções intelectuais, em especial no ensino público. Em artigo publicado em 2016, a autora apresenta o processo de branqueamento que estrutura o magistério público no final da década de 10, do século XX, no Rio de Janeiro, que, em certa medida, resulta na negação do corpo negro. Negação que simboliza a autoimagem que Nicolas tinha sobre si mesma, ao comparar o seu tom de pele com o da sua irmã Thereza: “Acontece que tenho (sic) irmã chamada Thereza e, por sorte, sou mais feia do que ela!” (Nicolas, [19--]a, p. 9). 

A discussão apresentada por Cruz e demais autoras (2021) aborda a presença das mulheres negras na Escola Normal de Caetité, na Bahia, entre os anos de 1898 e 1943, mostrando que essas mulheres não eram submissas e não obedeciam às tarefas prescritas pelos homens. O artigo traz como problemática o apagamento da atuação das mulheres negras como sujeitos históricos no magistério e, em parte, esse ocultamento deriva da carência de fontes e do modelo patriarcal da sociedade.

Assim como em Caetité, o atributo gênero também modelou o ensino público primário no contexto paranaense, resultante de uma hierarquização de funções distribuídas entre homens e mulheres, dentre outras camadas de discriminação que atravessam a atuação das mulheres nas primeiras décadas do século XX, como a de classe social e a de raça.

Almeida e Alves (2011) mobilizam diferentes fontes em sua pesquisa sobre a trajetória de mulheres negras no âmbito da educação, dentre elas, as pesquisadoras utilizam a metodologia da história oral ancorada nos fragmentos de memórias. O grupo estudado era composto por 10 mulheres que residiam na cidade de Juiz de Fora/MG, que viveram sua infância e juventude entre os anos de 1950 e 1970. Dos aspectos em comum que marcaram as memórias dessas mulheres, de um lado, tem-se o não acesso à escola em seus diferentes níveis de ensino; de outro, o desejo de estudar e a busca em superar os obstáculos. As mulheres que seguiam seus percursos escolares enunciavam os desconfortos e os esforços despendidos por elas, que incluíam desde a dificuldade com o transporte até o local, assim como a complexidade em adaptar-se à cultura escolar marcada pelos fenótipos brancos em seus aspectos simbólicos e prescritivos (Almeida; Alves, 2011). Tendo em vista que,

 

se foi dada uma oportunidade para o ingresso, o esforço de permanecer na escola vinha investido de um caráter de travessia insalubre, em que a menina negra nunca se via contemplada nos elementos da cultura escolar com os quais convivia. As memórias surgem marcadas pelas dores de se sentir à margem, deslocada do centro da cena, interditada para os papéis principais (Almeida; Alves, 2011, p. 93).

 

As autoras destacam que duas mulheres do grupo analisado finalizaram o ensino superior, fato que demonstra que o problema de deslocamento, a ausência de apoio familiar e a fragilidade das políticas públicas do Estado eram fatores que restringiam o acesso e a permanência da população pobre brasileira a outros níveis escolares.

A operação historiográfica sobre a educação da população negra no âmbito da história da educação implica na mobilização de fontes históricas, uma multiplicidade de vestígios deixados no passado, e que os/as historiadores/as os/as reconstroem no tempo presente, indagando-as em resposta a uma problemática de pesquisa. Dentre as fontes que compõem este estudo, destacam-se diários, obras e documentos pessoais de Nicolas, relatórios dos secretários de governo, legislações educacionais e periódicos jornalísticos.

As pesquisas sobre a população negra incluem diferentes temas e abordagens teórico-metodológicas, dentre as quais pode-se destacar a história da educação do negro. Para Jeruse Romão (2005, p. 12):

 

A história da educação do negro é a história de um conjunto de fenômenos. Parte da concepção do veto ao negro; percorre os caminhos da articulação de consciências dos seus direitos; ressignifica a função social da escola; recupera os movimentos, no sentido de organizar suas experiências educativas e escrever uma história social da educação do negro; e revela imagens que não conhecemos, embora os indicadores sociais e educacionais nos deem muitas pistas acerca da moldura do quadro.

 

No começo de 1990, o artigo Raça e Educação: uma relação incipiente, escrito por Regina Pahim Pinto (1992), apontava que a categoria raça não era utilizada pela maioria dos pesquisadores da área da educação. Ao problematizar as maneiras que a história da educação aborda os negros em seu rol de estudos, Marcus Fonseca (2009) defende que independente de uma modalidade específica da historiografia educacional para o tratamento desse tema, o ponto central é incorporar a questão racial nos debates educacionais, reconhecendo e percebendo seu nível de participação na sociedade brasileira (Fonseca, 2009). 

Em acordo com as proposições de Fonseca (2009), um dos objetivos deste artigo é analisar como as questões de raça, classe social e gênero permearam parte da trajetória de Nicolas, e elucidar as estratégias mobilizadas por essa mulher negra para avançar nas primeiras letras e diplomar-se como normalista, tendo em mente a “[...] construção da noção de trajetória como série de posições sucessivamente ocupadas por um mesmo agente (ou um mesmo grupo) num espaço que é ela próprio um devir, estando a incessantes transformações” (Bourdieu, 1996, p. 189). Tanto que, a busca por reconhecimento que marca o percurso docente de Nicolas evidencia que as ações de cada pessoa no espaço social não são decorrentes de uma vontade individual, do habitus; mas, se conectam às diferentes posições ocupadas no campo (Bourdieu, 2003). 

A partir da metáfora com o teatro, Nicolas, ao se inserir no campo educacional, não agiu sozinha e suas ações no espaço social respondiam ao ideário republicano, isto é, a vocação da mulher como esposa e mãe foi transferida para educadora da nação.

 

2 Nos palcos, a vida não é como uma peça de teatro

A socialização primária de Nicolas ocorreu na cidade de Curitiba. Seus progenitores, Alyr Léon Nicolas (1865-1958) e Josepha Tomasina Nicolas (18?-19?), tiveram  influência no desenvolvimento educacional e cultural de suas/seus filhas/os. A profissão do pai, a valorização do acesso e da permanência na escola por parte da mãe, e o local de moradia da família que era no porão do Teatro Guaíra, situado onde hoje é a Biblioteca Pública do Paraná, na região central da capital paranaense, foram fatores importantes na constituição da trajetória de Nicolas e de seus irmãos e sua irmã.

Em 1976, com seus 77 anos de idade, Nicolas rememora o racismo vivenciado no âmbito familiar:

 

[...] ‘Fiz os estudos primários na Escola Republicana, do professor Moreira. Fui, por sinal, muito burra, porque não entendia o processo de soletração. Para mim, ve e i não era vi, mas vei. Ve e o era véo, e assim por diante’. Maria Nicolas relembra a raiva que sentiu quando ocorreu o fato que a forçou a aprender, de qualquer jeito, a ler e escrever: ‘Um primo que se educava lá em casa diante dos pedidos insistentes de minha mãe para que alguém me ensinasse a soletrar, disse a ela: - Tia Josefa, deixe que a Maria fique burra. Ela é mais feia e mais preta do que a Santa. Deixe que a Santa estude e se forme professora. Depois a Maria vai de tamanco, com a cesta a carregar as roupas da Santa - Isto me deixou arrasada. Como não queria ser criada de ninguém, apelei para os colegas, [...] (Nicolas, 1976).

 

 

A infância e a juventude de Nicolas foram marcadas pelo ideário higiênico, o qual integrava as discussões a respeito da formação da identidade nacional, que considerava a saúde, a força e a beleza física como atributos essenciais para o progresso da nação, em resposta a um projeto de modernização e civilidade, que reforçava o ideal do branqueamento (Munanga, 1999). 

Modelo de nação que repercutiu na autopercepção que Nicolas tinha em relação às suas características físicas, uma vez que, os mestiços eram vistos como “plasticamente feios”. Pela superação ao método de alfabetização ministrado na escola pública primária, pelo progresso escolar, e pela conquista do diploma de normalista, Nicolas vislumbrou na educação a possibilidade de romper com o estigma das mulheres negras. Estigmas que, em 1950, permaneciam associados ao trabalho doméstico e à sexualização do corpo, como alude Lélia Gonzalez (2020). O Censo de 1950 forneceu indicadores sociais básicos relativos à educação e ao setor da atividade econômica da mulher negra.

 

A partir daí, pode-se constatar: seu nível de educação é muito baixo (a escolaridade atinge, no máximo, o segundo ano primário ou fundamental) e o analfabetismo é o fator predominante. Do ponto de vista da atividade econômica, apenas cerca de 10% atuam na agricultura e/ou na indústria (sobretudo têxtil, e em termos de Sudeste-Sul); os 90% restantes estão concentrados no setor de serviços pessoais (Gonzalez, 2020, p. 40).

 

Nicolas rompe com as estatísticas enunciadas acima. Em 1949, formou-se em Pedagogia pela Universidade do Paraná, atual Universidade Federal do Paraná (UFPR), na modalidade bacharel, e, em 1950, na modalidade de licenciatura. No campo educacional, cursar a Escola Normal foi a opção trilhada por Nicolas e que incidiu sobre sua trajetória profissional como professora da escola primária, e posteriormente, em uma fase madura, em seus escritos na área da literatura.

Na primeira década do século XX, em Curitiba/PR, as únicas instituições que ofertavam o ensino secundário eram o Ginásio Paranaense e a Escola Normal. Assim, aquelas/es que optavam em estudar no Ginásio Paranaense visavam à realização de um curso superior; em outra direção, as/os que seguiam seus estudos pela Escola Normal vislumbravam o início das atividades profissionais direcionadas à atuação docente. Pelo Regulamento da Instrucção Publica do Estado do Paraná: “Art. 216º - A Escola Normal é destinada a preparar professores para o ensino primário no Estado” (Paraná, 1901, p. 134).

Os fins e os objetivos prescritos ao ensino do Ginásio Paranaense e da Escola Normal citados no Código de Ensino de 1917 pouco diferem do ano de 1901. Sobre o plano de estudos do Ginásio Paranaense, este é: “Art. 185 - Destinado a ministrar aos estudantes solida instrucção fundamental habilitando-os a prestar, em qualquer escola superior, rigoroso exame vestibular, o curso do Gymnasio Paranaense será de cinco annos” (Paraná, 1917, p. 53). Enquanto “o curso da Escola Normal, [é] destinado à formação de professores para as escolas infantis, primarias e intermediarias do Estado, e dividido em quatro annos [...]” (Paraná, 1917, p. 54 apud Schuindt, 2022, p. 106). Sendo assim, em geral, a Escola Normal estava reservada às mulheres e o Ginásio aos homens. Tal fato se explica pelo aumento da presença feminina no magistério público, especialmente, no ensino primário.

A atuação masculina no magistério paranaense não era ausente, contudo, ocorreu em menor proporção do que a feminina. A diferença foi constante entre os anos de 1890 e 1917. De acordo com o relatório elaborado pelo inspetor de ensino Raul Gomes, emitido em 1917, o qual apresentava dados sobre o total de professores normalistas e não normalistas nas escolas providas, vê-se que a proporção entre homens e mulheres variava: de 127 docentes (43 homens e 84 mulheres) em 1890, para 426 docentes (133 homens e 293 mulheres) em 1917. Além de tudo, ministrar aulas nos anos iniciais do ensino primário era uma função desprezada pelos homens, porque objetivavam os cargos de comando.

O lente catedrático da Escola Normal, Hugo Simas, em seu artigo sobre a educação na escola primária menciona: “Qualquer moça receosa do seo futuro, qualquer rapaz sem recursos para seguir carreira menos penosa, atira-se à Escola Normal, muitas vezes com incapacidade e falta de vocação pelo professorado, e sahe dalli armado em professor publico ...” (Simas, 1912, p. 37 apud Schuindt, 2022, p. 106). As palavras de Simas revelam que, excetuando o gênero, havia outra diferenciação entre as/os alunas/os da Escola Normal e do Ginásio Paranaense. Em grande medida, os meninos que se matriculavam na Escola Normal possuíam poucos recursos financeiros. Por outro lado, as mulheres abastadas e brancas eram incentivadas a cursar a Escola Normal.

A nota no Diário da Tarde que trata sobre a matrícula na Escola Normal anuncia qual era o segmento feminino que deveria frequentar aquele espaço: “Sabemos que este anno o curso da Escola Normal terá desusada frequencia, pois numerosas são as moças das melhores famílias que pretendem inscrever-se para aquele concurso” (Diario da Tarde, 1903, p. 2 apud Schuindt, 2022, p. 106-107). Diferentemente dos estudantes homens, “as moças das melhores famílias” que se matriculariam na Escola Normal eram rotuladas pela condição de classe e pelo pertencimento racial, ideário prescrito para a época. Assim, quando uma mulher negra cursava a Escola Normal trazia consigo insígnias contrárias ao que se desejava de uma professora das primeiras letras, o que gerava inadequações em sua atuação e interação com seus pares.

No início de sua jornada profissional, Nicolas substituiu a professora Júlia Wanderley (1874-1918) em suas atividades docentes na Escola Intermediária (anexa ao Grupo Escolar Tiradentes). Em 05 de setembro de 1917, de acordo com o título de nomeação, começou suas atividades no Grupo Escolar Tiradentes que estava localizado no centro de Curitiba. Atuar nessa instituição tinha um poder simbólico que assentava a mulher negra em uma posição de prestígio social; tanto que, em seus diários, Nicolas registra os conflitos que teve com outras pessoas em seu ambiente de trabalho, o que denominava “olho mau”. 

O termo “olho mau” é um eufemismo para designar o racismo vivenciado por Nicolas em seu cotidiano. Os conflitos eram marcados por uma violência simbólica, no que tangia ao sexismo e racismo enfrentados por ela no âmbito educacional, expressando-se nas relações de subordinação entre homens e mulheres (Bourdieu; Passeron, 1982), isto é, uma violência simbólica que permeava a ordem social, que refletia em homens intermediando, deliberando, mandando e definindo os impasses profissionais de Nicolas.

Para Audre Lorde (2019), muitas vezes, as diferenças entre as mulheres são usadas como uma ferramenta patriarcal para que elas continuem desunidas. Por isso, ainda é necessária uma diferenciação específica entre quais mulheres estamos versando, sobretudo quando se trata de mulheres negras e brancas.

 

Como mulheres, compartilhamos alguns problemas; outros, não. Vocês temem que seus filhos cresçam, se unam ao patriarcado e deponham contra vocês; nós tememos que nossos filhos sejam arrancados de dentro de um carro e sejam alvejados no meio da rua, e vocês darão as costas para os motivos pelos quais eles estão morrendo (Lorde, 2019, p. 150).

 

O reconhecimento das diferenças existentes entre as mulheres corrobora para a visibilização das desigualdades intrínsecas de gênero e para o fortalecimento das lutas comuns; porquanto, o caminho para uma transformação social advém do reconhecimento das distinções existentes dentro do próprio grupo feminino (Lorde, 2019). De modo velado, a maneira com a qual as pessoas se relacionavam e interagiam com Nicolas em seu convívio diário repercutia um racismo estrutural nos termos de Almeida (2021), comportamentos sociais que não isentavam a rivalidade entre as mulheres.

Na Escola Normal existia uma discriminação e uma concorrência entre as mulheres, tanto pela condição de classe quanto pela aquisição do diploma na separação entre professoras leigas e normalistas; visto que, ser uma professora normalista era ocupar um espaço de projeção social e de reconhecimento simbólico. Para Bourdieu (2013), o diploma se configura como um passaporte ao acesso da cultura legítima, pois o documento designa a adoção de certas condições de existência pela aquisição de uma disposição estética de um determinado grupo. A formação na Escola Normal foi um aspecto substantivo na trajetória de Nicolas. Contudo, ela constatou que a conquista do diploma não foi suficiente para garantir uma aceitação entre os pares, tanto pelo modelo de racismo da sociedade no período, quanto pela própria desvalorização do diploma ao longo do tempo. O menor peso simbólico atribuído ao título de normalista derivou da ampliação da rede do ensino primário e da feminização do magistério.

Sobre a ampliação da rede de ensino, entre 1900 e 1910, criaram-se mais escolas do que a quantidade de professores/as para suprir as vagas. Se, em 1900, havia 20,1% de escolas vagas em relação ao total de escolas criadas, já em 1910, essa proporção aumenta para 43,9% do total. Portanto, mesmo com o aumento de normalistas e com a contratação de professoras/es não diplomadas/os (leigas), as ações ensejadas no âmbito educacional não foram suficientes para atendimento da demanda das crianças em fase escolar, do período. Em valores absolutos, por exemplo, em 1910, considerando o preenchimento de vagas nas escolas públicas primárias, havia: 226 escolas vagas (sem leigas ou normalistas) e 228 escolas providas (com leigas ou normalistas), totalizando 514 escolas (Schuindt, 2022, p. 80).

A construção das escolas é decorrente de um aumento demográfico na cidade de Curitiba, a qual passava por uma remodelação em seu quadro urbano. A cidade, em 1890, contava com 24.553 habitantes. Uma década mais tarde, esse número saltou para 49.755, e na década de 1920 correspondia a 78.989 habitantes. Afora as necessidades oriundas pelo aumento populacional, o primeiro vintênio do século XX nas capitais brasileiras corresponde ao período em que os administradores visavam tornar a urbe moderna e civilizada (Mocellin, 2020).

No que se refere à feminização do magistério, ao comparar o número de diretores/as e professores/as em Curitiba (11 Grupos Escolares) e no interior do Paraná (18 Grupos Escolares), no decurso de 1922, constatou-se que: o cargo de diretor/a era uma prerrogativa dada ao gênero masculino (10 diretores para 01 diretora); em contraponto, o gênero feminino compunha o quadro de professoras/es (02 homens para 80 mulheres) (Schuindt, 2022, p. 179).

Tanto pelas funções de trabalho distribuídas entre homens e mulheres nas escolas públicas primárias, e mesmo pelo perfil do alunado que frequentaria a Escola Normal ou o Ginásio Paranaense, o conceito de interseccionalidade permitiu intercruzar o fator classe social, com o racial e de gênero. Fatores que, de modo horizontal, elucidaram os percalços vivenciados por Nicolas, uma mulher negra, de origem pobre, que transita pelos espaços destinados a uma elite branca.

Akotirene (2019) traz a contribuição de Kimberlé Crenshaw (2002) na definição de interseccionalidade, como:

 

A conceituação do problema que busca capturar as consequências estruturais e dinâmicas da interação entre dois ou mais eixos da subordinação. Ela trata especificamente da forma pela qual o racismo, o patriarcalismo, as opressões de classe e outros sistemas discriminatórios criam desigualdades básicas que estruturam as posições relativas de mulheres, raças, etnias, classes e outras (Crenshaw, 2002, p. 175 apud Akotirene, 2019, p. 42).

 

Os estigmas denotados à população negra incutiram em Nicolas os modos de agir e de estar no mundo. Nas palavras de Akotirene (2019, p. 29):

A interseccionalidade é sobre a identidade da qual participa o racismo interceptado por outras estruturas. [...] É imprescindível, insisto, utilizar analiticamente todos os sentidos para compreendermos as mulheres negras e ‘mulheres de cor’ na diversidade de gênero, sexualidade, classe, geografias corporificadas e marcações subjetivas.

 

O racismo, o sexismo e as desigualdades sociais estiveram presentes no seu percurso, que, de acordo com os seus diários, se somatizavam fisicamente nesse corpo considerado “fora do lugar”, um corpo impróprio que se materializava na sensação de “olho mau”.

 

Mas o ‘olho mau’ continuou a me perseguir, pois após uns 20 dias de estada na nova terra, tendo matriculados cinquenta e tantos alunos, saiu-me nos pés umas bolhas de um líquido branco. Coçava muito e esse líquido se transformava em pus. Do tornozelo para baixo era uma só chaga. Sofri sem contar com recurso algum. Mesmo assim, amparada em minha mãe, me sentava no fundo sala para lecionar. Meu sofrimento não era só físico, mas moral também. Enquanto pude me manter em movimento à frente da cátedra, era muito feliz, [...] (Nicolas, [19--]a, p. 52).

 

No início do ano letivo de 1919, Nicolas deparou-se com a publicação de sua remoção do Grupo Escolar Tiradentes para o Grupo Escolar Carvalho. O Decreto n. 36, de 21 de janeiro de 1919, mencionava que haveria uma permuta entre ela e a professora Adelia Gonçalves da Motta, colega da Escola Normal (Paraná, 1919, p. 14). O decreto havia sido realizado sem a sua anuência, em virtude dos desentendimentos com a nova direção e com colegas professoras do Grupo Escolar Tiradentes. Ao conversar com Enéas Marques dos Santos, o Secretário do Interior de Justiça e Instrução Pública, em seu diário relembrou o momento:

 

Suas palavras foram mais ou menos estas: A atual diretora, impôs-me: Não podemos continuar trabalhando com Maria Nicolas (que injustiça) Uma de nós terá de sair do Grupo! ela ou eu? Disse-me o Dr. Enéas – eu desejava que você permanecesse no grupo como uma lembrança da D. Julia, mas mediante a imposição da diretora... - Devo sair ou não? lhe interrompi. Ele afirmou que sim, com um gesto de cabeça (Nicolas, [19--]a, p. 51).

 

Os diretores dos grupos escolares podiam fazer nomeações e remoções em seu quadro de professores. Nicolas foi trabalhar no Grupo Escolar Carvalho e permaneceu na nova escola por um mês; em 21 de fevereiro de 1919, o Decreto n. 127 cancelou a troca entre as professoras (Paraná, 1919, p. 41-42). Na ocasião, em virtude dos desajustes com as colegas de trabalho e com a direção do Grupo Escolar Tiradentes, Nicolas pediu transferência para outra instituição fora de Curitiba. As circunstâncias de sua ida para o Grupo Escolar Carvalho devem ter pesado em sua decisão. Então, declarou ao Secretário da Instrução, Dr. Enéas Marques, que preferia ir trabalhar em alguma escola do interior do Paraná e foi nomeada para atuar na vila de Fernandes Pinheiro. A localidade era pouco desenvolvida pela sua percepção: “Fernandes Pinheiro era muito atrazada; não havia açougue, padaria, farmácia, médico. O trem para a Capital passava dia sim, dia não e sempre atrazado” (Nicolas, [19--]a, p. 52).

Nesses episódios apreendem-se as diferenças entre as mulheres em função do pertencimento de raça e classe, o que corrobora para a visibilização das desigualdades que ultrapassam o quesito gênero; por outro lado, alerta para o fortalecimento das lutas comuns, pois o caminho para uma transformação social advém do reconhecimento das distinções existentes dentro do próprio grupo feminino (Lorde, 2019).

 

Quando as mulheres brancas ignoram os privilégios inerentes à sua branquitude e definem mulher apenas de acordo com suas experiências, as mulheres de cor se tornam ‘outras’, outsiders cuja experiência e tradição são ‘alheias’, demais para serem compreendidas (Lorde, 2019, p. 147).

 

Na diferenciação entre mulheres brancas e negras, Cida Bento (2022) menciona que o pacto da branquitude se manifesta nas mulheres brancas por se perceberem como um ser humano universal, em que o fator racial não marcava suas identidades ou não afetava suas relações sociais; já as mulheres negras “[...] reconheciam que havia uma diferença no tratamento que a sociedade lhes dispensava, [...]” (Bento, 2022, p. 91). Representação de si construída em resposta à pergunta: “O que significa ser uma pessoa branca ou negra no Brasil?” (Bento, 2022, p. 91).

A atuação nos Grupos Escolares da capital simbolizava uma posição privilegiada no campo educacional e era um cargo ambicionado pela categoria de professores que residiam no espaço de circunscrição urbana de Curitiba. Por isso, quando uma professora era nomeada para lecionar em uma Escola Isolada, muitas desistiam do magistério, pois, se sentiam à margem do ensino público ou mesmo discriminadas. Lecionar em Escolas Isoladas foi um espaço de potência para Nicolas,no qual ela converteu o distanciamento geográfico em momentos de reflexão sobre sua prática pedagógica, possibilitando o desenvolvimento de sua criatividade e maior liberdade de ação.

 

As colegas designadas para escolas isoladas sentiam-se humilhadas, queijando-se, eu, não. Nesse ambiente julgava-me maior, senhora das minhas ações, dando asas à imaginação, quando surgiram vários trabalhos, como Ensino de verbos, [livro publicado] e outros ainda inéditos, infelizmente (Nicolas, [19--]b, p. 8).

 

Depois de Fernandes Pinheiro, Nicolas lecionou na Escola Isolada de Pirai do Sul e na Escola Isolada de São Mateus do Sul. A estrutura física e a organização pedagógica das Escolas Isoladas não se assemelhavam a dos Grupos Escolares da capital. As Escolas Isoladas existiam antes dos Grupos Escolares e precisaram ser reorganizadas com a República, assim como eram a estrutura escolar vigente também no Estado de Santa Catarina:

 

elas eram caracterizadas por se localizarem em zonas rurais ou suburbanas, e por terem somente um professor que lecionava para o 1º, 2º e 3º anos, ao mesmo tempo, em uma casa, que podia ser do próprio docente, ou no salão da igreja, ou em alguma casa cedida pela comunidade (Ferber, 2014, p. 3).

 

A ida para o interior do Paraná balizou o deslocamento de um Grupo Escolar para uma Escola Isolada. Acrescido à mudança da organização escolar e de município, o matrimônio e a maternidade incidiram sobre a trajetória profissional de Nicolas. A mulher que adentrasse ao espaço público era aceita desde que o tempo destinado ao trabalho não interferisse em sua função de esposa e mãe. A própria escola era uma extensão do universo doméstico pelo caráter missionário prescrito às professoras primárias. Diante disso, ser professora primária permitia essa mobilidade social, tanto que, com o nascimento de seus dois filhos: Antonio Lourdes Zotto (1922-2001) e Lucy Zotto Ferreira (1923-1996), Nicolas optou por ministrar aulas particulares afastando-se temporariamente do ensino público no final da primeira gravidez. 

Traçando um panorama pelas escolas que lecionou, em Curitiba e no interior do Paraná, observam-se três situações: 1) a lotação em Grupos Escolares da capital foi sempre temporária; 2) as mudanças de instituições eram uma rotina, ocasionando idas e vindas entre a capital e os diversos municípios do interior paranaense; 3) nas intuições de ensino público que lecionou, a duração do contrato não perdurou mais de 12 meses. Conjunturas que denotam um sentimento de não pertencimento e um impedimento para criar raízes sociais (Schuindt, 2022).

Durante sua atuação no ensino primário, Nicolas não foi bem-vista na vaga de Julia Wanderley e não se sentia pertencente ao grupo de professoras formadas pela Escola Normal, em Curitiba. Nesse aspecto, a teoria bourdieusiana, pelo seu viés analítico sociológico, foi essencial para compreender como ocorre a distinção e a apropriação cultural entre os diferentes grupos e classes sociais; porém, no contexto brasileiro, essas distinções se agravaram pelo fator racial e de gênero. A classe social, o gênero e a raça combinados pelo poder de dominação se interseccionam como descreve Collins e Bilge (2021). Já que,

 

[...] em determinada sociedade, em determinado período, as relações de poder que envolvem raça, classe e gênero, por exemplo, não se manifestam como entidades distintas e mutuamente excludentes. De fato, essas categorias se sobrepõem e funcionam de maneira unificada. Além disso, apesar de geralmente invisíveis, essas relações interseccionais de poder afetam todos os aspectos do convívio social (Collins; Bilge, 2021, p. 16).

 

Enfim, o acesso à escolarização era o primeiro passo para uma melhoria social e não uma garantia de sucesso, que no caso de Nicolas resultou em uma trajetória marcada por opressões. A associação das pessoas negras ao escravismo e da mulher ao espaço doméstico incutiu no imaginário do senso comum que a escola não era o lugar a ser ocupado por esse perfil populacional; em consequência disso, mesmo Nicolas transitando neste espaço como estudante, e/ou professora, a maneira que os outros a viam era como uma Outsider Within (Collins, 2016). Ademais, nascida e crescida no centro geográfico e vivendo à margem do centro social e cultural, o olhar de Nicolas se enquadrava na posição vivenciada por bell hooks (2019, p. 23), cujo ponto de vista era “tanto de fora para dentro quanto de dentro para fora”, um modo de olhar que fazia com que Nicolas contestasse as imposições que lhe eram feitas durante sua atuação docente.

 

 

3 Nha Maria (...), as sutilezas de uma sociedade racista e de classe

Durante a infância, ela foi apelidada de “Maria do teatro” ou “Maria da Nha Josepha”, termos que a remetiam ao seu local de moradia e à proximidade dos traços fenotípicos de sua mãe. As vivências de Maria Nicolas no Teatro Guaíra fizeram com que ela adquirisse um nível cultural diferenciado de outras crianças que tinham capital econômico similar ao seu e que haviam nascido em uma classe ordinária.

 

[...] Guayra, para onde eu vim com três meses e meio, só saindo definitivamente aos 36 anos, depois de meu pai aposentado e o teatro foi condenado. Aí me casei. Aí tive dois filhos. Desde os 2 anos e meio assisti apresentações teatrais; na coxia do teatro, sentada ao lado de meu pai que era quem subia e descia o pano de boca, além de executar os demais afazeres. Ele era o que se chama ‘sete ofícios’ (Nicolas, [19--]a, p. 59).

 

Ao mesmo tempo em que seu pai trabalhava nas coxias da edificação, ela apreciava as apresentações realizadas no local. Em vários episódios da vida de Nicolas é perceptível a ligação com a produção de peças teatrais. Em 1972, ao assumir a cadeira n. 24 da Academia Feminina de Letras do Paraná, ela realizou o lançamento do livro Teatro Infantil. Essas rotinas, por conseguinte, lhe propiciaram a composição de um patrimônio cognitivo essencial ao seu desenvolvimento futuro. Assim: “[...] a aquisição da cultura legítima pela familiarização insensível no âmago da família tende a favorecer, de fato, uma experiência encantada da cultura que implica o esquecimento e a ignorância dos instrumentos da apropriação” (Bourdieu, 2013, p. 10).

Outro fator importante para sua permanência no mundo letrado era o apoio emocional advindo de sua mãe, que esteve presente em vários momentos da sua trajetória. Uma dessas situações ocorreu quando Nicolas assumiu a vaga de Julia Wanderley, em 1917:

 

Achava-me tratando de minha nomeação efetiva nessa classe, quando de passagem pela casa de d. Julia Wanderley, mamãe foi por ela intimada a voltar, pois precisava falar comigo. Para tanto, fez mamãe deixar a cesta que levava para trazer verduras e voltar à casa para me chamar. Relutei em atendê-la porque eu tinha um grande respeito e medo, por sua atitude militar, embora jamais tivesse sofrido injustiça, quando sua aluna, em 1912, o meu temperamento de humildade e de chorona, me faziam ter lhe medo, apesar de ela só me desejar o bem, pondo-me ao nível das demais colegas, muitas delas de alta sociedade. Aconteceu, porém, que mamãe me convenceu e eu fui falar-lhe. Achava-se presente o Dr. Victor do Amaral. Ela me disse: ‘Maria Nicolas, vou me licenciar, você será a minha substituta’. Resmunguei um protesto, mas o Dr. Victor disse: ‘Aceite, D. Julia sabe o que faz.’ Então ela continuou: ‘Depois que sarar ficarei somente como diretora, minha classe da Intermediária será sua, vá para a casa e leia os jornais para saber quando deve assumir’ (Nicolas, [19--]a, p. 48-49).

 

A Sra. Josepha não era alfabetizada e há controvérsias em relação à data de seu nascimento e morte, mesmo a escrita do seu nome aparece com várias grafias nas fontes consultadas. Antonio Nicolas, filho de João Nicolas (irmão de Maria Nicolas), em uma entrevista concedida à sua neta Nicole Louise Capote Nicolas, menciona sobre as origens familiares de sua avó paterna: “Sua mãe era negra e trabalhava como dona de casa fritando pastéis para fora, tendo a ajuda dos filhos para vendê-los. Josepha não tinha estudos, mas fez questão de que os filhos tivessem uma boa formação” (Nicolas, 2013, p. 34).

A condição modesta da família fazia com que Alyr Léon e Josepha se preocupassem com o futuro das/os filhas/os, projetando na educação uma melhoria de vida. Ainda que seus pais incutissem aspirações às/aos filhas/os para progredirem socialmente, pelo acesso à formação escolar, pelas amizades cultivadas, ou por meio da ampliação de seu repertório cultural, nota-se que, o estigma da escravidão perpassava as relações interpessoais nas primeiras décadas do século XX.

Nicolas, em seus registros, se identificava como negra e desde a infância conviveu com episódios de racismo. Recordava-se que um dos seus vizinhos a discriminava e, ao caminhar pela rua, ouviu a seguinte récita: “O pintor que pintou Maria, Pintou Thereza também, Que culpa tem o pintor, Se Maria não saiu bem” (Nicolas, [19--]a, p. 9). Seu corpo carregava insígnias de subordinação ao branco, que Nogueira (2006) denominou de preconceito de marca.

 

Quanto à reação do grupo discriminado: onde o preconceito é de marca, a reação tende a ser individual, procurando o indivíduo ‘compensar’ suas marcas pela ostentação de aptidões e característicos que impliquem aprovação social tanto pelos de sua própria condição racial (cor) como pelos componentes do grupo dominante e por indivíduos de marcas mais ‘leves’ que as suas; [...] (Nogueira, 2006, p. 301).

 

A comparação com a irmã de pele mais clara elucida que a reação ao grupo discriminado foi de cunho individual (Nogueira, 2006), sendo que, o preconceito também se camufla pela estrutura social como um atributo de classe. As características enunciadas por Nogueira (2006) em meados da década de 1950 sobre o preconceito de marca remetem ao debate de Alessandra Devulsky (2021) acerca do colorismo. O colorismo é um desdobramento do racismo, ambos se constituem como uma ideologia que se pauta na superioridade do fenótipo branco. Nesse processo social complexo há uma hierarquia entre os que se aproximam ou se distanciam dos traços culturais e morfológicos do colonizador.

 

O colonizador é a régua e a regra. O colonizado é o espaço a ser invadido; o sujeito a ser escrutinado por critérios construídos algures; aquele que por definição é o negativo do outro, a exceção. Ele deve ser expurgado para dar espaço aos valores intrínsecos à europeinidade. Assim, o branco se firma como parâmetro etnocêntrico (Devulsky, 2021, p. 30).

 

Em analogia às colocações de Devulsky (2021), Lorde (2019), ao se referir ao contexto dos Estados Unidos, assevera que há uma norma mítica nas relações sociais de poder. Participam dessa norma aqueles que são caracterizados como: “[...] branco, magro, homem, jovem, heterossexual, cristão e financeiramente estável” (Lorde, 2019, p. 145). Os demais, que não se enquadram nessa descrição, estão à margem.

No caso de Nicolas, a antipatia pelo seu vizinho é uma reação natural da discriminação por ela vivida, já que os versos representam a ideologia racista entre brancos e negros. Se, por um lado, Nicolas destacava o acervo cultural herdado de seu pai, por outro, percebia que o capital cultural assimilado não era suficiente para neutralizar o estigma de ser negra, ou para mudar a força do capital social. O capital social partilhado e preservado entre os grupos nos quais conviveu era um elo de coesão social, nos termos de Bourdieu (2017, p. 75):

 

[...] o volume do capital social que um agente individual possui depende então da extensão da rede de relações que ele pode efetivamente mobilizar e do volume do capital (econômico, cultural ou simbólico) que é posse exclusiva de cada um daqueles a quem está ligado.

 

Conservar uma rede de relações era essencial para a manutenção do capital social, que no caso de Nicolas se fragilizava pela mudança constante de escolas e municípios: “[...] o ‘olho mau’ continuava seguindo as minhas pegadas” (Nicolas, [19- -], p. 54).

Em Piraí do Sul ocorreu uma desavença entre Nicolas e Raul Santos, que era o inspetor local, justamente pelo fato de Nicolas ter sido nomeada para uma vaga que já estava prometida para outra pessoa. As divergências entre eles se refletiram nos trâmites burocráticos do ensino, por exemplo, na insatisfação do inspetor em relação à organização do resumo mensal de desempenho dos alunos escrito por Nicolas. Na ocasião, o inspetor impôs-lhe que o documento deveria seguir um modelo semelhante ao de outra professora que não era normalista, e caso a ordem não fosse acatada, isso poderia incidir em prejuízos no recebimento do seu ordenado mensal. Nicolas, valendo-se de seu título de normalista e do capital simbólico da professora Julia Wanderley, não concordou com a situação. “Senti me ofendida, pois depois de ser considerada pela bondosa D. Julia, que revia todos os meses o resumo mensal, revoltei-me declarando não copiar qualquer documento, porquanto tinha capacidade para redigi-los. Para ser autêntico eu havia me diplomado. [...]” (Nicolas, [19--]a, p. 54).

Ainda assim, Nicolas dispunha de capital social e o mobilizava quando necessário. Diante do conflito, ela recorreu ao Dr. Alcebíades Correa Bittencourt (1882-1952), juiz de direito de Piraí do Sul, filho do casal Cristina de Moura Britto (1861-1921) e Damásio Correia de Bittencourt (1844-1895). O Dr. Alcebíades, que era filho da madrinha de Nicolas, procurou o inspetor e realizou um acordo de vistar os relatórios mensais, que passariam primeiramente pelo seu endosso antes de serem entregues ao inspetor. A figura do inspetor escolar no controle das ações escolares aparece desde o período provincial paranaense, especialmente nas Escolas Isoladas, nas quais não havia a função do diretor escolar. A inspeção consistia em verificação das atividades pedagógicas, desde o controle dos livros de escrituração, até uma análise do trabalho realizado pelo professor.

O relacionamento com o inspetor Raul Santos não melhorou e outras situações adversas acarretaram a suspensão do salário de Nicolas, fazendo-a desistir das aulas em Piraí do Sul; igualmente, o seu estado frágil de saúde cooperou para tal decisão.

 Em várias passagens destacadas por Nicolas em suas memórias, vemos que ela dispunha de capital social pedindo auxílio às pessoas com quem mantinha laços sociais, provindos de seus vínculos familiares; por outro lado, após a morte de Julia Wanderley, sua estada na capital paranaense tornou-se um problema para as colegas de trabalho.

Nicolas vivenciou um contexto histórico marcado pelo “racismo científico” e pelo “mito da democracia racial”. O racismo científico defendia a não mistura entre as raças no sentido biológico, conduta que se estendia aos ambientes de sociabilidade. Para ilustrar esse tabu entre as raças, destaca-se um trecho escrito por Annete Macedo no período em que cursou a Escola Normal, entre 1909 e 1911. Com o título “Chega-te aos bons”, a autora expõe o seguinte diálogo:

 

- Zélita -Para matrícula da Escola Normal devia haver uma seleção. Admitidas somente moças de boa família. Infelizmente há muita mistura.

- Guida -Mistura. Moças de boa família. Não sei bem o que você quer dizer com essas expressões. Si se refere à posição social, está em grave erro. Pois conheço muitas mocinhas de família humilde e honrada tão dignas, ou mais, (conforme o caso) de que outras descendentes de famílias de posição de destaque na sociedade. Não direi que na classe alta não haja dignidade. A dignidade existe em qualquer classe social. Isto é, tanto entre ricos como entre os pobres.

- Zélita -Não me refiro somente às classes sociais. Refiro-me à influência do meio, à influência perniciosa das más companhias. (Macedo, 1953, p. 140 apud Schuindt, 2022, p. 107).

 

Ao ampliar o olhar para os aspectos filosóficos que envolviam o diálogo, as diferenças humanas no início do século XX sob a pauta do racismo tornaram-se objeto de estudo dos pensadores da época, cujas explicações científicas justificavam a supremacia branca. De acordo com Silvio Almeida (2021, p. 29):

 

A biologia e a física serviram como modelos explicativos da diversidade humana: nasce a ideia de que características biológicas – determinismo biológico – ou condições climáticas e/ou ambientais – determinismo geográfico – seriam capazes de explicar as diferenças morais, psicológicas e intelectuais entre as diferentes raças.

 

Nessa percepção, a pele não branca e o clima tropical brasileiro eram vistos como ingredientes que justificavam nos mestiços os “comportamentos imorais, lascivos, violentos e de pouca inteligência” (Almeida, 2021, p. 29). Sendo assim, no pensamento identificado como racismo científico, baseado nos pressupostos de Arthur de Gobineau, o imperativo era evitar a mistura de raças (Almeida, 2021). O racismo científico presente nos anos iniciais do século XX, seja no comportamento individual ou no âmbito institucional, recebeu uma nova roupagem a partir da década 1930, caracterizado pelo que se denomina de mito da democracia racial. Para Sales Junior (2006), o mito da democracia racial estava alicerçado na cordialidade racial, ou seja, “a cordialidade, por meio do não-dito racista, faz com que a discriminação social não seja atribuída à ‘raça’ e, caso isso ocorra, a discriminação seja vista como episódica e marginal, subjetiva e idiossincrática” (Sales Junior, 2006, p. 232).

Em ambos os processos, no racismo científico e no mito da democracia racial, a mulher negra não participa socialmente em espaços relevantes de atuação pública, principalmente aqueles associados à cultura e ao poder. Lélia Gonzalez (2020, p. 44), assinala que:

 

O processo de exclusão da mulher negra é patenteado, em termos de sociedade brasileira, pelos dois papéis sociais que lhe são atribuídos: ‘domésticas’ e ‘mulatas’. O termo ‘doméstica’ abrange uma série de atividades que marcam seu ‘lugar natural’: empregada doméstica, merendeira na rede escolar, servente nos supermercados, na rede hospitalar etc. Já o termo ‘mulata’ implica a forma mais sofisticada de reificação: ela é nomeada ‘produto de exportação’, ou seja, objeto a ser consumido pelos turistas e pelos burgueses nacionais.

 

Para a autora, ao se referir ao contexto brasileiro da década de 1950 e que ainda era vigente nas duas décadas seguintes, os termos boa aparência ou ótima aparência comunicados nos anúncios dos jornais alude ao fato de que a mulher negra não tem espaço em trabalhos que exigia contato com o público (Gonzalez, 2020). Ser professora normalista na década de 1920 e 1930 implicava em ter contato com o público e exercer uma função letrada.

Collins e Bilge (2021) lembram, por meio da ferramenta analítica da interseccionalidade, que a autopercepção das diferentes formas de preconceito é diferenciada entre as pessoas, porque estas possuem identidades complexas que se moldam pelas suas relações sociais; isto é, “[...] homens e mulheres frequentemente sofrem o racismo de maneiras diferentes, assim como mulheres de diferentes raças podem vivenciar o sexismo de maneira bastante distintas, e assim por diante” (Collins; Bilge, 2021, p. 29). Portanto, Nicolas, ao adentrar a Escola Normal e durante a sua trajetória docente, vivenciou uma tripla concorrência: de classe, de raça e de gênero.

4 Considerações finais

Ao caracterizar a organização familiar de Maria Nicolas, com o intuito de observar sua primeira formação educacional, e ao delinear o percurso escolar de cada membro de sua família, percebe-se que os pais de Nicolas compreendiam que o acesso e a permanência na escola era um modo de integração e ascensão social (Schuindt, 2022). Vivendo dentro de uma sociedade racista, patriarcal e sexista, Nicolas foi direcionada a lecionar em escolas afastadas da capital. Estava dentro do grupo das normalistas, no entanto era vista como alguém de fora (Collins, 2016; bell hooks, 2019). Além disso, mesmo ocorrendo um processo de feminização nos espaços hierárquicos concernentes às instituições escolares, Nicolas não ascendeu a nenhum cargo de direção e, ao ocupar a posição indicada por Julia Wanderley, sentiu o desconforto de estar em um lugar onde não era bem-vista – termo que Collins (2016) define como Outsider Within ou Forasteira de Dentro.

A origem racial e a classe social de Nicolas não condiziam com o que era esperado para as mulheres que tinham a incumbência de promover a instrução pública aos futuros cidadãos da nação republicana por meio da educação primária; por isso, era vista como uma forasteira. Enfim, as questões de raça, classe e gênero se interseccionam ao longo de sua trajetória operando para que Nicolas se mantivesse em posições periféricas, apartada do centro e segregada dos domínios de poder; uma vez que, a conquista do diploma de normalista não foi suficiente para romper com o racismo, o classismo e o sexismo da época.

Diante desse cenário, observa-se que as mudanças constantes de escolas marcam a caminhada pedagógica de Nicolas pelas escolas públicas do Paraná. Essa itinerância totalizou treze escolas diferentes, entre 1917 e 1937. Incluindo seis escolas em Curitiba: Grupo Escolar Tiradentes, Grupo Escolar Carvalho, Escolas Reunidas do Prado, Escola Mista Barreirinha do Ahú, Escola Maternal da Sociedade de Socorro aos Necessitados, Escola Mista de Mattão das Laranjeiras. E sete escolas no interior do Paraná: Escola Isolada em Fernandes Pinheiro, Escola Isolada em Piraí do Sul, Escola Isolada em São Mateus do Sul, Grupo Escolar Serapião em União da Vitória, Escola de Aplicação anexa à Escola Normal em Paranaguá, Escola para o sexo feminino Papagaios Novos em Palmeira, e Escola Complementar Primária anexa ao Grupo Escolar Jesuíno Marcondes, também em Palmeira.

Constata-se que, a sinuosidade do percurso trilhado por Nicolas, entre altos e baixos, nos quilômetros percorridos, revelou pistas de uma sociedade civilizada e racista, cujos processos educacionais da população negra tinham regras tácitas de funcionamento; tanto que ao movimentar-se de um lugar para o outro Nicolas estava em busca de um espaço de pertencimento, o que não ocorria. Traduzido pela expressão o “olho mau”, o racismo estrutural esteve presente em seu trajeto escolar e profissional.

 

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