Dossiê

 

Biografia e Educação Musical: um estudo sobre as rotas formativas de quatro religiosos brasileiros

BIOGRAPHY AND MUSIC EDUCATION: A study on the formative paths of four brazilian religious

Jusamara Souza 1

Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Brasil

Michelle Arype Girardi Lorenzetti 2

Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Instituto Federal do Rio Grande do Sul (IFRS), Brasil

Revista Orfeu
Universidade do Estado de Santa Catarina, Brasil
ISSN: 2525-5304
Periodicidade: Semestral
vol. 7, núm. 1, 2022
revistaorfeu@gmail.com

 

URL: https://periodicos.udesc.br/index.php/orfeu/article/view/21771

Autores mantém os direitos autorais e concedem à revista o direito de primeira publicação.

Resumo: O presente artigo analisa as rotas formativas musicais de quatro religiosos e suas atuações como formadores no âmbito da Igreja Católica no Brasil, na perspectiva da sociologia da educação musical. Os relatos foram colhidos por meio de entrevistas, seguindo um roteiro semiestruturado de questões que contemplaram diferentes aspectos e temas relacionados à formação e atuação com música no ambiente religioso. O referencial teórico adotado apoiou-se no conceito de “rotas” formativas, de José Machado Pais (2003), como os percursos de formação dos religiosos e seus caminhos na formação de outras pessoas. A concepção teórica de biografia e o conceito de rotas formativas possibilitaram vincular práticas e experiências individuais, no nível micro, àquelas presentes no contexto da Igreja Católica, no nível macro. Compreende-se que a formação musical dos religiosos entrevistados é impregnada pelos seus percursos biográficos revelados nas escolhas pedagógico-musicais, formas de apropriação do conhecimento musical e funções educativas e socializadoras da religião no contexto da educação musical.

Palavras-chave: Biografia, Formação Musical, Rotas Formativas, Religião, Sociologia da Educação Musical.

Abstract: This article analyzes the musical formative paths of four religious and their performances as trainers within the ambit of the Catholic Church in Brazil, from the perspective of the sociology of music education. The reports were collected through interviews following a semi-structured script of questions that contemplated different aspects and themes related to the formation and performance with music in the religious environment. The Theoretical Frame of Reference elected was based on the concept of formative “paths” by José Machado Pais (2003) as the paths of formation of religious and their paths in the formation of other people. The theoretical conception of biography and the concept of formative path made it possible to connect individual practices and experiences, at the micro level, with those present in the context of the Catholic Church, at the macro level. It is understood that the musical formation of the religious interviewed is impregnated by their biographical paths revealed in the pedagogical-musical choices, forms of appropriation of musical knowledge and educational and socializing functions of religion in the context of music education.

Keywords: Biography, Musical Formation, Formative Paths, Religion, Sociology of Music Education.

Introdução

Nos últimos anos, as fontes biográficas vêm, cada vez mais, sendo utilizadas, especialmente no campo das ciências sociais e nas pesquisas educacionais. O conceito de biografia aparece em diferentes contextos temáticos e visões teóricas, mostrando sua recuperação em um lugar de prestígio na produção acadêmica devido à retomada das reflexões sobre as ações individuais a respeito da realidade social em que os sujeitos vivem. Desde então, intensificaram-se as discussões sobre as questões conceituais e metodológicas relativas ao uso de biografias na produção do conhecimento científico (AVELAR, 2010; DEMARTINI, 2010).

No campo da educação musical, o trabalho com biografias é relativamente recente no Brasil. Sua utilização como método de trabalho científico foi se instalando gradualmente, com pesquisas no âmbito do mestrado e doutorado3, com a criação de grupos de pesquisa4, e se difundindo com maior rapidez com a participação de professores e pesquisadores no Congresso Internacional de Pesquisa (Auto)biográfica (CIPA) (desde 2004) e com a proposição do Grupo de Trabalho Especial (GTE) “Educação Musical e Pesquisa (Auto)biográfica” no XXV Congresso da Associação Brasileira de Educação Musical (ABEM), em 2021, com apresentações de trabalho em números crescentes. Desde então, o tema “biografias e educação musical” tem se imposto com cada vez mais força.

Neste texto, discutimos o que vimos refletindo há um certo tempo no campo da sociologia da educação musical sobre questões pedagógico-musicais em espaços/tempos da cotidianidade e sobre a utilização de fontes diferenciadas como histórias de vida e memórias em investigações que contribuem para a construção do campo pedagógico-musical (SOUZA, 2000, 2014).

Uma das pesquisas realizadas nessa perspectiva é a tese de doutoramento defendida por Michelle Arype Girardi Lorenzetti, em março de 2019. Intitulada Formar-se e ser formador: rotas formativas musicais de religiosos no contexto católico brasileiro na perspectiva da sociologia da educação musical e da vida cotidiana, a tese foi defendida na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), sob orientação da Profa. Dra. Jusamara Souza (UFRGS) e com a co-orientação do Prof. Dr. Andreas LehmannWermser (HMTM).

A partir da referida pesquisa (LORENZETTI, 2019), o artigo aborda as rotas formativas musicais de quatro religiosos e suas atuações como formadores no âmbito da Igreja Católica no Brasil, procurando analisar a relação entre as histórias individuais de um grupo representativo de agentes e o espaço de formação que passaram a ocupar após o Concílio Vaticano II (1962-1965). O conceito de “rotas” formativas foi adotado na perspectiva do cotidiano (MACHADO PAIS, 2003) como os percursos de formação dos religiosos e seus caminhos na formação de outras pessoas. São lembranças de como esses quatro religiosos aprenderam e como passaram a ensinar música para outras pessoas em um contexto institucional religioso, onde a religião se manifesta em suas escolhas e falas.

Tendo como foco central o formar-se e o processo de formar outras pessoas, relacionando biografia e formação musical, foram escolhidos quatro colaboradores para participarem da pesquisa: Padre José Henrique Weber, Irmã Míria Therezinha Kolling, Padre Ney Brasil Pereira e Irmã Custódia Maria Cardoso5. Estes foram escolhidos por terem um importante papel na formação musical na Igreja Católica brasileira e terem suas formações voltadas para a prática litúrgico-musical. Além disso, durante a realização da pesquisa, esses formadores ainda estavam atuando em cursos, palestras, oficinas de música e condução de ensaios, o que permitia captar as experiências individuais e ações realizadas no presente.

Referir-se à música na igreja necessariamente implica considerar a variedade tanto de igrejas quanto de gêneros musicais. Não sendo possível contemplar todas as variáveis, faz-se necessário determinar um foco, sendo este um dos fatores que justificam a escolha, nesta pesquisa, de uma igreja – a Igreja Católica (a qual, em si, já revela grande diversidade) – e de um tipo de música – a música litúrgica.

Nos últimos anos, vários pesquisadores, no campo da música, têm dedicado seus estudos a compreender a religião como uma instância educadora (SOUZA, 2003; ZANANDREA, 2009; ALMEIDA, 2014). Com base em estudos como o de Setton (2012), a área vem assimilando a ideia de que, junto com a família, a escola e as mídias, a religião vem promovendo e colaborando para uma educação musical. Setton (2012, p. 95) compreende a religião, assim como a cultura, como “fenômenos que oferecem espaço para empreender um diálogo entre indivíduo e sociedade”, sendo vistas como “espaços de entendimento das relações estabelecidas entre o mundo material (estruturas objetivas) e o mundo simbólico (estruturas mentais/subjetivas)”.

Destacando a necessidade de discussão sobre as funções sociais e educativas das religiões, Setton (2008, p. 16) compreende as religiões como agentes de socialização, ou seja, assim como a família e a mídia, as religiões são compreendidas como “espaços produtores de valores morais e identitários” sendo, “por excelência, espaços formadores de consciência”.

Nos estudos sobre o papel da religião católica na formação musical, pode-se destacar os trabalhos de Torres (2004), Louro et al. (2011), Lorenzetti (2015), Federizzi e Ormezzano (2017) e Louro e Reck (2017). Especificamente sobre as igrejas como instituições de ensino pedagógico-musicais, pode-se citar a obra Kirchen, Musik, Pädagogik (Igrejas, Música, Pedagogia), organizada por Macht (2005). Em um dos capítulos desse livro, Richter (2005) expõe que a música pode ser compreendida como instituição de ensino, no qual todas as tarefas de um músico de igreja poderiam ser consideradas pedagógicas. A importância de se estudar sobre o ensino e aprendizagem de música nas religiões pode ser justificada pela compreensão de que a prática pedagógico-musical se encontra em vários lugares, levando em conta que “os espaços onde se aprende e ensina música são múltiplos” (SOUZA, 2007, p. 28). Considerando a religião como algo presente na vida das pessoas, logo, suas relações com a música interessam à área de música e, por isso, a relevância de tomá-la como objeto de estudo (LORENZETTI, 2020).

Feitas essas considerações introdutórias, o texto apresenta, a seguir, algumas questões teórico-metodológicas da pesquisa com métodos biográficos para, na sequência, analisar as trajetórias dos participantes, descrevendo a aproximação deles com a música e com a religião na família, nas instituições religiosas e nas universidades, traçando os caminhos que possibilitaram a formação músico-religiosa e sua atuação como agentes de formação no espaço da Igreja Católica.

Questões teórico-metodológicas

Como mencionado, para referirmos aos caminhos de formar-se e formar outras pessoas, utilizamos o conceito de rotas formativas na perspectiva da sociologia da vida cotidiana (MACHADO PAIS, 2003). Considerando as raízes etimológicas de rotina, Machado Pais (2003, p. 9) sugere a possibilidade de rotina ser associada “à ideia de rota (caminho), do latim via, rupta, donde derivam expressões ‘rotura’ ou ‘ruptura’: ato ou efeito de romper ou interromper”. As rotas formativas são feitas de continuidades, de desvios, de cruzamentos, revelando uma trama complexa.

Para Machado Pais (2003, p. 151), o método biográfico na análise da vida cotidiana é “um método que acaba por atribuir à subjectividade um valor de conhecimento que constitui ponto de partida para a compreensão da realidade social”. Para o autor, “o método biográfico assenta basicamente em elementos materiais que são, em sua grande parte, ‘autobiográficos’, expostos, portanto, às múltiplas deformações de um ‘sujeito-objecto’ de observação” (MACHADO PAIS, 2003, p. 151). Entretanto, mesmo considerando que esses materiais sejam subjetivos, ele adverte que “os testemunhos autobiográficos constituem um facto sociologicamente objetivo” (MACHADO PAIS, 2003, p. 151).

Ao tratar sobre fontes documentais na vida cotidiana, Machado Pais (2003) destaca questões importantes para se trabalhar com documentos biográficos. Uma das questões colocadas pelo autor é a possibilidade heurística dos métodos biográficos “de ver o universal através do singular” (MACHADO PAIS, 2003, p. 150-151). Trata-se de uma discussão central nas ciências sociais sobre a singularidade versus a universalidade, ou o sujeito em relação ao contexto histórico e social em que vive. Nessa perspectiva “cada indivíduo singulariza em seus atos a universalidade de uma estrutura social” e, por isso, através de uma biografia, seria possível ler uma sociedade (GOLDENBERG, 2004, p. 36-37).

Ao defender o uso dos métodos biográficos, Machado Pais (2003, p. 151) explica o sentido de indivíduo para a sociologia, afirmando que este “não constitui um átomo social representativo da unidade heurística mais elementar da sociologia”. Citando Ferraroti6, o indivíduo é, para Machado Pais (2003, p. 151), simplesmente “uma síntese complexa de elementos sociais”; por essa razão, “os documentos biográficos (memórias, biografias, histórias de vida, etc.) não podem ser considerados como reflexos passivos de uma entidade individual, isolada”. Para o autor ,“o relato biográfico revela-se sempre como uma ‘prática humana’” (MACHADO PAIS, 2003, p. 151). À pergunta sobre como a subjetividade “inerente a uma autobiografia pode constituir o suporte de um conhecimento científico” (MACHADO PAIS, 2003, p. 151), o autor responde:

Ora, se cada biografia aparece como síntese de uma história social e, paralelamente, cada comportamento ou acto individual aparece como síntese de uma estrutura social, há sempre lugar a um movimento de vaivém, da biografia ao sistema social, do sistema social à biografia. Ou seja, o sistema social – na medida em que não existe fora dos indivíduos – manifesta-se sempre na vida individual de tal forma que pode ser apreendido a partir da especificidade das práticas individuais (MACHADO PAIS, 2003, p. 151).

Com esses argumentos, o autor propõe maneiras de indagar “o objetivo fundado no subjectivo” e de “descobrir o geral através do particular” (MACHADO PAIS, 2003, p. 151), procurando articular a biografia com o seu contexto histórico e social. Trazendo para a pesquisa realizada, ao tomar como exemplo algumas rotas formativas de religiosos com trajetórias significativas na Igreja Católica brasileira, procuramos destacar as condições dadas para suas formações musicais e religiosas, no intuito de ver as condições sociais existentes, os comportamentos e valores que perpassam essas trajetórias sem, no entanto, perder o caráter singular e típico de cada biografia narrada.

Ao centrar a investigação nos relatos de quatro religiosos, estes são compreendidos como sujeitos que vivem/viveram a música; porém, não se perde o olhar sobre a maneira como o pensamento institucional religioso manifesta-se em suas escolhas, suas falas e, principalmente, em seu modo de aprender e ensinar música. Assim, objetiva-se conjugar o que Machado Pais (2003, p. 18) sugere que seja articulado pelo cotidiano: “a sociedade a nível dos indivíduos” e “como a sociedade se traduz na vida deles”.

O método biográfico requer a participação de pesquisadores que tenham como objetivo desvendar a vida daqueles que serão entrevistados ou cujos depoimentos serão estudados. No caso da biografia, como escreve Demartini (2010, p. 136), trata-se da “história de um indivíduo redigida por outro”, enquanto a autobiografia, no sentido restrito, “existe sem nenhum pesquisador”, pois “é o narrador que, sozinho, manipula os meios de registro, quer seja a escrita, quer seja o gravador”. Assim, a intermediação e a participação dos pesquisadores possuem diferentes nuances nos métodos biográficos e a participação do(a) entrevistador(a) torna-se um ponto importante na utilização dos métodos biográficos no que tange aos “mecanismos de manipulação e cooptação associados” à realização de entrevistas (MACHADO PAIS, 2003, p. 151).

Na presente pesquisa, os relatos foram coletados por meio de entrevistas seguindo um roteiro semiestruturado de questões que contemplaram diferentes aspectos e temas relacionados à formação e atuação profissional com música no ambiente religioso. Optamos por colher depoimentos orais, seguindo a ideia de Bogdan e Biklen (1994, p. 136), conforme a qual “num projecto de entrevista qualitativa a informação é cumulativa, isto é, cada entrevista, determina e liga-se à seguinte. O que conta é o que se retira do estudo completo”. As várias interlocuções não possuem intensidade nem duração iguais, pois, mesmo quando curtas, podem trazer elementos relevantes para a pesquisa. A opção por tal sistemática adveio da possibilidade de “colher opiniões, modos de pensar, atitudes, retóricas que nos permitem, enfim, descobrir sentidos de vida” (CARVALHO et al., 2013, p. 370). Nesse sentido, “o conhecimento comum é uma preciosa matéria prima do conhecimento científico” (CARVALHO et al., 2013, p. 370), e esse é um dos motivos de se realizar entrevistas. Por se tratar de pessoas que fizeram parte da história da formação musical na Igreja Católica, no Brasil, há muitas memórias que não são contadas em livros nem gravadas em canções. Por essa razão, ter acesso a esses relatos pode ampliar o olhar sobre como a música é aprendida e ensinada neste contexto.

Nos depoimentos orais, os entrevistados relataram sobre suas vidas e a relação com a formação litúrgico-musical. Falaram a respeito de suas concepções, de como vivenciaram alguns fatos, e expuseram suas memórias, que foram gravadas em áudio e vídeo. No total, foram realizadas sete entrevistas individuais, durante o ano de 20167, com cerca de 8 horas e 30 minutos de gravação. Após a transcrição, realizou-se a análise das entrevistas, a partir de dois grandes temas: a história de formação dos entrevistados e quem formam/o que ensinam.

Para a análise dos dados, a sociologia da vida cotidiana (MACHADO PAIS, 2003) embasou teoricamente a pesquisa. Nesta pesquisa, compreende-se que, no cotidiano, naquilo que sempre ocorre, está a música na igreja, a qual é entendida não pelo olhar histórico e/ou musicológico, mas pelo olhar da educação musical. Nessa perspectiva do cotidiano, busca-se valorizar a experiência, o vivido, como Machado Pais (2006, p. 231) pleiteia:

De facto, mais importante do que discutir definições abstractas sobre o que a religião representa, importa sobretudo saber como ela é vivida. Isto é, interessa-nos mais saber, por exemplo, o que é que os crentes pensam e dizem sobre o que fazem do que, como Durkheim ou Parsons preferiam, olhar simplesmente a religião como um “sistema social” que exogeneamente se impõe aos crentes.

A complexidade do cotidiano manifesta-se, nesta pesquisa, pelo modo de olhar para a realidade, em que os fragmentos de quatro vidas são capturados, como uma imagem momentânea, seguindo a ideia de snapshot de Simmel (MACHADO PAIS, 2003). O “aqui e agora” da voz de quatro religiosos narra histórias de sua própria formação e dos processos formativos ocorrentes na Igreja Católica. As histórias por eles contadas não são percebidas como algo fixo no passado, mas como algo possível de ser visto pela perspectiva do “aqui e agora” da entrevista, tramando o que Machado Pais (2016) define como tessituras do tempo. O cotidiano não é identificado somente como o aqui e agora, mas como aquilo que é captado no imediato, que é capaz de suscitar novos questionamentos, como um fragmento da realidade, que possui uma perspectiva histórica.

As narrativas orais transformadas em escrita trazem as experiências relatadas, utilizando-se das próprias palavras e expressões dos entrevistados, colocando-as entre aspas. As notas de rodapé colaboram para explicar termos específicos e nomes citados, o que ajuda a compor a complexidade das rotas formativas e das maneiras de ser e estar na igreja. Para facilitar a compreensão, ao nos referirmos à instituição Igreja Católica, adotamos a letra inicial maiúscula. Quando a referência é feita genericamente à comunidade de culto ou a outras igrejas cristãs, adotamos a inicial minúscula. Ao mencionar os religiosos, assumimos como parte de seus nomes próprios os termos “padre” e “irmã”, grafando-os com inicial maiúscula. Para melhor clareza, os quatro entrevistados são tratados com o termo “religioso(a)”, devido ao seu vínculo com a instituição Igreja Católica.

Sobre a aproximação com a música e com a religião na família

Padre José Henrique Weber, conhecido como José Weber, nasceu em 1932 na colônia alemã Anitápolis, Rio do Meio, Santa Catarina. Filho de Samuel Henrique Weber e de Benta Mattos dos Santos, diz ter suas raízes na mistura da origem alemã de seu pai com a origem portuguesa açoriana mesclada com índio-brasileiro de sua mãe. Seu pai, Samuel, denominado sacristão pelos serviços prestados à Igreja, era um homem “muito religioso e muito serviçal com a comunidade”. Era “cantor de igreja” e “puxava os cantos”. Em uma realidade na qual as missas ocorriam somente uma vez por mês, Samuel, aos domingos, era o primeiro a chegar “na reza”. Padre José Weber aprendeu a cantar com seu pai. Após a janta, a família reunia-se para cantar “os cantos de igreja daquele tempo”. O pai ensinava para “toda a família os cantos lá da igreja”. Como recorda José Weber, “o pai cantava e a gente aprendia com ele”. A descrição da vivência músico-religiosa que a família Weber teve nos dá uma mostra de como era bastante significativa a presença da música religiosa no âmbito familiar.

Em busca de um futuro melhor para os filhos, Samuel mudou-se com a família para Laranjeiras do Sul, entre Guarapuava e Foz do Iguaçu, no Paraná. A região era chamada na época de Território de Iguaçu. Samuel Henrique Weber, agricultor, trabalhava “na enxada, na foice”, e, em Anitápolis, “o terreno era muito acidentado”. Além disso, segundo o relato do Padre José Weber, o Paraná, naquele tempo, “parecia a terra prometida”. Sua família ali chegou de caminhão. Samuel trabalhou para o governo no Fomento Agrícola e “ganhava o seu salário para sustentar a família”.

O pai sonhara, desde pequeno, ser padre e, “como ele não pôde ser, ele fez tudo para que um filho dele se tornasse sacerdote”. Por volta de seus 10 ou 11 anos, o pai perguntou-lhe se ele não queria “entrar no seminário para começar os estudos para ser padre”. Ao ser indagado sobre sua entrada no seminário e sobre a questão vocacional, Padre Weber explica a importância das “circunstâncias da vida” e dos “exemplos”:

Não é que venha Jesus de noite no teu ouvido dizer: “Oh, Zé, você não quer ser padre?” Não é bem assim. Às vezes é a própria situação, as circunstâncias da vida. A gente percebe o exemplo de certos sacerdotes que vale a pena, então a gente [pensa]: “Eu gostaria de ser igual a esse cara”. Então, quem sabe aí começa uma coisa nova, o início de uma vocação, às vezes. É muito diverso. Cada um é diferente nesse ponto.

No caso da Irmã Míria Therezinha Kolling, religiosa do Imaculado Coração de Maria8, a “vocação” para seguir a vida religiosa apareceu bem cedo. “Apaixonada pela vida e pela música, aos sete anos dizia que “queria ser Irmã”. Nascida no interior de Dois Irmãos, Rio Grande do Sul, em 28 de maio de 19399, quando criança, morou, por dois anos, na cidade de Novo Hamburgo/RS, frequentando o Colégio São Luís, das Irmãs de Santa Catarina, onde diz ter despertado sua “vocação à vida religiosa”. Após um tempo morando em Novo Hamburgo, seu pai decidiu morar em outra cidade do interior. Os estudos da Irmã Míria prosseguiram no Colégio Imaculada Conceição, em Dois Irmãos/RS, onde conheceu as Irmãs do Coração de Maria, sua futura congregação. Tanto no colégio quanto em sua família e na igreja, a música era cultivada10.

Ela é a 9a de 13 filhos, que vivenciavam a música “em casa e na igreja”. Cantavam “a quatro vozes” e tinham um “coral da família”. Atribuía essa prática de coro na família à sua origem alemã, já que “os alemães são muito dados ao canto coral”. Vários de seus irmãos “tocavam algum instrumento: acordeão, violão, pandeiro...”. Irmã Míria conta que seu irmão mais velho percebeu sua “queda para a músicae, quase sempre, quando era transmitida uma música erudita, ele a colocava para “dentro do rádio”, para ouvir melhor. Assim, desde pequena, foi “afinando os ouvidos do coração” com e para a música, tendo contato com diversos repertórios, que ela nomeia como: religioso, clássico e popular.

Padre Ney Brasil Pereira apresenta-se como “padre há 60 anos”. Lida “com música, cantando, desde pequeno”, quando era “menino soprano, pelos sete, oito anos de idade”. Ao fazer as contas, descobre que há “praticamente 80 anos” está envolvido com música, “porque desde muito cedo” começou “a cantar”. Natural de São Francisco do Sul, Santa Catarina, “uma pequena cidade histórica”, situada “numa ilha”, Padre Ney Brasil nasceu em 4 de dezembro de 193011 e conta que, “com oito anos e meio”, mudou-se para a capital do estado, Florianópolis. Foi ali que ele teve contato “com o pároco da Catedral [...], que era meio músico”, o qual lhe deu a oportunidade de “cantar em público, fazendo solo. De Florianópolis, partiu “para o seminário de Azambuja, em Brusque”. Embora “não tivesse incentivo da família para a vocação sacerdotal”, desde que se conheceu “por gente queria ser padre”. Padre Ney “gostava muito de ir à igreja” e sua “família não se opôs”.

Também nascida em Santa Catarina, “no município de Biguaçu”, a Irmã Custódia Maria Cardoso é religiosa de uma congregação brasileira: Irmãzinhas da Imaculada Conceição12, fundada por Santa Paulina. Descreve seu pai como “um homem muito entusiasmado pela Bíblia, pela fé”. Segundo Irmã Custódia, ele “não falava da fé de uma maneira piegas”, “falava biblicamente da alegria”. Sua mãe era professora e “era uma mulher calma”. Diz pertencer a “uma família feliz, uma família democrática”, com “seis irmãs e dois irmãos”.

Irmã Custódia viveu “numa capela” chamada São Sebastião, em Limeira, São Paulo, onde seu “pai dirigia o culto”. Lá cantava “em um pequeno coral” com seu pai e sua família. Lembra de ter “aqueles livros antigos, chamados ‘Cecília’”, que continham os cantos daquela época. Seu pai “lia” e ela cantava. Ele “fazia a função do diácono”, sendo chamado de “capelão” da capela São Sebastião. Irmã Custódia relata que “ele cantava” nas “novenas”, na “Festa do Divino”. Recorda que havia “grandes festas” e, nelas, sua “mãe também cantava sempre”. Além da experiência na Igreja e na família, Irmã Custódia lembra que “na escola tinha [canto] toda semana”. Nessa mesma escola, frequentada por ela e seus irmãos, sua mãe lecionava. Eles cantavam “toda semana” e, aos sábados, faziam festa.

Os aprendizados construídos nas famílias dos entrevistados mostram uma prática musical fundamentada em práticas religiosas que já circulavam nos meios católicos de origem e que, mais tarde, foi mesclada aos ensinamentos das instituições religiosas disponíveis que tiveram acesso pelo esforço e/ou pelo apoio dos pais.

Segundo Machado Pais (2003, p. 33), o conhecimento social “carrila atra-vés de conceitos”. É possível destacar um vocabulário específico que se refere ao campo religioso musical. São palavras relacionadas ao conhecimento teoló-gico e litúrgico, tais como: “mistério”, “ministério”, “missão”, “dom”, “mistagogia”, “servir”, “cultivar”. Machado Pais (2003, p. 79) explica que “todo o ritual implica necessariamente uma linguagem que convém ser aprendida”, o que consistiria não só nas palavras usadas, mas também “na atribuição de significações parti-culares a comportamentos habituais”. Os comportamentos descritos nos depoi-mentos, como a prática de caridade e a participação na vida religiosa, revelam a visão de mundo e os modelos de educação musical e religiosa vividos na socie-dade da época.

Da formação músico-religiosa a agentes de formação no espaço da Igreja Católica brasileira

Formação musical no seminário e em casas de formação

Os quatro religiosos entrevistados têm a sua vida vinculada à Igreja Católica e professaram votos religiosos. Padre José Weber, Irmã Míria Kolling e Irmã Custódia pertencem a congregações e, por isso, são denominados religiosos. Padre Ney Brasil estabeleceu seu vínculo específico com a Igreja em uma diocese13. Ser “padre diocesano” é ter vínculo com a Igreja não através de um carisma próprio e da vida comunitária, mas em um local específico, uma diocese. Como diocesano, ele não possui dever de obediência a um superior religioso, mas reporta-se diretamente ao bispo local. O padre diocesano vincula-se a um local específico, a diocese, enquanto o religioso pode ser transferido para qualquer lugar onde haja casa de sua congregação. A seguir, é descrito como cada um estabeleceu seus vínculos de formação religiosa e como foram adquirindo sua formação musical nesse contexto.

Padre José Weber relata que seus pais eram “muito religiosos” e o “encaminharam desde pequeno”. Foi com um sim, “com uma coisinha assim, quase insignificante”, que começou seu processo de formação no seminário. Padre Weber conheceu a Congregação Verbo Divino14por um acaso da providência”, pois ela estava presente em Laranjeiras do Sul, local onde fora morar. Após um ano, em 1946, entrou, junto com seu irmão mais novo, no Seminário Menor15 da Congregação Verbo Divino, localizado em Ponta Grossa, Paraná.

Em 1949, Padre Weber concluiu o curso ginasial como seminarista. Ao recordar esse tempo em Ponta Grossa, Padre Weber diz que “sentia atração pela música”. Lá, havia o padre Bruno Welter, que, nas palavras de Padre Weber, era “mais ou menos músico” e o “ensinou as primeiras lições de como tocar harmônio”. Após um ano de dedicação, “já estava tocando, acompanhando os cantos na igreja”, sendo isso feito com a leitura de partitura.

Em 1950, distanciando-se mais de sua família, mudou-se para Santo Amaro, São Paulo, onde vivenciou seu primeiro ano oficial na congregação: o noviciado16 no Seminário Maior17. A rotina musical no seminário era especialmente vinculada às ações litúrgicas. Aos sábados e domingos, havia música devido à oração da liturgia das horas e à missa. Nas segundas-feiras, tinha o coro, o qual, segundo Padre Weber, era um coro de vozes iguais que, nas grandes festas e solenidades, cantava a missa a quatro vozes. Sua formação, em Santo Amaro, durou dez anos: dois de noviciado; dois de juniorato18; dois de estudos de Filosofia; quatro cursando Teologia. Em 1959, foi ordenado sacerdote19.

Já a Irmã Míria Therezinha Kolling, desde menina, revelou “o desejo” de se “tornar freira”. Sua família “era muito religiosa”; havia vários parentes, por parte de mãe, envolvidos com a Igreja: “dois tios padres e uma tia religiosa, uma prima carmelita, e outros parentes consagrados ao serviço de Deus”. O contato com esses parentes ajudou muito em sua decisão de ser consagrada.

Com 11 anos, em Dois Irmãos, tornou-se aspirante à consagração. Seguiu sua formação na escola regular, em Gravataí, Rio Grande do Sul. Na época, fazia-se uma espécie de vestibular, e ela chegou a iniciar o curso de magistério, depois interrompido. Segundo Irmã Míria, “a música fazia parte do currículo”, e ela se lembra de sempre tirar nota dez no “solfejo à primeira vista, cantando no coro, tocando piano e sanfona”.

Tendo vivenciado seu noviciado em Porto Alegre, tornou-se, nesse local, irmã professa, em 1960. Logo após sua profissão religiosa, Irmã Míria foi “transferida pela congregação para São Paulo”. Ela explica que “surgiram outras prioridades, e a música ficou em segundo plano”, embora sempre buscasse manter contato com a música. O voto de obediência lhe exigiu fazer o magistério. Ela estudou no Instituto de Educação Padre Anchieta, onde ganhou Cadeira-Prêmio, efetivando-se como professora I20 no Estado de São Paulo, sem concurso. Foi, então, transferida para Santos/SP, onde morou por vários anos. Licenciou-se em Pedagogia na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Santos.

Padre Ney Brasil entrou no Seminário de Azambuja, em Brusque/SC, “com 11 anos”. Ali, ele teve “a oportunidade de encontrar uma escola de música”. De acordo com sua descrição, “naquele tempo, os seminários menores eram escolas de música”, onde “se praticava a música coral, gregoriana, o canto religioso comum e instrumentos”. No seminário, ele tornou-se “solista do coro”.

Com relação à aprendizagem de um instrumento musical, Padre Ney menciona que, “naquela época, o instrumento comum era o harmônio”. Com 12 anos, ele teve “a oportunidade de começar a aprender o harmônio”. Recorda-se que, cedo, “pelos 16 anos”, começou “a compor, a fazer arranjos”. Considera que, “no começo, era bastante autodidatismo”, ou seja, “aquilo que os padres músicos iam passando”, ia sendo absorvido. Teoria musical se estudava “relativamente pouco”. Padre Ney Brasil, após estudar Teologia em Roma, foi ordenado presbítero em 25 de fevereiro de 1956. Sua ordenação ocorreu na Basílica de São Paulo Extramuros, situada nessa mesma cidade.

Ao descrever o seu caminho para ser freira, Irmã Custódia acredita que “tudo contribuiu” e que herdou de seus pais a “vontade de servir às pessoas”. Com “10, 12 anos”, falava para sua mãe que “queria ser irmã, que queria servir às pessoas”, porém, “não tinha noção de vida religiosa” e “não conhecia as irmãs”. O desejo de servir às pessoas foi despertado a partir da “prática cristã muito feliz e de serviço às pessoas” demonstrada por seus pais. Eles tinham uma loja, “Fazendas Armarinhos Secos e Molhados”, e, quando o cliente concluía a compra, seu pai o levava para “dentro de casa e oferecia café”. Segundo Custódia, seu “pai tinha compaixão”, sendo capaz de “abrir a porta de noite” para algum necessitado, colocando-o no interior da casa. Sua mãe “preparava [as crianças para] a primeira comunhão”, buscando oportunizar que todas tivessem roupas enfeitadas para a ocasião e usassem “laço de fita”. Após a missa, sua mãe oferecia “uma mesa cheia” para que todos pudessem comer e festejar.

Sua mãe, que conhecia a congregação Irmãzinhas da Imaculada Conceição, notando a vontade da filha de ser freira, “logo falou: ‘então eu vou levar você nas irmãs’”. A congregação informava para a família quais roupas podiam ser levadas e isso era organizado para a ocasião do ingresso na vida religiosa. Irmã Custódia recorda que suas “camisolas eram todas longas e serviram para muitos teatros”. Ela participava das peças teatrais, como aquela em que, no Natal, encenavam o presépio, e diversas pessoas iam assistir.

Irmã Custódia entrou “para o convento em Nova Trento [SC]”, onde começou os estudos para se “adaptar”. Na época, sua família contava com o auxílio de “ótimas empregadas que ajudavam a cuidar das crianças”. Foi seguindo sua formação e vivenciando a mobilidade da vida religiosa: morou em Ourinhos e Bauru, em São Paulo e em outros lugares. No noviciado, estudou mais religião, e chegou a ser “professora de Bíblia”.

Nas trajetórias dos religiosos entrevistados, é possível observar os processos de institucionalização da formação em Congregações e outras instituições religiosas, que implicavam na plena dedicação deles aos ensinamentos teológicos e onde se apropriam dos ensinamentos religiosos seguindo as hierarquias estabelecidas e praticadas pelo catolicismo brasileiro.

Formação acadêmica em música

Os relatos biográficos também se referem a uma formação musical feita em instituições superiores no Brasil e no exterior.

Um mês após a ordenação como sacerdote, em 1959, os superiores de Padre José Weber o “mandaram” estudar música em Roma. Ele já possuía “uma boa base” de conhecimento musical. Padre Weber nomina sua experiência de aprendizagem musical no seminário como a de um “autodidata”. O período em Roma foi a oportunidade para estudar “música” durante oito anos, de 1959 a 1967 no Pontifício Instituto de Música Sacra. Lá, fez os cursos de canto gregoriano e composição sacra.

Aos 21 anos, tendo feito seus votos religiosos, Irmã Custódia recebeu um “convite da Universidade de Bauru”. A madre perguntou-lhe se queria “estudar música”. No entanto, pelo fato de já ter trabalhado “com o jardim de infância”, em substituição a outra religiosa que ficara doente e por “dar conta” do trabalho, a madre sugeriu que fizesse “especialização em jardim de infância”. No entanto, Irmã Custódia optou pela música. Foi em Ourinhos, São Paulo, que fez o segundo grau e trabalhou na educação infantil. Ela recorda que “já falava no rádio lá em Ourinhos, cantava na Igreja, cantava com a congregação religiosa”. Ela “cantava na paróquia, fazia aquele corinho da paróquia no mês de maio”. Como religiosa, juntamente com outras meninas, “fazia muito discurso, muita poesia”.

Considera que o estudo na Universidade de Bauru trouxe-lhe “segurança na regência” e, além disso, lá pode estudar “toda a história da música, toda a história da Igreja na música”. Ela diz amar muito a regência coral. Seu envolvimento com o coral foi ocorrendo após ter assistido a um recital. O arcebispo Dom Vicente Ângelo José Marchetti Zioni soube que ela “estava estudando na faculdade” e pediu-lhe para organizar um coral diocesano. Nesse período, ela cantava como contralto no coral da universidade. Ao concluir a faculdade, Irmã Custódia foi lecionar em Ourinhos.

Depois de ser ordenado padre, Ney Brasil obteve “uma bolsa nos Estados Unidos” pela Fullbright Foundation para estudar música. De 1962 a 1963, “por dois semestres”, cursou “a Faculdade de Música da Universidade de Duquesne, em Pittsburgh”, onde frequentou “todos os cursos que eram possíveis fazer”. Segundo Padre Ney, “não deu para fazer mestrado lá”, porque seu “tempo de bolsista era só de um ano”.

Ele recorda que o ano de estudos em Pittsburgh “foi um sonho”, porque pôde “desfrutar da excelente Orquestra Sinfônica local” que fazia “frequentes concertos”. Por morar perto de “Filadélfia e Nova York”, teve “a oportunidade de apreciar várias óperas, com grandes intérpretes”. Nessas cidades, participou “dos ensaios e apresentação da Grande Missa em Dó menor, de Mozart, da Paixão de São Mateus, de Bach, e de um Poema Sinfônico, de Berlioz”.

No período em que esteve nos Estados Unidos, envolveu-se com a música na universidade, onde cantou no coro e fez “cursos de órgão, de piano” e “de orquestração” nos níveis “inicial e avançado”. Estudou “a prática de todos os instrumentos da orquestra, da banda: as cordas, as madeiras, os metais, a percussão”. Padre Ney não mais manteve contato com seus professores, mas considera que “eram excelentes professores”, de “muita qualidade, muita seriedade, muito bons”. Ele chegou a exercitar a composição, mas, “por motivos práticos”, quando voltou ao Brasil, teve que fazer uma “música mais tradicional”.

Paralelamente a seu trabalho como professora, Irmã Míria preparou-se para ingressar na faculdade de música, tendo aulas particulares com a pianista Elisa Capocchi. Além de piano, estudou violão com professores particulares, “sempre perseguindo” seu objetivo de fazer música. Fez o bacharelado em piano, na Faculdade de Música de Santos. Mesmo após a faculdade, continuou “estudando harmonia com a compositora Adelaide Pereira da Silva e técnica vocal com a cantora Adelia Issa, depois com Caio Ferraz”, pois sentia a necessidade de se “aperfeiçoar, para servir melhor”.

Sobre a reforma do Concílio Vaticano II: uma experiência geracional21

A reforma litúrgica realizada pelo Concílio Vaticano II no período de 1962 a 1965 transformou concretamente a vida da Igreja Católica (PASSOS; SANCHEZ, 2015). Segundo Bugnini (1999, p. 5, tradução nossa), “na história da liturgia, a reforma do Concílio Vaticano II distingue-se de todas as demais por seu caráter pastoral”. Um dos objetivos do Concílio, assim como do movimento litúrgico, referia-se à integração e à participação ativa do povo na celebração litúrgica (BUGNINI, 1999). As reformas feitas pelo Concílio foram impulsionadas por um movimento que visava, entre outras questões, à mudança do jeito de as pessoas participarem na liturgia.

Um dos documentos que impactou diretamente a vida litúrgica foi a constituição Sacrosanctum Concilium (SC), promulgada pelo Papa Paulo VI, no dia 4 de dezembro de 1963. Ela contém um capítulo dedicado à música sacra. Os princípios que orientaram a reforma da liturgia foram: “inteligibilidade dos textos e dos ritos [...] e a consideração do caráter comunitário e eclesial da celebração” (PASSOS; SANCHEZ, 2015, p. 651). O rito da missa passou, a partir da década de 1960, por amplas modificações (como a celebração no vernáculo). Em consequência, a música precisou ser adaptada e repensada, gerando a necessidade de um intenso trabalho formativo para que um novo repertório fosse constituído e houvesse pessoas capacitadas para exercer as funções musicais na liturgia.

Quando o Concílio Vaticano II se desenvolveu, em Roma, Padre Ney Brasil estudava nos Estados Unidos. Ele descreve: “O Concílio começou em 1962 e, em 63, já foi aprovada a constituição Sacrossantum Concilium, com aquela guinada de praticamente 180º, da liturgia do latim para a liturgia em vernáculo”. Em sua percepção, “essa decisão do Concílio, talvez, sem os padres conciliares se darem conta, forçou a criação de uma nova música da Igreja”. Isso significa que: “foi necessário criar uma música sacra nova, não mais chamada ‘sacra’, mas, agora, músicalitúrgica’, com a participação do povo”. Ela era expressa “nas várias línguas”, substituindo a música “que tinha quase seus dois mil anos de tradição, expressa em latim”. Padre Ney comenta que, “na liturgia em latim, o texto era fixo, direcionado. Cada missa devia ter sua entrada em gregoriano, seu Kyrie, seu Glória, enfim, o Graduale, essas coisas todas”. Como resultado, “com a música e liturgia em vernáculo, a ‘coisa’ tornou-se muito mais livre, possibilitando muita criatividade e improvisação ao mesmo tempo”.

Padre Ney compara a música litúrgica na Europa e no Brasil, explicando que “na Europa, após o Vaticano II, a música litúrgica manteve certo nível de qualidade acadêmica”, enquanto, “no Brasil, houve muita improvisação e, musicalmente, pouca qualidade”. Ele relata que, no período imediato pós-Concílio, no Brasil, houve “um certo confronto entre os músicos da música acadêmica e os da música pastoral”, no qual eles se criticavam mutuamente. Ao avaliar a “produção musical litúrgica” nos 50 anos posteriores ao Concílio, ele observa haver um repertó rio vastíssimo. Ele pondera que muita “coisa se compôs” e que “não se criou um repertório mais ou menos semelhante ao do gregoriano”, o qual se encontra no Liber Usualis22.

No Brasil, houve “a tentativa da CNBB [Conferência Nacional dos Bispos no Brasil]” no que se refere a um repertório, mas, segundo Padre Ney, o Hinário Litúrgico tem “suas qualidades e seus defeitos também”, pois “pelo menos ali” está registrado um “bom número do que se tem composto”. Ele conta que o repertório continua a ser construído e exemplifica com sua participação no “Canto Pastoral”, em Porto Alegre, o qual acontece “há mais de 45 anos”, com “uma porção de composições novas, lançadas”; em sua avaliação, “algumas com mais qualidade musical, outras, menos”.

Na visão da Irmã Míria, “o Brasil acolheu com entusiasmo a renovação litúrgica do Concílio Vaticano II, formando músicos que começaram a produzir hinos, cantos, missas”, sendo uma “semente lançada” que continua “despontando e florescendo”.

As mudanças advindas do Concílio Vaticano II requereram estratégias para serem praticadas. No Brasil, antes do Concílio, na área litúrgico-musical, diversas músicas compostas em outras línguas eram traduzidas para o português. Havia livros e manuais, como Harpa de Sião (padre João Batista Lehmann) e Cecília (Frei Pedro Sinzig, Frei Basílio Röwer e Frei Romano Koepke). Os grandes responsáveis pela organização desse material eram religiosos, que o configuravam de acordo com sua congregação ou ordem religiosa, originárias de diferentes países. Anteriormente ao Vaticano II, os cantos em português eram considerados mais como “música religiosa”, sendo pouco usados na liturgia oficial (que era rezada e cantada em latim) (FONSECA; WEBER, 2015).

Participação em cursos de liturgia e canto pastoral no Brasil após o Concilio Vaticano II e as repercussões na atuação como formadores

Após o Concílio Vaticano II, os religiosos entrevistados mostraram-se bastante ativos na participação em cursos de liturgia e canto pastoral no Brasil. Concomitante à sua preparação para a formação acadêmica em música, Irmã Míria começou “a participar dos cursos de liturgia e canto pastoral que floresciam, por todo o Brasil, após o Concilio Vaticano II”. Esses cursos “começaram no Rio de Janeiro, com o Padre Amaro, José Alves, Frei Joel Postma e outros, no final da década de 60”.

A partir de 1965, Padre Ney também começou “a participar dos cursos de canto pastoral do Rio de Janeiro e de São Paulo”, sendo “companheiro de músicos como o Frei Joel Postma”, Padre José Alves e Irmã Míria. Esses cursos “eram laboratórios, porque, praticamente, eram apresentações dessas composições”. Ele revela que “os primeiros cursos de canto pastoral” o marcaram; foi “incorporado à equipe do Cônego Amaro do Rio de Janeiro e do Monsenhor Luiz Marques de São Paulo, desde 1965”. Depois, logo esses cursos se espalharam pelo Brasil nas cidades de Recife, Porto Alegre e Belo Horizonte.

Irmã Míria recorda que, na época da “primeira equipe23, onde o padre José Weber também participava, eram 400 a 500 participantes”, com “gente do mundo inteiro”. Muitas religiosas estavam envolvidas e eram elas “que levavam esse material para as comunidades, espalhavam, cantavam”, já que “muitas irmãs, inclusive, trabalharam em comunidades de base24, em contato com o povo”. Ao participar dos cursos, ela aprendia o repertório novo e se motivava a compor.

Em 1981, ocorreu, em São Paulo, o “Simpósio de Música Sacra”, realizado pela recém fundada Sociedade Brasileira de Musicologia, reunindo “500 participantes, vindos de todo o Brasil”. Fizeram-se presentes conferencistas da Europa e dos Estados Unidos, “expondo como era a música litúrgica naqueles países”. Nesse simpósio, ao ouvir os alemães, a Irmã Míria não teve dúvida de que “se Deus permitisse, iria estudar na Alemanha e na Áustria”. Assim, na semana seguinte, começou “o curso de alemão no Instituto Goethe, com uma professora particular”. Passado um ano, recebeu uma “bolsa de estudos da ‘Adveniat’25, organização católica alemã que ajuda as missões”. Ela permaneceu dois anos na Alemanha (Colônia e Augsburg) e na Áustria (Salzburg), de 1983 a 1985. Lá, aprofundou seus “estudos musicais, fazendo uma experiência ímpar no campo da música sacra e litúrgica”, a qual “é muito valorizada” nesses países.

Em Augsburg (1984), participou de um seminário na Escola Greiner de Música “por quase um ano”, específico para regentes de corais infantis. Ela diz ter tido “excelentes professores, sobretudo na Alemanha”. Em sua percepção, “professores particulares de piano, técnica vocal, harmonia e composição, além de um clima todo musical, foram fundamentais e muito contribuíram” para sua “experiência de vida”. Após passar um período de estudos no exterior, “veio uma nova fase” de seu trabalho.

Voltando ao Brasil, em 1985, continuou lecionando para crianças na escola Dona Luiza Macuco, em Santos, mas, alguns anos depois, se aposentou. Lá, ela já havia regido um coro infantil antes de sua viagem para o exterior. Em 1989, a congregação a transferiu para São Paulo, capital, onde havia uma “vida cultural intensa, facilitando viagens, gravações, compromissos musicais pelo Brasil afora”. Irmã Míria lecionou “música, na Escola Nossa Senhora Auxiliadora, das irmãs salesianas”. Compôs, para datas comemorativas, canções infantis a serem cantadas pelo coral infantil que lá organizou, as quais foram gravadas em dois CDs.

Compôs, também, várias músicas para missas com crianças e fez “diversas gravações com as gravadoras católicas Paulinas/COMEP e Paulus, bem como com a editora Vozes”.

Irmã Custódia também se refere ao “Canto Pastoral” quando fala sobre como começou, depois de 1962, “a fazer os cursos de canto pastoral com o Frei Joel Postma, com o padre José Weber” e com o “pessoal mais antigo”. Mais tarde, passou “a dar cursos também”. Um bispo, com “uma vibração muito grande”, a conheceu em Ourinhos e fez um convite para que se mudasse para Apucarana, Paraná. Ela e outras duas irmãs mudaram-se para lá, engajaram-se na diocese e começaram um “trabalho de cursos, com a inspiração também do curso de Canto Pastoral” que haviam começado a frequentar em São Paulo. Em Apucarana, assumiu a “parte da música, da catequese, das Comunidades de Base”. De Apucarana, Irmã Custódia começou “a ir para o Brasil, para outras dioceses” que a convidavam e seguem convidando:

[...] ontem veio um telefonema de Goiás, então, o padre que dirige a liturgia lá falou: “eu quero animar o meu povo, eu quero dar umas músicas diferenciadas. Eu quero animar e quero que a senhora venha aqui”. Aí eu falei: “que temas você quer estudar?”. A gente pode começar o primeiro encontro, por exemplo, por equipes de celebração, características da música litúrgica, como era a música dos povos para depois chegar até a música litúrgica do Concílio.

Os trabalhos assistenciais e educacionais são algo inseparável dos trabalhos de formação musical e religiosa. Ao falar dos processos de transmissão e apropriação musical no ambiente da Igreja Católica, é comum o uso da palavra “formação” e, referindo-se à pessoa que transmite, “formador” ou “assessor”. Petrazzini (2004, p. 480), ao destacar a exigência do Concílio Vaticano II sobre uma ação formativa específica que renovasse a vida litúrgica dos fiéis, afirma que “o termo ‘formação’ se refere tanto à ação formadora voltada para determinado objetivo, quanto ao estado de formação atingido em determinados níveis ou sob determinados aspectos”. Ele descreve a formação como uma ação orientada que ajude “a pessoa a explicar e justificar todas as suas capacidades e virtualidades”, explicitando e expandindo, sendo a formação litúrgica algo que contribui para a “formação integral do homem-cristão” (PETRAZZINI, 2004, p. 481). O mesmo autor refere-se à formação litúrgica como um processo que pode ocorrer de modo intencional ou de um outro modo ocasional. Petrazzini (2004) apresenta os dois momentos da ação formativa: a formação “para” a liturgia e “para” a celebração litúrgica e a formação “através da” liturgia e da celebração litúrgica.

Falar sobre formação musical na Igreja requer falar sobre a transmissão da fé, pois a música, no culto cristão, “tem a ver com a formação da fé” (SALIERS, 1998, p. 384, tradução nossa). Em muitos casos, ela está a serviço da palavra. Há autores, como Saliers (1998), que retratam a música sob a perspectiva de seu poder formativo na liturgia.

Considerações finais

O objetivo deste artigo foi analisar as biografias acessadas pelas entrevistas dos religiosos e o campo da formação musical, examinados a partir do binômio formar-se e formar outras pessoas para o trabalho com música no contexto da Igreja Católica. Os depoimentos dos participantes da pesquisa permitiram compreender a aproximação deles com a música e com a religião na família e, posteriormente, os caminhos que possibilitaram sua formação músico-religiosa e que se tornassem agentes de formação no espaço da Igreja Católica brasileira. A concepção teórica de biografia e o conceito de trajetórias interpretado como rotas formativas por Machado Pais (2003) possibilitaram, nesta pesquisa, vincular práticas e experiências individuais, no nível micro, àquelas presentes no contexto da Igreja Católica, no nível macro.

Segundo Machado Pais (2003, p. 45), “o conhecimento produz-se sempre por uma multiplicidade de vias”. Nessa perspectiva, procuramos traçar algumas vias nas quais as rotas formativas dos quatro religiosos se desenvolveram. Os percursos revelam que a formação não ocorre de modo linear e mostram um pouco da complexidade da formação musical nesse contexto religioso, podendo ser identificados como “tecidos de maneiras de ser e de estar” (MACHADO PAIS, 2003, p. 30). A religião apresenta-se como algo que os configura, move, e molda seu jeito de ensinar música.

Lançar o olhar sobre a música na igreja e ter acesso às lembranças dos religiosos permitiu conhecer formas de apropriação do conhecimento musical, das escolhas que os formaram e que possibilitaram formar outros. Ao discutir o que se entende por formação musical na Igreja Católica, os entrevistados apresentaram suas concepções, especificadas nas opções pedagógicas, no detalhamento dos cursos, no papel de formador, no entendimento de sua finalidade. A formação nesse contexto religioso é vista como algo que exige compromisso, ao mesmo tempo que proporciona o conhecimento.

O “formador” no ambiente da Igreja Católica é aquele que assessora cursos, publica materiais, produz o conhecimento. Ele assume intensa relevância no contexto religioso e um de seus papéis é mostrar as maneiras de fazer. As formações são oferecidas a partir de encontros, e outros momentos, o que faz com que aspectos de socialização na família e nas instituições religiosas ganhem muita força na compreensão de como se dá a aprendizagem musical.

Padre Ney Brasil, em 2016, com 86 anos, permanecia como membro da “Equipe de Reflexão da Música Litúrgicada CNBB. Irmã Custódia busca reservar tempo para participar de congressos, sentindo necessidade de se “encher de conteúdo, de exemplo, de renovação”; por isso, nunca parou de estudar. Faz questão de participar do encontro “de compositores e músicos da CNBB”, pois isso lhe possibilita “refletir e caminhar com mais coesão no grupo maior”. Procura, também, estar presente na Semana Litúrgica Nacional e nos retiros mensais da congregação. Todos os anos, reserva datas para que possa participar de eventos de liturgia, música e comunicação. Ela continua indo em “tantos encontros” porque preza por não deixar sua formação de lado, pois, em seu entendimento, sem se formar, “você não pode doar”.

Há especificidades na música feita no contexto religioso, estando os conteúdos musicais atrelados a particularidades de crença religiosa, visões de sociedade e questões rituais litúrgicas. A inseparabilidade entre música e liturgia manifesta-se no modo como se “repassa” o conhecimento nos encontros, em que as questões técnico-musicais são desenvolvidas juntamente com o modo de executar, o sentido do texto, a função ritual. Simultaneamente à apresentação do repertório, busca-se despertar e fortalecer a fé. Nos encontros ou cursos, são valorizadas as experiências celebrativas, visando colocar em prática o que foi ensaiado.

As funções educativas das religiões e a compreensão destas como instituições formativas e socializadoras são aspectos que se tornam relevantes na discussão e formação na área de música, numa perspectiva sociológica. Por meio dos relatos biográficos podemos verificar a inserção dos religiosos no campo músico-pedagógico como aprendizes, formadores, participantes de reformas litúrgico--musicais e responsáveis pela formação contínua de milhares de pessoas.

Considerar as instituições religiosas como formativas e socializadoras é um aspecto relevante para se pensar a área de educação musical. Mesmo não havendo uma adesão pessoal a crenças, faz-se necessária a discussão sobre educação musical e religiões, pois sua relação faz parte da vida de muitas pessoas e é algo vivido em nossa sociedade (LORENZETTI, 2020). Assim, considerar diferentes experiências e formas de ensinar e aprender música em contextos religiosos pode trazer essas questões para debate na educação musical, a fim de promover uma formação que respeite a diversidade cultural e religiosa.

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SOUZA, Jusamara (org.). Música, cotidiano e educação. Porto Alegre: Programa de Pós-Graduação em Música do Instituto de Artes da UFRGS, 2000.

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SOUZA, Jusamara. Pensar a educação musical como ciência: a participação da Abem na construção da área. Revista da ABEM, Porto Alegre, v. 16, 25-30, mar. 2007.

SOUZA, Jusamara; LORENZETTI, Michelle Arype Girardi. Reconstruindo trajetórias de religiosos católicos e suas inserções no campo da música: biografia e formação musical. In: Congresso Brasileiro De Sociologia, 20. 2021. Anais [...]. Belém: UFPA, 2021.

TORRES, Maria Cecília de Araújo Rodrigues. Entrelaçamentos de lembranças musicais e religiosidade: “quando soube que cantar era rezar duas vezes...”. Revista da ABEM, Porto Alegre, v. 11, p. 63-68, set. 2004.

ZANANDREA, Rene Antonio. O canto e a música no contexto ritual da liturgia na igreja católica: desafios para a formação de agentes na diocese de Vacaria/RS. 2009. 118 f. Dissertação (Mestrado em Teologia) – Programa de Pós-Graduação Teologia Prática, Escola Superior de Teologia, São Leopoldo, 2009.

CARDOSO, Custódia Maria (Irmã Custódia Maria Cardoso). Entrevista – parte 1 – concedida a Michelle Arype Girardi Lorenzetti. São Paulo, 14 nov. 2016. Registro em áudio, vídeo e em texto transcrito. 58min.

CARDOSO, Custódia Maria (Irmã Custódia Maria Cardoso). Entrevista – parte 2 – concedida a Michelle Arype Girardi Lorenzetti. São Paulo, 15 nov. 2016. Registro em áudio, vídeo e em texto transcrito. 64min.

KOLLING, Míria Therezinha (Irmã Míria Therezinha Kolling). Entrevista 1 concedida a Michelle Arype Girardi Lorenzetti. Porto Alegre, 23 abril. 2016. Registro em áudio, vídeo e em texto transcrito. 74min.

KOLLING, Míria Therezinha (Irmã Míria Therezinha Kolling). Entrevista 2 concedida a Michelle Arype Girardi Lorenzetti. São Paulo, 12 nov. 2016. Registro em áudio, vídeo e em texto transcrito. 57min.

PEREIRA, Ney Brasil (Padre Ney Brasil Pereira). Entrevista concedida a Michelle Arype Girardi Lorenzetti. Porto Alegre, 29 jul. 2016. Registro em áudio, vídeo e em texto transcrito. 51 min.

WEBER, José Henrique (Padre José Henrique Weber). Entrevista 1 concedida a Michelle Arype Girardi Lorenzetti. Porto Alegre, 18 jun. 2016. Registro em áudio, vídeo e em texto transcrito. 93min.

WEBER, José Henrique (Padre José Henrique Weber). Entrevista 2 concedida a Michelle Arype Girardi Lorenzetti. São Paulo, 11 nov. 2016. Registro em áudio, vídeo e em texto transcrito. 103min.

Notas

1 Doutora em Educação Musical pela Universidade de Bremen, Alemanha. Professora Titular do Departamento de Música e orientadora no Programa de Pós-Graduação em Música da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Desde 1996 coordena o grupo de pesquisa Educação Musical e Cotidiano – EMCO (UFRGS/ CNPq). No período 2019/2020, atuou como professora visitante na Hochschule für Musik Theater und Medien, Hannover, Alemanha, pelo Programa CAPES/PRINT-UFRGS.

2 Doutora em Música pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS); realizou seu estágio de Doutorado Sanduíche pela CAPES na Alemanha. Possui Mestrado e Licenciatura em Música e Bacharelado Habilitação Canto pela UFRGS. Atua como professora substituta no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul (IFRS – Campus Alvorada) e é pós-doutoranda na UFRGS.

3 Ver os trabalhos de revisão bibliográfica e Estado da Arte de Abreu (2017), Gontijo (2019), Cruz e Almeida (2021), Madeira et al. (2021), Pedrollo et al. (2021) e Röpke e Monti (2021).

4 Destacam-se os grupos de pesquisas registrados no Diretório de Grupos do CNPq: Autonarrativas de Práticas Musicais (NarraMus) (UFSM), liderado pelas Profa. Dra. Ana Lúcia de Marques LouroHettwer e Profa. Dra. Maria Cecília de Araújo Rodrigues Torres; Educação Musical Escolar e Autobiografia (GEMAB) (UnB), liderado pelas Profa. Dra. Delmary Vasconcelos de Abreu e Profa. Dra. Maria Helena Menna Barreto Abrahão e o Grupo de Estudos e Pesquisa (Auto)biográficos em Educação Musical (GEPAEM) (UFRR), liderado pela professora Dra. Jéssica de Almeida.

5 Os colaboradores da pesquisa autorizaram, formalmente, o uso de seus nomes para publicações relativas à investigação.

6 Machado Pais refere-se à obra: FERRAROTI, Franco. Histoire et Histoires de Vie: lê méthode biographique dans lês sciences sociales. Paris: Librairie dês Méridiens, 1983.

7 Como mencionado, as entrevistas fizeram parte do material empírico da tese de Lorenzetti (2019). Parte do material foi publicado nos artigos de Lorenzetti (2020, 2021). A análise das entrevistas do ponto de vista dos métodos biográficos foi apresentada inicialmente no artigo de Souza e Lorenzetti (2021).

8 As Irmãs do Imaculado Coração de Maria são religiosas de vida apostólica e consagrada. Fundada por Bárbara Maix (1818-1873), a congregação conta hoje com irmãs presentes em 8 países e 15 estados brasileiros (IRMÃS DO IMACULADO CORAÇÃO DE MARIA, n.d.).

9 Irmã Míria Therezinha Kolling faleceu no dia 5 de maio de 2017, aos 77 anos, em São Paulo.

10 Irmã Míria utiliza em mais de um momento da entrevista a expressão “cultivar”, como no trecho: “Meus pais, na verdade, se conheceram cantando no coral da igreja, de modo que, desde menina, cultivávamos a música em casa e na igreja, assim como depois no colégio, em Dois Irmãos e, mais tarde, em Gravataí” (Irmã Míria Kolling, 23/04/16, grifo das autoras).

11 Padre Ney Brasil Pereira faleceu no dia 4 de janeiro de 2017, aos 86 anos, em Florianópolis.

12 As Irmãzinhas da Imaculada Conceição são uma congregação religiosa fundada por Santa Paulina em 1890, em Nova Trento/SC. A congregação encontra-se em 12 países (CIIC, 2017).

13 Dioceses e arquidioceses são divisões territoriais da Igreja Católica. As dioceses correspondem a “uma porção do Povo de Deus confiada ao pastoreio do Bispo com a cooperação do presbitério” (CÓDIGO DE DIREITO CANÔNICO, 2006, Cân. 369).

14 Congregação do Verbo Divino, Missionários do Verbo Divino, ou Verbitas foi fundada em 1875 nos Países Baixos pelo padre alemão Arnaldo Janssen. Sua sigla, geralmente assinada após o nome pessoal, é SVD, que significa Societas Verbi Divini.

15 O Seminário Menor é o local onde adolescentes realizam sua formação escolar prevista no país, para preparar-se para o acesso à universidade. A experiência no Seminário Menor visa à formação para a maturação humana e cristã, auxiliando no discernimento sobre a vocação sacerdotal.

16 Na época, o noviciado durava dois anos. Atualmente é de somente um ano. Após o noviciado, são feitos os votos, ou seja, uma promessa. Os votos são: pobreza, castidade e obediência.

17 O Seminário Maior é o local de formação dos candidatos ao sacerdócio. Através da vivência comunitária, os seminaristas recebem formação humana, espiritual, intelectual e pastoral. Nesse período, eles realizam sua formação universitária em Filosofia e Teologia.

18 O juniorato é uma etapa de formação para os religiosos que ainda são jovens.

19 A Ordem é um dos Sacramentos da Igreja Católica. Ela contém três graus: episcopado (bispo), o presbiterado (padre) e o diaconado (diácono). No caso da ordenação sacerdotal (presbiterado), através de um rito religioso e litúrgico, o ministério é conferido ao candidato para a Igreja, para servir em nome e na pessoa de Cristo no meio da comunidade (CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA, 2000).

20 Professor I refere-se ao profissional que cursou magistério e que se habilitou para atuar na educação infantil e nas séries iniciais do ensino fundamental.

21 Os religiosos Padre José Weber, Irmã Míria e o Padre Ney Brasil pertencem a essa geração que vivenciou a reforma do Concílio Vaticano II. Já Irmã Custódia, por ser mais jovem, não fez referência a essa Reforma.

22 Liber Usualis foi um livro usado na Igreja Católica para o canto gregoriano. Foi compilado pelos monges da Abadia de Solesmes (França). Contém cantos usados na missa (Kyrie, Gloria, Credo, Sanctus e Agnus Dei) e cantos para a Liturgia das Horas.

23 Irmã Míria chama de “primeira equipe” os responsáveis pela renovação litúrgico-musical no Brasil logo após o Concílio.

24 As Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) nasceram no Brasil na década de 60 e “são grupos de cristãos leigos, geralmente pobres, que se reúnem regularmente nas casas de famílias ou em centros comunitários, a fim de ouvir e aprofundar a Palavra de Deus, alimentar a comunhão fraterna e assumir o compromisso cristão no mundo”. Utiliza-se a expressão “comunidade” por serem “grupos formados por pessoas a partir do lugar onde moram [...] que procuram viver relações fraternas de partilha, ajuda, solidariedade e serviço”. O termo “eclesiais” é usado “por se tratar de grupos de seguidores dos exemplos de Jesus, dos apóstolos, em comunhão com a Igreja”. Utiliza-se “de base” pela sua relação com os primeiros cristãos e “porque é vivida pelo povo que está na base humana e cristã, gente pobre ou pessoas que se colocam ao lado dos pobres” (CEBs, n.d., n.p.).

25 A Ação Episcopal “Adveniat” foi fundada em 1961 pela Conferência Episcopal Alemã com “o objetivo de prestar auxílio pastoral a Igrejas locais na América Latina e no Caribe” (CNBB, 2011, n.p.).

Autor notes

1 Doutora em Educação Musical pela Universidade de Bremen, Alemanha. Professora Titular do Departamento de Música e orientadora no Programa de Pós-Graduação em Música da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Desde 1996 coordena o grupo de pesquisa Educação Musical e Cotidiano – EMCO (UFRGS/ CNPq). No período 2019/2020, atuou como professora visitante na Hochschule für Musik Theater und Medien, Hannover, Alemanha, pelo Programa CAPES/PRINT-UFRGS.

2 Doutora em Música pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS); realizou seu estágio de Doutorado Sanduíche pela CAPES na Alemanha. Possui Mestrado e Licenciatura em Música e Bacharelado Habilitação Canto pela UFRGS. Atua como professora substituta no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul (IFRS – Campus Alvorada) e é pós-doutoranda na UFRGS.